Regras rígidas para pagamento de precatórios

Regras rígidas para pagamento de precatórios

STF deve fixar regras rígidas para pagamento de precatórios

Artigo é de autoria do presidente da Comissão de Defesa dos Credores Públicos do Conselho Federal da OAB, Marco Antonio Innocenti

Ao concluir, em março deste ano, o julgamento da ADI 4.357, reconhecendo a inconstitucionalidade de diversos dispositivos da Emenda Constitucional 62/2009, entre eles o que vinha permitindo o parcelamento da dívida de precatórios dos estados e municípios em 15 anos (artigo 97-ADCT), o Supremo Tribunal Federal sinalizou com a possibilidade de virem a ser modulados os efeitos dessa decisão.

Admitida pelo STF apenas quando razões de segurança jurídica ou excepcional interesse social revelarem a necessidade de restringir os efeitos da declaração de inconstitucionalidade ou de suspender sua eficácia por determinado prazo, a modulação do julgamento da ADI 4.357 foi requerida por alguns estados e municípios sob a alegação ad terrorem de que, caso não pudessem mais contar com aquele prazo para pagamento de tais débitos, suas finanças entrariam em colapso.

Embora essa alegação não constitua novidade, já que há anos vem sendo utilizada como pretexto pelos gestores públicos para protelarem a quitação de suas dívidas judiciais, revela-se hoje, entretanto, indisfarçavelmente ultrapassada, sendo inconcebível que a modulação dos efeitos daquela decisão, conforme pretendido pelas administrações estaduais e municipais, venha mitigar a incidência dos princípios constitucionais reafirmados pelo STF no mencionado julgamento, entre eles, o do direito adquirido, da coisa julgada e da separação dos poderes.

O que se espera do STF é que, ao modular os efeitos dessa decisão, fixe regras rígidas de transição para que, em determinado prazo, os entes públicos devedores de precatórios realizem os ajustes orçamentários necessários à reorganização das finanças públicas, a fim de liquidar integralmente o estoque da dívida.

Ainda que se admitisse ser inviável o pagamento imediato, de uma só vez, de todo o estoque de precatórios das administrações estaduais e municipais, isso não significa que não possa ser quitado em prazo bem menor do que 15 anos.

Com efeito, o acordo sobre a revisão das dívidas com a União, já praticamente fechado no Congresso Nacional, deverá garantir aos estados e municípios, provavelmente ainda este ano, redução não apenas do valor global da dívida consolidada, mas também das parcelas relativas às amortizações feitas ao Tesouro Nacional.

Essa circunstância permitirá que o STF, ao modular a decisão que considerou inconstitucional mais essa moratória dos precatórios, imponha a imediata elevação dos percentuais atualmente calculados sobre a Receita Corrente Líquida (RCL), objetivando a quitação do estoque atual no prazo máximo de dois a cinco anos, com as sanções previstas no parágrafo 10° do artigo 97-ADCT.

Em muitos casos, porém, mesmo um aumento da destinação de recursos para o pagamento de precatórios não será suficiente para corrigir distorção praticada por muitas administrações estaduais que, a partir da promulgação da EC 62, diante da oportunidade de parcelarem seus débitos judiciais em 15 anos independentemente do montante do estoque, reduziram os desembolsos para quitação desses débitos, criando uma dívida de precatórios que antes não existia ou que seria liquidada em prazo bem menor.

Caso o aumento obrigatório das dotações orçamentárias não venha a acontecer já a partir do julgamento da modulação dos efeitos daquela decisão, a revisão da dívida dos estados e municípios com o governo federal redundará apenas na ampliação da capacidade de endividamento das cidades e dos estados, já de olho nas eleições do ano que vem.

Por isso, caso o STF venha mesmo a modular essa decisão, jamais poderá fazê-lo no sentido de permitir a redução dos percentuais da RCL atualmente em execução, nem limitá-los a determinado teto, pois, ao contrário, somente a considerável abreviação do restante daquele prazo de 15 anos revelar-se-ia coerente com o resultado da ADI 4.357, impondo-se o aumento substancial das destinações atuais de verbas para pagamento de precatórios, sob pena de a Suprema Corte, a pretexto de modular aquela decisão, acabar invertendo o resultado do julgamento, tornando vencedores aqueles interesses que saíram derrotados na ADI 4.357.

Finalmente, eventual modulação dos efeitos da decisão em foco não poderá prescindir da aplicação da norma constitucional que impõe o dever de cooperação entre os entes federativos, visando ao equilíbrio do desenvolvimento em âmbito nacional, carreando à União o ônus de instrumentalizar medidas complementares de auxílio financeiro aos estados e municípios com maiores dificuldades orçamentárias para liquidar seus precatórios em prazo razoável.

Aliás, esse dever do governo federal encontra-se atualmente previsto na denominada cláusula de federalização dos precatórios (CF, artigo 100, parágrafo 16), que prevê a possibilidade de financiamento dessas dívidas dos estados e municípios diretamente pela União, o que se justifica tanto pelo fato de a Administração central jamais ter exigido medidas de austeridade dos governos locais quanto aos precatórios, quanto pela sua privilegiada condição na repartição do produto da arrecadação dos impostos.

Se o STF não agir assim, permitirá que a revisão das dívidas dos estados e municípios com a União, necessária para correção de uma distorção que, nos últimos anos, vem proporcionando ganhos extraordinários ao governo federal, amplie os gastos dos governadores e prefeitos em ano eleitoral, vitimando mais uma vez as centenas de milhares de credores de precatórios em todo o país.

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