EM, reforma sem estrutura

EM, reforma sem estrutura

Reforma do ensino médio esbarra em falta de estrutura e recursos

Maioria dos municípios brasileiros têm apenas uma escola de ensino médio; turno triplo está presente em 41,9% das unidades e só 54,9% dos professores têm formação na disciplina em que atuam

Luiz Fernando Toledo, O Estado de S.Paulo

04 Junho 2017 

PASSA QUATRO (MG) - Depois de sancionada, a reforma do ensino médio passará agora por uma série de entraves e desafios para ser implementada, de fato, pelos Estados brasileiros. Enquanto a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) não é aprovada – peça-chave para que as mudanças comecem –, secretários já se reúnem nos Estados para pensar em como implementar a transformação em suas redes, especialmente nas mais desiguais, com muitas cidades pequenas, poucas escolas e recursos e grande concentração de alunos. 

Gestores ouvidos pelo Estado nas últimas duas semanas já cogitam soluções alternativas(leia aqui o que dizem os secretários de seis Estados). Para mapear as dificuldades a reportagem solicitou um amplo levantamento de dados ao Movimento Todos Pela Educação (MPE), com base no Censo Escolar de 2016, e ouviu especialistas dos setores privado e público, secretários, professores e alunos. A maioria (53%) dos municípios têm uma só escola que oferece o ensino médio regular ou educação profissionalizante. São 2.967 cidades nessa situação, dos 5.570 municípios brasileiros. Se consideradas apenas escolas com ensino médio regular, são 3.063, ou 55% total dos municípios do País. 

Nesses casos, a oferta de uma das principais mudanças da reforma, os itinerários formativos, ou seja, a parte flexível do currículo com possibilidade de escolha do aluno, pode ter mais dificuldades de implementação. O novo texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), como sancionado pelo presidente Michel Temer em fevereiro, não traz obrigações às redes como um todo. O que o Ministério da Educação (MEC) diz é que haverá obrigação de os colégios terem uma opção.

Desafios da reforma do ensino médio
Cidades pequenas e falta de infraestrutura são entraves para a reforma do ensino médio. Veja a seguir imagens de escolas em Minas Gerais, onde mais da metade dos municípios têm só uma escola. Foto: Felipe Rau

SÃO PAULO - Para que a reforma do ensino médio seja bem sucedida, é preciso garantir financiamento às escolas que mais precisam, oferecer constante suporte técnico e formação continuada aos professores, para que possam se aperfeiçoar nas disciplinas que lecionam e oferecer itinerários formativos com algum aprofundamento. Essa é a visão de especialistas ouvidos pelo Estado.

Para o superintendente do Instituto Unibanco, Ricardo Henriques, há "vários dilemas" de implementação da reforma que não estão explícitos na lei. "A flexibilização do currículo é uma mudança de potencial da política educacional como um tudo. Mas para isso é necessário um maior diálogo sobre os responsáveis finais, os conselhos estaduais e as secretarias de educação. A lei não é clara sobre como deve ser essa oferta", disse.

Ele destacou também que que a ampliação da carga horária no ensino médio faz o Brasil "ficar no trilho de todo o resto do mundo", mas que para que a mudança funcione é preciso fixar o professor em uma mesma escola e ofertar, continuamente, assistência técnica e formação continuada.

Outro desafio é a grande concentração de alunos na região nordeste, onde há muitos municípios pequenos com alta concentração populacional."Há uma grande quantidade de matrículas oferecidas por uma única escola nos municípios. No Nordeste, mais de 20% das matrículas são oferecidas por estas escolas únicas no município", diz. Ele destaca a situação de Estados como Paraíba e Rio Grande do Norte, em que esses porcentuais chegam a 37% e 36%, respectivamente.  "Em regiões com alta densidade populacional você pode especializar a escola em uma área e ofertar a mobilidade desse estudante entre escolas de um mesmo território", diz. "Mas para isso, é necessário grande investimento em assistência a essas escolas”.

Falta de infraestruturas e recursos podem travar reforma do Ensino Médio no País.Na foto, aluno na Escola Estadual Nossa Senhora Aparecida, em Passa Quatro (MG).  Foto: Felipe Rau

Idilvan Alencar, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), destaca que o principal desafio é explicar como será o financiamento da reforma. “Quando esta reforma coloca a necessidade de itinerários, ela diz que é preciso contratar mais professores. Haverá mais educação profissional, por exemplo, e vou precisar contratar professores daquela área”.

Para que os itinerários funcionem, diz, as secretarias devem ficar cada vez mais próximas das escolas, em contato com professores e alunos. “A  reforma ainda não fez diálogo direto com esses atores. Vai ter um itinerário ou mais de um em cada escola? O aluno vai poder escolher? Haverá estrutura para oferecer todos os itinerários em uma só escola?”, questiona.

Leia a série de reportagens sobre a reforma no ensino médio:

1: Cidades pequenas, falta de estrutura e recursos desafiam novo ensino médio

2: Ampliar apoio financeiro e técnico às escolas é fundamental, segundo especialistas

3: Em cidades com só 1 escola, sonho de oferecer 5 ‘futuros’ vira pesadelo

4: Em cidade no interior de SP, docentes cobram reforma física

5: Secretários já cogitam ampliar período do ensino noturno e enviar alunos para cidades vizinhas

6: Ministro Mendonça Filho quer 'liberdade' para Estados definirem a reforma que farão

7: Sem dinheiro, Estado de MG tem 2 mil escolas na fila por reforma física

8: ANÁLISE: Reforma exige atenção para evitar aumento das desigualdades

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