Aulas de reforço
PARECER Nº 14647/2006
O Secretário da Administração e dos Recursos Humanos - SARH, acolhendo manifestação da assessoria jurídica da mesma Pasta, consulta a Procuradoria-Geral do Estado acerca da "possibilidade de se computar como regência de classe os períodos laborados como aulas de reforço e, portanto, serem utilizados para aposentadoria especial".
A consulta teve origem no Ofício nº 1093/DAF do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul - Sindicato dos Trabalhadores em Educação - CEPRGS-SINDICATO, solicitando esclarecimentos à Assessoria Jurídica da Secretaria da Educação sobre a efetividade dos professores que complementam a carga horária em projetos de reforço, perguntando se ela é computada ou não, como regência de classe (fl.31).
A Assessoria Jurídica da Secretaria da Educação reportou-se às Informações 2693/99 e 0131/2000 e 4231/2000, proferidas no expediente administrativo nº 42208-1900/99.2, requerimento de DELCI MARIA SPORH, para que o período em que ministrou aulas de reforço fosse considerado como tempo computável à aposentadoria especial de professor, as quais, em síntese, concluem pela impossibilidade de se considerar as aulas de reforço como regência de classe. E quanto ao mínimo de horas-aula semanal de reforço que o professor deva cumprir além da regência regular para que seja considerado regente de classe, encaminhou o expediente à SARH, com vistas à DIARP para análise.
A Divisão de Aposentadoria e Revisão de Proventos - DIARP - da SARH propôs a devolução do presente à Secretaria da Educação, para aguardar a solução do expediente administrativo nº 42208-1900/99.2.
Juntada cópia de tal expediente, a Assessoria Jurídica da SARH sugeriu fosse ouvida a Procuradoria-Geral do Estado sobre o tema, sugestão acolhida pelo titular da Pasta.
É o relatório.
Muito se debateu a quem se dirigia a norma constitucional que prevê a contagem do tempo de serviço privilegiado à aposentadoria de professor, desde a Constituição anterior (inciso XX do artigo 165, com a redação dada pela EC nº 18/81) até a atual redação do § 5º do artigo 40 da Constituição Federal, dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, verbis:
§ 5º Os requisitos de idade e de tempo de contribuição serão reduzidos em cinco anos, em relação ao disposto no § 1°, III, a, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
O Supremo Tribunal Federal, ao longo das sucessivas alterações no texto constitucional, entendeu que a contagem privilegiada é aplicável somente ao professor que está exercendo o magistério em sentido estrito, vale dizer, excluídos os períodos em que os professores estivessem exercendo outras funções, que não a precípua de docência, ainda que na Escola ou que privativas de professor, e excluídos outros profissionais da Educação, editando, por fim, a Súmula 726, segundo a qual "para o efeito de aposentadoria especial de professores, não se computa o tempo de serviço prestado fora da sala de aula".
Dentre tantas decisões, vale destacar a seguinte, por ser mais próxima ao assunto da consulta ora formulada:
O § 5º do artigo 40 da Carta Federal prevê exceção à regra constitucional prevista no artigo 40, § 1º, inciso III, alíneas a e b, tendo em vista que reduz em cinco anos os requisitos de idade e de tempo de contribuição para 'o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio'. Funções de magistério. Desempenho das funções exercidas em sala de aula. Não abrangência da atividade-meio relacionada com a pedagogia, mas apenas da atividade-fim do ensino. Dessa forma, os beneficiários são aqueles que lecionam na área de educação infantil e de ensino fundamental e médio, não se incluindo quem ocupa cargos administrativos, como o de diretor ou coordenador escolar, ainda que privativos de professor. Lei complementar estadual 156/99. Estende a servidores, ainda que integrantes da carreira de magistério, o benefício da aposentadoria especial mediante redução na contagem de tempo de serviço no exercício de atividades administrativas. Inconstitucionalidade material.
(ADI 2.253, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 07/05/04). No mesmo sentido: RE 199.160-AgR, DJ 11/03/05.
A propósito, consulte-se o PARECER PGE nº 14.585/2006, da Procuradora ELIANA SOLEDADE GRAEFF MARTINS, que fez recentemente um estudo aprofundado do tema.
Portanto, estando o professor no exercício da docência, em sentido estrito, nenhuma outra exigência há que impeça a contagem de tempo de serviço como professor, com exceção do exercido ao nível superior, cuja benesse foi suprimida do artigo 40 da Constituição Federal, por ocasião da Emenda Constitucional nº 20/98.
