Aumento do Salário Mínimo
O Salário Mínimo e o Terror Fiscal dos Conservadores
03/09/2025

Por MARIA LUIZA FALCÃO SILVA*
O anúncio de que o salário mínimo em 2026 será de R$ 1.631 provocou imediato barulho no campo conservador. Não surpreende: a cada reajuste, repete-se a mesma ladainha sobre “colapso da Previdência”, “aumento insustentável do déficit” e “irresponsabilidade populista”. Mas a narrativa não resiste a uma análise mais honesta. O salário mínimo não é um luxo, é um direito constitucional, parte essencial da rede de proteção social brasileira, e também um instrumento de dinamização da economia.
Basta observar a realidade: nas pequenas cidades, sobretudo no interior, o que garante vitalidade ao comércio local são as aposentadorias e pensões vinculadas ao mínimo. O acréscimo de alguns reais no contracheque de milhões de famílias se transforma em consumo imediato, irrigando atividades que, de outro modo, estariam paralisadas. O salário mínimo tem, portanto, duplo papel: protege o trabalhador e funciona como política anticíclica em um país ainda marcado pela desigualdade e pelo desemprego estrutural.
O argumento de que esse reajuste ameaça a Previdência é falacioso. O impacto é real, mas absolutamente previsível e já considerado nas contas públicas. A Previdência não “quebra” por causa do salário mínimo, mas sim quando se tolera a precarização do mercado de trabalho, que reduz contribuições, quando se abrem exceções para setores privilegiados e quando se fecha os olhos para fraudes e renúncias bilionárias. O que falta é enfrentar as distorções e ampliar a base de financiamento, e não penalizar os mais pobres em nome de um suposto equilíbrio que nunca toca nos de cima.
O mesmo se aplica ao déficit. Há décadas, naturalizou-se a ideia de que qualquer gasto social é ameaça às contas públicas, enquanto os verdadeiros ralos do orçamento permanecem intocados. É preciso dizer com todas as letras: o déficit brasileiro está menos relacionado ao gasto com políticas sociais do que à combinação de juros exorbitantes e estrutura tributária regressiva. O peso da dívida pública não decorre de aposentados que recebem um salário mínimo, mas da transferência cotidiana de recursos do Tesouro para o rentismo financeiro. Enquanto isso, o sistema tributário continua cobrando pesadamente sobre o consumo popular e aliviando os mais ricos.
Se o país tivesse a coragem de enfrentar a questão tributária, muito da polêmica em torno do salário mínimo desapareceria. Não é utopia: bastaria alinhar o Brasil ao que já se pratica no mundo. Cobrar imposto sobre lucros e dividendos, algo que quase todos os países fazem, é uma medida básica de justiça fiscal. Ampliar as faixas progressivas do Imposto de Renda, de modo que quem ganha mais contribua mais, é outro passo óbvio. Rever isenções que beneficiam setores de alta rentabilidade e criar instrumentos de tributação sobre grandes patrimônios, heranças e fortunas são medidas que, longe de serem radicais, são o mínimo que se espera de uma democracia madura. O problema não é técnico, é político.
E política é o que não falta no debate. O governo, ao propor R$ 40 bilhões em emendas para acomodar sua base, mostra que recursos existem e podem ser realocados. Se há espaço para atender demandas fisiológicas, certamente há espaço para cumprir a Constituição e assegurar ganho real ao mínimo. O discurso da escassez, tão repetido, é seletivo: falta dinheiro quando se trata de salários, previdência ou assistência, mas sobra quando o tema são juros, renúncias fiscais ou emendas parlamentares.
Transformar o salário mínimo em vilão é um truque antigo, usado para esconder a verdadeira questão: quem paga a conta do Estado brasileiro? A resposta, até hoje, tem sido desfavorável à maioria. O trabalhador assalariado, o consumidor, o pequeno empreendedor são chamados a sustentar um sistema que poupa os mais ricos e recompensa o rentismo. O reajuste do mínimo, longe de ser ameaça, é oportunidade para recolocar esse debate em outro patamar.
