Ampliação de vagas em creches
Ampliação de vagas em creches é desafio para futuros gestores municipais
Segundo a plataforma Primeira Infância, o índice de atendimento em creches no RS foi de 41,55% em 2023. Na pré-escola, o percentual é de 86,51%
Construção de escolas, compra de vagas e informatização: quais as soluções apontadas por especialistas para as filas em creches no RS
Estado é o sétimo do Brasil com a maior demanda reprimida nesta etapa, com 38.835 crianças. Profissionais ressaltam que além das vagas, atendimento deve ser de qualidade
Problema histórico no Brasil, a falta de vagas em creches foi tema de novo relatório apresentado pelo Ministério da Educação (MEC). Conforme o levantamento, são 632 mil crianças de zero a três anos aguardando em filas para acessar a Educação Infantil no país. Só no Rio Grande do Sul, a demanda reprimida é de 38.835 vagas. Pensando nisso, especialistas discutem estratégias para garantir o direito constitucional às famílias.
Entre as propostas, estão a construção de escolas e conclusão de estruturas inacabadas, compra de vagas em Organizações da Sociedade Civil (OSCs) e instituições privadas e informatização de sistemas. As opiniões, porém, não são unânimes. O que é compartilhado entre os profissionais é a necessidade de que o serviço seja prestado com qualidade para os estudantes.
Para a professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) Andréia Mendes dos Santos, uma resposta inicial está nos investimentos de diferentes ordens, incluindo a construção e instrumentalização de novas escolas.
— A solução vem pela ampliação da oferta. O que podemos pensar é como conseguir a ampliação, que se dá através desses exemplos, que são de investimento. Também pensar em parcerias, na formação dos profissionais, na qualidade dessa escola. É isso o que vai tornar a Educação Infantil mais forte — afirma, citando que um dos critérios para a organização das propostas é a territorialidade, com debate em parceria com as comunidades.
Além das obras e da busca por prédios municipais ou estaduais que possam ser aproveitados para a Educação, a gerente de políticas públicas da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal – entidade que atua pela promoção do desenvolvimento das crianças desde 2007 – Beatriz Abuchaim indica a compra de vagas em OSCs:
— Temos o case de São Paulo, em que mais de 80% das vagas em creches são por meio de instituições parceiras, filantrópicas. A própria prefeitura garante que esses profissionais tenham a mesma formação de quem está trabalhando na rede direta. Não é o processo perfeito, mas foi se especializando ao longo do tempo.
Porém, Beatriz afirma que é necessário realizar a supervisão das unidades e controle de qualidade em termos de ambiente, alimentação e práticas pedagógicas. Já no caso das vagas compradas em unidades privadas, a especialista questiona se há a mesma possibilidade de fiscalização, tendo em vista que ocorre uma pulverização das crianças em diversas instituições.
É importante entender que a terceirização, por convênios ou compra de vagas, nunca é a melhor opção em termos de qualidade da oferta.
PAULO FOCHI- Professor da Escola de Humanidades da Unisinos
Na avaliação do professor da Escola de Humanidades da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) Paulo Fochi, a compra de vagas não é a melhor alternativa. As filas para o acesso, segundo ele, são equacionadas com a construção de escolas.
— É importante entender que a terceirização, por convênios ou compra de vagas, nunca é a melhor opção em termos de qualidade da oferta. Isso passa por várias questões: infraestrutura, o valor que é repassado pelo governo federal por criança, que é abaixo (do processo tradicional), condições de trabalho dos professores mais precárias, salário menor... Tudo isso, no final das contas, vai impactar na qualidade — avalia.
Informatização, critérios e formas de atendimento
Outros fatores citados por Beatriz para que o processo seja qualificado são a informatização das filas, com o objetivo de dar transparência aos encaminhamentos (recomendação expedida pelo Ministério Público do RS), e estabelecimento de critérios de priorização: como os de crianças com deficiência e as que estejam expostas a violência doméstica.
— A principal coisa é saber qual é a demanda por creche em cada município. Ter isso organizado e informatizado. Um ponto do levantamento que chamou a atenção é que apenas 11% das cidades brasileiras têm sistemas integrados de dados em relação à demanda de creche. Muitos processos são feitos ainda no papel — sublinha a gerente.
Para o professor Fochi, a questão da universalização também deve ser discutida. O especialista salienta que a “vaga pela vaga” não é a resposta:
— A universalização esbarra em uma questão que os municípios, para ampliar o serviço e avançar no número de vagas, parcializam o atendimento. É comum a muitas cidades a retirada de crianças do turno integral e parcialização desses acompanhamentos. O que uma criança de seis anos, que está em um turno na escola, faz no restante do tempo? — questiona o professor.
Falta de universalização na pré-escola preocupa
A representante da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal destaca que a meta da universalização da pré-escola, ainda não atingida, é mais um dado que preocupa.
— É muito importante que os governos municipais façam uma busca ativa escolas dessas crianças, informando para as famílias que essa faixa etária tem matrícula obrigatória. E, tendo realizado a matrícula, que acompanhem a frequência escolar. Até mesmo porque os alunos que estão fora geralmente são os de maior vulnerabilidade — justifica Beatriz.
Desenvolvimento infantil
O acesso à educação inclusiva e equitativa e de qualidade faz parte da agenda 2030 para a Educação, parte dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no Brasil, ação em parceria com a Organização das Nações Unidas (ONU). Quando o atendimento é privado, a professora Andréia afirma que a criança está "perdendo tudo".
— Está perdendo de fazer amarrações de qualidade sobre aquilo que acontece no cotidiano dela. A Educação Infantil apresenta o mundo para a criança. Sem isso, ela não descobre experiências, acompanhadas do professor. Perde todo o repertório que é base para as aprendizagens, concretas e de conteúdo, que vêm a partir do Ensino Fundamental. Sem falar das questões socioemocionais.
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