Assim, há que se verificar na legislação, se as aulas de reforço fazem ou devem fazer parte das atividades do professor.
A Lei de Diretrizes e Base da Educação - Lei Federal nº 9.394/96 - que disciplina como deve ser o ensino escolar, prevê a garantia de padrão de qualidade do ensino tanto como um dos princípios e fins da educação nacional, quanto como um direito à educação e o seu correspondente dever de educar.
Atribui aos estabelecimentos de ensino a incumbência de prover meios para a recuperação dos alunos com menor rendimento (artigo 12, inciso V), e aos professores as estratégias para tanto (artigo 13, inciso IV).
Mas é no seu artigo 24, quando trata das regras comuns de organização da educação básica, nos níveis fundamentais e médio, que expressamente prevê a obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos.
Portanto, as aulas de reforço, entendidas como as ministradas pelo professor paralelamente às das disciplinas ou séries que o aluno está cursando, devem fazer parte da organização da educação básica.
Pertinente, neste aspecto, destacar do PARECER nº 374/2000, do Conselho Estadual de Educação, o seguinte excerto, que esclarece a diferença entre os estudos de recuperação atendidos pelo próprio professor e os desenvolvidos em turmas separadas, o que, no caso, corresponde às aulas de reforço, verbis:
4. A Lei nº 9.394/96 é clara ao definir os estudos de recuperação como um procedimento a ser aplicado, sempre que registrarem "casos de baixo rendimento escolar". Ora, "casos" são sempre individuais, particularizados, e não uma classe inteira. Os "casos" precisam ser tratados como tais, iniciando-se o atendimento, pelo próprio professor da classe, ainda em sala de aula, assim que a deficiência for constatada. Em muitos "casos" essa orientação adicional já será suficiente.
Se, no entanto, o procedimento que o professor for capaz de utilizar na própria sala de aula se mostrar insuficiente, é obrigação da escola oferecer, fora do horário normal - completamente independente, portanto, dos dias e horas letivos mínimos anuais da turma - estudos de recuperação capazes de atender as necessidades do aluno.
Não demais o Art. 13, inciso IV, da LDBEN incumbe o professor de "estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento". É clara a lógica dessa determinação: os estudos de recuperação serão vinculados ao processo de ensino-aprendizagem e é responsabilidade do professor da classe ou do componente curricular o diagnóstico da carência e a fixação dos procedimentos necessários para sua superação. Essa observação torna-se ainda mais pertinente, quando a escola adota modalidades de oferta de estudos de recuperação mediante o concurso de professores que não têm a regência normal das turmas a que pertencem os alunos carentes de ajuda adicional."
Sendo assim, parece evidente que, uma vez adotado pela escola a modalidade de oferta de estudos de recuperação em turmas ou aulas paralelas à regência normal e ministradas tais aulas pelo professor, são computáveis como tempo de serviço privilegiado a sua aposentadoria.
Todavia, há que se ter razoabilidade no definir o que sejam as aulas de reforço. Em primeiro lugar, devem ser aulas que estão previstas ou planejadas na estrutura escolar, vale dizer, devem ter sido concebidas no planejamento do ano letivo e postas à disposição dos alunos com menor rendimento escolar paralelamente ao currículo regular.
Devem ser ministradas a grupos de alunos, obviamente, que podem ser menores do que a média das turmas regulares, mas que não tão pequenos que descaracterize o sentido de turma ou aula, para se tornar acompanhamento pedagógico do aluno.
Portanto, as horas-aula do professor no exercício da docência em aulas de reforço, compreendidas como aulas paralelas à regência de classe regular a turmas ou grupos de alunos com menor rendimento escolar para desenvolvimento concomitante do conteúdo curricular, podem ser computadas como de tempo de serviço privilegiado de professor, pois se caracterizam como efetivo exercício da função de magistério.
Este é o parecer.
Porto Alegre, 22 de novembro de 2006.
ANASTAZIA NICOLINI CORDELLA,
PROCURADORA DO ESTADO.
Expediente Administrativo nº 101052-1900/01-0
Acolho as conclusões do PARECER Nº 14.647, da Procuradoria de Pessoal, de autoria da Procuradora do Estado Doutora ANASTAZIA NICOLINI CORDELLA.
Restitua-se o expediente ao Excelentíssimo Senhor Secretário de Estado da Administração e dos Recursos Humanos.
Em 29 de dezembro de 2006.
Helena Maria Silva Coelho,
Procuradora-Geral do Estado.