O Brasil precisa decidir se continuará prisioneiro de um modelo fiscal que preserva privilégios e sacrifica direitos ou se terá coragem de construir uma tributação mais justa e eficiente. O reajuste do salário mínimo não é o problema; o problema é a recusa sistemática de enfrentar os verdadeiros nós da desigualdade. O resto é lero-lero fiscal, repetido à exaustão para intimidar a sociedade e manter intacto o pacto de privilégios que atravessa nossa história.
*Maria Luiza Falcão Silva é PhD pela Heriot-Watt University, Escócia, Professora Aposentada da Universidade de Brasília e integra o Grupo Brasil-China de Economia das Mudanças do Clima (GBCMC) do Neasia/UnB. É membro da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (ABED). Entre outros, é autora de Modern Exchange Rate Regimes, Stabilisation Programmes and Co-ordination of Macroeconomic Policies, Ashgate, England/USA.
Foto de capa: Reprodução
FONTE:
https://red.org.br/noticias/o-salario-minimo-e-o-terror-fiscal-dos-conservadores/
Aumento do salário mínimo recompensará poder de compra perdido no governo Bolsonaro
31 de
Aumento para R$ 1.412 em 2023 pelo governo Lula “mais do que compensa” a perda durante governo Bolsonaro, mostra DIEESE
O aumento do salário mínimo para R$ 1.412 em 2023 pelo governo Lula “mais do que compensa” a perda do poder de compra dos brasileiros durante o governo Bolsonaro. É a conclusão do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), divulgada em nota técnica.
Nos últimos três anos do governo de Jair Bolsonaro, não houve aumento real do salário mínimo, sendo que os ajustes apenas visaram acompanhar a inflação.
“Em 2020, o valor [o salário mínimo] praticamente não foi alterado. Em 2021, não houve incorporação de qualquer ganho real, exceto por reflexo do pequeno arredondamento para o valor de R$ 1.100,00. Para 2022, o ocorrido no ano anterior se repetiu: o salário mínimo não teve aumento real, somente acompanhou a inflação medida pelo INPC.”
“Em 2023, foi fixado o valor de R$ 1.302,00, que significou aumento real de 1,41% no piso nacional. Como o valor para 1º de maio foi alterado para R$ 1.320,00 e a variação do INPC foi de 2,42% no quadrimestre janeiro-abril, o reajuste de 1,38% não foi capaz de recompor o poder de compra fixado em 01/01/2023”, trouxe a nota técnica do órgão.
Segundo o DIEESE, o reajuste fixado por Lula para janeiro de 2024 “mais do que compensa essa perda ocasional, resultando em ganho real de 5,77% em relação a maio de 2023”.
O documento busca analisar como os reajustes do salário mínimo, ainda que repondo os dados da inflação, acompanham ou não o poder de compra.
“Mesmo com reposição da inflação, houve perda do poder de compra em relação aos preços dos alimentos, que tiveram aumento considerável e pesam muito no orçamento familiar da classe trabalhadora”, explica a nota.
De acordo com o Departamento, 59,3 milhões de brasileiros têm a remuneração com base no salário mínimo. Na prática, esse reajuste representará um incremento de R$ 69,9 bilhões de renda na economia do país.
Poder de compra pela cesta básica
Uma das formas de se calcular o poder de compra é pelo custo da cesta básica. O DIEESE mostra que, em maio de 2023, a cesta básica valia R$ 791,82. “Assim, o salário mínimo nacional de R$ 1.320 tinha, naquele momento, poder de compra equivalente a 1,67 cestas básicas”.
“Em 1º de janeiro, estimando uma cesta com valor de R$ 772,98, o salário mínimo poderá comprar 1,83 cesta básica”, calcula. E acrescenta: “A quantidade de 1,83 cesta básica é a maior desde setembro de 2020”.
Reajuste ajudará servidores públicos nordestinos
Outra revelação do DIEESE é que se olhada a administração pública, pouco influencia o aumento do salário mínimo para carreiras federais e estaduais, já os servidores municipais, principalmente do Nordeste do Brasil, se veem impactados por esse reajuste.
São 23.8% os servidores públicos municipais do Nordeste e 18,82% do Norte que recebem até o salário mínimo, enquanto que nas esferas federais essas porcentagens são de 1,78% e 0,78%, respectivamente. E os servidores municipais de outros estados também tem a minoria recebendo até o salário mínimo.
Publicado em GGN.
Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil
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