Andamento da Educação em São Paulo

Andamento da Educação em São Paulo

 

 

 

Não é de hoje, mas agora é muito grave

Observações sobre o andamento da Educação em São Paulo

Claudia Arruda Campos

 

No momento não só a imprensa alternativa, melhor fonte de informação sobre as movimentações políticas, mas até a imprensa morna dos grandes jornais e telejornais tem publicado matérias sobre medidas exorbitantes que caem sobre a Educação em São Paulo, seja no Estado, seja no Município.

Igualmente tem sido difícil deixar de estampar notícias sobre as manifestações das comunidades escolares no âmbito do Município por conta de medida, no mínimo estranha, da Prefeitura que retirou 25 diretores de suas unidades, por um ano, a pretexto e um curso de “reciclagem” para melhor gestão. Suas escolas estariam entre aquelas com pior índice de avaliação (IDEB IDEP). Não procede. Apenas parte das escolas teriam problemas quanto a índices de avaliação. Entre as escolhidas encontra- se até escola que teve projetos premiados pelo sucesso em atendimento a alunos estrangeiros _ mais de um prêmio, incluindo o da UNESCO. Há diretores com pós graduação e especializações.

Existe mesmo questionamento quanto à funcionalidade desses índices avaliadores até por desconsiderarem as condições socioambientais das escolas. O mais danoso, porém, das avaliações numéricas é que, se foram projetadas como apoios para se pensarem melhoras no aprendizado, acabaram por se tornar metas a atingir como em qualquer empresa.

Parece haver algo em comum entre os diretores afastados: seriam pedagogicamente progressistas. Isso faz supor uma remoção de obstáculos, não só por conta desses diretores, mas pelo temor que se propagaria entre outros.

Além dessa ocorrência cuja arbitrariedade é gritante, outras medidas suspeitosas acontecem em São Paulo. Por exemplo, no Estado não se abrem concursos, professores já concursados não são chamados a ocuparem vagas. Os professores não efetivos, número que só aumenta, têm seu contrato garantido por no máximo um ano letivo. Acabou o ano, contrato rompido e o profissional tem que recomeçar a enfrentar filas para encontrar vaga.

Pode haver outros interesses até financeiros nesse procedimento, mas um de cunho estratégico é evidente: trata-se de quebrar a força, a união que nasce da convivência entre os colegas e sufocá-los num clima de instabilidade profissional.

Isso faz parte de todo um plano – estadual e municipal – cujo principal objetivo seria a privatização das escolas. O Município já fez um balão de ensaio a partir de uma escola particular confessional de interesse estratégico até pela localização e que estava para fechar as portas. Agora já começa, ainda com cautela, com jeito de medida experimental, a definir umas poucas escolas a serem, em curto prazo, privatizadas. São

unidades ainda em construção, portanto sem a presença de pessoal que possa se levantar contra a medida.

O Estado foi mais ousado: já estabeleceu uma lista com mais de centena de unidades a serem oferecidas a iniciativa privada.

As escolas privatizadas seriam entregues a organizações ditas sem fins lucrativos que se ocupariam da gerência das unidades escolares o que inclui a contratação de pessoal.

Mais professores em situação precária, seus contratos sujeitos ao cumprimento de metas.

O poder público, ao que até agora revela, além de entrar com um aporte financeiro para as organizações incumbidas, forneceria uniformes e… conteúdos a serem ensinados! Sim, independente das condições e planos das escolas, temos agora à vista conteúdos prontos e determinados para todas as escolas. Já se implantou isso no sistema estadual com resultados por vezes toscos como erros risíveis: imagine-se um conteúdo geográfico falar nas “praias de São Paulo”. Sim, São Paulo, capital. Mas o mais provável é que o poder público se desincumba até de conteúdos a ensinar. No máximo vagas diretrizes pedagógicas e – isso sim – estritas metas numéricas.

É o que já se operou nos equipamentos da Saúde. Raras UBS restam não privatizadas. Amas, hospitais… tudo entregue à iniciativa privada. Careceríamos de um informe sobre como se deu essa implantação e por que não se pode reagir.

Em outra ocasião seria importante falar das outras tantas distorções que assaltam a Educação paulista. Agora economizo a paciência do leitor. Destaco apenas uma iniciativa do poder público sobre a Educação, e que não se restringe ao estado de São Paulo: a introdução das escolas cívico militares, medida que de início não me parecia integrar um plano de Educação, sendo apenas uma janelinha para agradar aos militares reformados que ganham agora um gordo bico de serviço leve, recebendo mais do que professores.

Os militares iriam apoiar o ensino, ajudando no disciplinamento dos alunos, oferecendo atividades no contraturno, sem interferir no projeto pedagógico a ser desenvolvido em sala de aula. Só um erro gritante: um projeto pedagógico não se restringe às salas de aula.

Não é bem assim. Por relatos que vêm de estados onde o modelo já se encontra enraizado há interferência na sala de aula a começar pelo modo de os alunos receberem os professores, pelo alçamento de alunos a representantes do poder externo. E há também interferências sobre o trabalho de professores, chegando a censura de questões em provas.

Em princípio a introdução de uma ideologia nas escolas, a medida é também uma forma de amedrontar professores e quebrar-lhes resistências a intervenções mais substanciais. Acabar com o ensino público?

Já passamos por alguns planos infelizes de modernização educacional. Comecemos pelo Acordo Mec-Usaid, de 1967. Causou tantas resistências – até de setores conservadores – que foi preciso engavetá-lo. Desde lá, no entanto já nos ficou um dano hoje irreparável: o sementeiro da proliferação de faculdades particulares.

Engavetado o projeto exótico, tratou-se de forjar um similar inteiramente nacional, que tomou corpo na Lei 5692/71, chamada de Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Foi com base nessa lei, por ex, que se extinguiu a separação entre Curso Clássico e Curso Científico, criando-se um curso de 2ºgrau comum com elementos de ambas as carreiras.

Será mais útil tratar dessas reformas na ocasião em que se considere o NEM ( Novo Ensino Médio). Por ora o que quero destacar é que aqueles planos, problemáticos embora, eram realmente planos educacionais, envolviam um conceito de Educação que se pretendia mais próxima do mundo do trabalho.

Esse espectro ainda assombra planos educacionais até aparentemente progressistas, mas o que se passa em São Paulo não tem sequer a sombra de um projeto educacional – nem do pior deles. É tão só um projeto sem máscaras para o poder público se desincumbir do ônus de assumir educação pública.


Claudia Arruda Campos

Kauê- Claudia de Arruda Campos. Ingressou no magistério público em 1968.
Só não pode encarar o que hoje se chama Fundamental I. De resto percorreu todos os níveis de ensino público, além algumas modalidades no ensino privado. Participou, o que muito lhe honra, do movimento que, em 1978, expulsou os pelegos da APEOESP .

FONTE:

https://68naluta.blog/2025/06/13/nao-e-de-hoje-mas-agora-e-muito-grave/

 

 




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