Ato com aula pública

Ato com aula pública

Aula pública denuncia ofensiva privada sobre educação pública e democracia

Sindicatos de servidores públicos promoveram aula pública na Praça da Matriz para denunciar desmonte do Estado. (Foto: Luiza Castro/Sul21)

Marco Weissheimer

O setor privado lançou uma ofensiva, em várias frentes, sobre a educação pública brasileira, não somente pela via das privatizações, mas também por meio de instrumentos como parcerias público-privadas que vêm se expandindo em diferentes níveis pelo país. O alerta foi feito por Liane Maria Bernardi, professora aposentada da rede municipal de Porto Alegre, doutora e pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que proferiu uma das aulas públicas realizadas na tarde desta terça-feira (13), na Praça da Matriz, em frente ao Palácio Piratini. O ato #OcupaMatriz foi organizado pelo CPERS Sindicato, Ugeirm, Senergisul, Sindicaixa e Sidsepe/RS em defesa da Previdência, da Educação e das liberdades democráticas.

A pesquisadora chamou a atenção para a atuação organizada das entidades empresariais, em nível nacional, para ter acesso ao “filão” da educação pública. “Esses empresários, desde 2007, vendem tecnologias empresariais. Além disso, estão se organizando como classe e procurando pautar políticas de educação e a própria definição de currículos. Eles criaram em 2013 um movimento nacional pela base curricular e formularam inclusive propostas de implantação dessa base. Além disso, desde 2016, eles estão atuando junto aos parlamentares com propostas para um novo financiamento para o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).

Liane Bernardi: “empresários perceberam que ainda há, no setor público, um filão de recursos”. 
(Foto: Luiza Castro/Sul21)

Além da atuação direta no setor mediante escolas privadas, assinalou Liane Bernardi, os empresários perceberam que ainda existe, no setor público, um filão de mercado e de recursos. “O propósito é que o serviço seja financiado pelo Estado, mas não necessariamente executado pelo mesmo em escolas públicas. A ideia é que escolas e instituições da chamada sociedade civil passem a executar esses serviços, recebendo dinheiro do Estado para fazê-lo. Isso está sendo naturalizado aos poucos”, assinalou, citando o caso de Porto Alegre, onde a prefeitura já está assinando temos de colaboração com instituições para oferecer ensino fundamental. A pesquisadora definiu assim esse processo que está em curso:

“Enquanto ele sucateia os projetos da Escola Cidadã em Porto Alegre, ele oferece recursos ao setor privado para que passe a executar serviços nesta área. Os nossos secretários de Educação, municipal e estadual, não estão mais a serviço da rede pública, mas sim da ampliação das parcerias com organizações da sociedade civil ou mesmo empresas privadas. O desmonte que está ocorrendo não é a toa. Ele tem um propósito. É um projeto de sociedade que visa consolidar o lucro aos empresários e cada vez menos direito aos trabalhadores e direito ao acesso aos bens públicos”.

“Estamos repetindo o que aconteceu no Chile”

Helenir Aguiar Schürer: “Esse é o caminho que o Chile percorreu”.
(Foto: Luiza Castro/Sul21)

A presidente do CPERS Sindicato, Helenir Aguiar Schürer, também destacou o aprofundamento do processo de privatização da educação no Estado. “Temos o anúncio de que diversas escolas do campo serão cessadas. Fechar escolas no campo é incentivar o êxodo rural. Estamos vendo também, por meio dos processos de municipalização e de instituição dos vouchers na educação, a repetição de um processo que aconteceu no Chile. Esse é o caminho que o Chile percorreu e que começamos a percorrer no Brasil. Estamos organizando a categoria e a comunidade escolar para ser resistência a esse processo”.

O tema é uma das prioridades da agenda da entidade que iniciou, dia 1º de agosto, um processo de assembleias regionais, tirando delegados para o seu congresso estadual, que será realizado de 6 a 8 de setembro em Bento Gonçalves. Helenir Schürer lembrou o conjunto de violações de direitos que estão atingindo a categoria no Rio Grande do Sul.

“Há várias coisas que estão nos indignando. Em primeiro lugar, o descaso com o nosso salário, um descaso que tem um preço muito alto. Hoje, aqueles que recebem os menores salários estão recebendo treze dias depois. Em segundo lugar, a forma com que o governo vem fazendo os contratos emergenciais. Estão fazendo os contratos fechados onde os professores terminarão as aulas em dezembro sem saber se voltam no outro ano. Isso é muito desgastante porque o processo de ensino-aprendizagem é, como o nome diz, um processo. A descontinuidade, inclusive do professor, pode prejudicar a aprendizagem dos alunos. Além da forma do ensinar, há outro componente muito importante que é a afetividade. Isso se perde com essas incertezas e interrupções”.

O congresso estadual do CPERS servirá também como termômetro para a direção do sindicato avaliar a possibilidade de uma greve. “Não teremos a irresponsabilidade de deflagrar uma greve frágil. Vamos construí-la. Pode ser que seja esse ano, pode ser que seja no início do ano que vem. Estamos em meio a esse processo de construção”.

Vitória de ideias fascistas e resistência

Pedro Ruas: “A tragédia social que vivemos hoje também é uma falta de reconhecimento”.
(Foto: Luiza Castro/Sul21)

O ex-deputado estadual Pedro Ruas (PSOL) destacou que o desmonte das políticas na educação, na saúde e em outras áreas vem acompanhado pelo aprofundamento de ataques ao estado democrático de direito no país.

“O Brasil vive um momento extremamente difícil. Tivemos uma vitória de ideias fascistas, lamentavelmente com forte apoio popular. Isso é muito triste. As pessoas não se dão conta de que o temos hoje de conquistas democráticas é resultado de anos de luta que envolveram o sacrifício de muitas pessoas durante a ditadura militar”, afirmou Ruas, identificando aí uma ‘tragédia social’:

“Quando falta o reconhecimento na sociedade da luta que essas pessoas tiveram, onde elas perderam patrimônio, emprego, a liberdade e a própria vida, para que tivéssemos democracia, isso representa a maior injustiça histórica que vivemos hoje. A tragédia social que vivemos hoje também é uma falta de reconhecimento”.

Ao falar sobre a capacidade de resistência social a esse quadro, Ruas avalia que ela está muito longe do que se quer, mas considera que há um avanço na unidade no campo da oposição. “Ainda não é o ideal, mas vejo uma capacidade maior de unidade das esquerdas. Isso tem avançado, gradualmente, talvez lentamente, mas tem avançado em todo o Brasil e isso é positivo”. Ele considera que é provável que isso se traduza também em alianças nas eleições municipais do ano que vem. “É o que desejo. Temos todas as condições, em muitas cidades, de deixar de lado diferenças que temos, que são verdadeiras, para construir uma unidade. Há algo muito maior que nos aflige”.

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Foto: Luiza Castro/Sul21
Foto: Luiza Castro/Sul21
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