Alfabetização na idade certa
Alfabetização na idade certa é o mínimo que uma criança merece
Em vez de terceirizar a culpa, governos e professores têm de assumir a sua responsabilidade
12/6/2023 - Rosane de Oliveira
Poucos sinais são mais evidentes do subdesenvolvimento brasileiro em matéria de educação do que o fato de milhões de crianças chegarem aos 10 anos ou mais sem terem sido alfabetizadas, mesmo evoluindo para as séries seguintes. Não que a solução seja reprovar, porta aberta para o abandono da escola. O compromisso dos governos e dos professores deve ser com a aprendizagem. E isso começa pela alfabetização na idade certa. É nesse contexto que se deve saudar o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, lançado nesta segunda-feira (12) pelo governo Lula.
O ministro da Educação, Camilo Santana, conhece o assunto em profundidade. Sua adjunta, Izolda Cela, também. Por terem administrado o Ceará, um Estado pobre que conseguiu resultados notáveis nessa área, a dupla Camilo e Izolda têm as credenciais necessárias para fazer andar esse ambicioso programa de R$ 3 bilhões em quatro anos, mas não farão milagres se não houver engajamento de governadores, prefeitos, secretários estaduais e municipais de educação, pais e professores.
É sempre mais fácil atribuir o atraso na alfabetização a fatores externos: a família que não acompanha (porque os pais não têm formação mínima), as crianças que chegam à escola famintas, a falta de celulares e de internet de alta velocidade... O que os estudos mais avançados mostram é que toda a criança é capaz de aprender, desde que receba o atendimento adequado. Isso significa alimentação escolar para vencer a subnutrição, material escolar apropriado, professores comprometidos e motivados, infraestrutura nas escolas, atendimento psicossocial.
Alfabetização na idade certa significa que ao final do segundo ano do Ensino Fundamental a criança deverá ter aprendido a ler e a escrever. Se no meio do caminho se constatar que está atrasada, o caminho é dar aulas de reforço e não deixar ninguém para trás.
Ministério da Educação anuncia investimento de R$ 3 bilhões na alfabetização infantil
Compromisso Nacional Criança Alfabetizada foi lançado nesta segunda-feira (12), com medidas como formação de professores e recursos para materiais de ensino e infraestrutura.
12/6/2023
As medidas incluem formação de professores e gestores, recursos para materiais de ensino e infraestrutura, assistência, reconhecimento de boas práticas e sistemas de avaliação
O Ministério da Educação (MEC) lançou, nesta segunda-feira (12), o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, nova política que subsidiará ações de Estados e municípios para a promoção da alfabetização das crianças brasileiras. O anúncio ocorreu em evento no Palácio do Planalto, no qual o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, assinou o decreto que institui a política. O investimento no compromisso será de R$ 1 bilhão em 2023 e de mais R$ 2 bilhões nos próximos três anos. As medidas incluem formação de professores e gestores, recursos para materiais de ensino e infraestrutura, assistência, reconhecimento de boas práticas e sistemas de avaliação.
O objetivo do compromisso é garantir que 100% das crianças estejam alfabetizadas ao fim do 2º ano do Ensino Fundamental, conforme previsto no Plano Nacional de Educação (PNE). A política também busca garantir a recomposição da aprendizagem, com foco na consolidação da alfabetização, de 100% das crianças matriculadas no 3º, 4º e 5º anos, tendo em vista o impacto da pandemia para esse público.
De acordo com o MEC, em 2021, 2,8 milhões de crianças concluíram o 2º ano do Ensino Fundamental. Dados da pesquisa Alfabetiza Brasil, realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) para subsidiar o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, revelaram que 56,4% dos alunos foram considerados não alfabetizados. Além disso, estudos realizados pelo Insper mostram que um cidadão que se alfabetiza tem o dobro da renda, 26% mais chances de ter trabalho formal e 11% mais chances de ter uma boa saúde do que quem não se alfabetizou.
— Temos uma ambição e dever com essas crianças. Quando a criança não consegue se alfabetizar na idade certa aumenta a evasão escolar. Somente 64% das crianças que entram no Ensino Fundamental terminam o Ensino Médio. Estamos perdendo crianças e jovens nesse país. Garantir a alfabetização é garantir primeiro a qualidade e a esperança para essa meninada e juventude brasileira — afirmou o ministro da Educação, Camilo Santana, durante o evento.
Lula, por sua vez, destacou que o objetivo é dar outro passo para preparar melhor as crianças no Ensino Fundamental.
— Nosso compromisso é claro: nenhuma criança brasileira ficará para trás. Não há nada mais importante do que garantir que as crianças exerçam seus direitos, incluindo o de ser alfabetizadas — apontou.
Cinco eixos
O compromisso defende o protagonismo dos Estados e municípios, com coordenação e assistência técnica e financeira do MEC. Desta maneira, Estados e municípios vão elaborar juntos as próprias políticas de alfabetização, de acordo com suas realidades. Para isso, serão criados comitês estratégicos estaduais e a nível nacional, bem como comissões técnicas, além da Rede Nacional de Articulação de Gestão e Formação do Compromisso Nacional Criança Alfabetizada (Renalfa).
Em regime de colaboração federativa, o compromisso será executado por meio de cinco eixos — com responsabilidades distintas para MEC, Estados e municípios:
- Gestão e Governança: bolsas para articuladores, sendo 27 para secretarias estaduais de Educação, 26 para a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), 1,6 mil para regionais e 5.570 para municípios, totalizando 7.223 bolsas; apoio para a elaboração de políticas territoriais.
- Formação de Profissionais de Educação: recursos para a viabilização de formações locais; plataforma virtual interativa para formações; avaliação e credenciamento de programas de formação.
- Infraestrutura Física e Pedagógica: recursos financeiros para materiais didáticos complementares e pedagógicos; livros de literatura infantil; Cantinho da Leitura; recursos para melhoria e expansão da infraestrutura escolar.
- Reconhecimento de Boas Práticas: prêmios para gestores públicos comprometidos com o desenvolvimento de políticas públicas efetivas para o avanço da alfabetização e que atuam, intencionalmente, para diminuir desigualdades educacionais, sociais e raciais.
- Sistemas de Avaliação: avaliação da leitura; produção de parâmetros técnicos que permitam a comparabilidade das avaliações estaduais e nacional; assistência técnica para aplicação e correção de avaliações.
— Esse deve ser um compromisso de todos, independentemente de questões políticas e partidárias. Estamos falando do futuro da nação das crianças brasileiras. Que a gente possa dar as mãos unidos e garantir que esse retrato, de termos quase 60% das crianças sem saber ler e escrever na idade certa, possa ser revertido em um futuro breve — destacou o ministro da Educação.
Os Estados e municípios poderão fazer a adesão à política via Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle (Simec). Nos 90 dias seguintes à publicação do documento oficial, ambos poderão colaborar para a formulação da política territorial. Para isso, poderão organizar seminários, escutas e audiências, entre outras medidas.
Conforme o MEC, espera-se que os sistemas de ensino possam avançar progressivamente e estruturar três pilares para a sustentabilidade e institucionalização do compromisso: equipe técnica dedicada à política de alfabetização; normas consolidadas, com ação articulada com os conselhos de educação e órgãos legislativos; e priorização do orçamento local para a alfabetização.