Cadê os royalties?

Cadê os royalties?

Cadê os royalties para Educação?

Uma combinação de fatores impede que recursos do pré-sal sejam plenamente usados

Fonte: Gazeta do Povo (PR)  20 de julho de 2015

O Fundo Social, que destina 50% dos royalties da exploração do pré-sal para a educação básica, ainda está longe de ser o trampolim para o salto de qualidade no ensino brasileiro. Em 2015, apenas 10% do montante orçado foi pago até a metade do ano. Ao longo de 2014, apenas 30% foram usados. Com esse desempenho e a ameaça de mudanças no regime de partilha do pré-sal, surgem dúvidas sobre a capacidade de o país financiar as metas estipuladas no Plano Nacional de Educação (PNE).

A expectativa era de que o fundo arrecadasse R$ 6,7 bilhões em 2014. Metade disso iria para a educação. Porém, apenas R$ 1 bilhão foi efetivamente destinado para melhorar o sistema de ensino. O orçamento total da educação foi de R$ 88 bilhões. Para este ano, a estimativa para o fundo é de R$ 6,9 bilhões. Até agora, entretanto, não há sinal de que esse dinheiro vai entrar no fundo.

Segundo o governo federal, o grande entrave é uma decisão liminar da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia, que em março de 2013 cancelou a distribuição dos royalties, como determinado pela Lei nº 12.734/2012. Sem previsão para julgamento da questão, o Fundo Social continuará recebendo menos recursos de royalties do que o projetado. A liminar também afetou a arrecadação de estados e municípios. O que está valendo é o regime antigo de distribuição, de 1997.

Nova lei
O Fundo Social pode ainda sofrer outro revés. O Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 131/2015, do senador José Serra, retira a obrigatoriedade de participação mínima da Petrobras no consórcio de exploração do pré-sal. Fora a discussão sobre soberania nacional, essa mudança reduziria drasticamente os recursos do fundo, segundo cálculos do especialista em petróleo Paulo César Lima, consultor legislativo da Câmara dos Deputados. Se a mudança valesse para o campo de Libra, por exemplo, haveria uma perda de R$ 100 bilhões, dos quais R$ 50 bilhões para a educação.

Os dados foram apresentados em sessão no Senado em 30 de junho. Segundo Lima, outras empresas teriam um custo maior com a extração, por não ter a infraestrutura que a Petrobras dispõe. “Se o custo sobe, diminui o excedente em óleo. Se diminui o excedente em óleo, diminui também o excedente em óleo da União. Então, a União perde receitas. Quem perde receitas? O fundo”, declarou.

O ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, pediu aos senadores que o petróleo do pré-sal “não seja queimado à toa”. Serra negou que o projeto modifique os recursos destinados ao fundo. Segundo ele, os royalties são pagos de qualquer maneira, independentemente da empresa exploradora. Pelas polêmicas levantadas, foi criada uma comissão para analisar o projeto. O tema, que tramitava em caráter de urgência, será analisado com mais calma. A primeira reunião está marcada para 4 de agosto.

Queda no preço do petróleo reduz repasses
Além da discussão no Supremo Tribunal Federal (STF), há vários obstáculos para que os recursos do pré-sal sejam plenamente usados na educação, segundo o doutor em políticas públicas em educação Luiz Araújo, professor da Universidade de Brasília (UnB). Para ele, o problema inicial está na expectativa com o preço do petróleo. “Trabalhou-se com um valor de US$ 80 o barril, o que se mostrou pouco factível, ainda mais agora, com o acordo anunciado com o Irã. A tendência é de queda nos preços”, diz.

Araújo, que é presidente nacional do PSol, considera “nocivo” o projeto do senador José Serra, por reduzir os dividendos e a participação especial da Petrobras, o que, indiretamente, prejudica o Fundo Social. Outro problema, diz ele, é a falta de regulamentação do uso dos recursos do fundo para a educação e a saúde.

“O ideal seria vincular o dinheiro com alguma das metas do PNE [Plano Nacional de Educação]”. Sem a regulamentação, o governo federal fica livre para cortar verbas do Ministério da Educação (MEC) e usar o Fundo Social para “cobrir o buraco”. “Isso fica dentro da lei, usar o dinheiro do fundo para a educação. Mas, na verdade, é um dinheiro que está sendo contingenciado. É um artifício contábil”, critica.

Mais verba e gestão
Os especialistas ouvidos pela reportagem ressaltam que houve expectativa exagerada com o dinheiro do pré-sal como fonte financiadora da melhora do ensino. “Não é o pré-sal que vai resolver os problemas da educação, mas sem ele vai ser muito mais difícil. Ainda mais com riscos que surgem, como o projeto do José Serra”, observa o presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca), José Marcelino Rezende Pinto.

A diretora-executiva do movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz, ressalta que é preciso investir em gestão, e que o dinheiro por si só não resolve. “Não conseguiremos bons resultados sem gestão, mesmo com dinheiro. Não adianta investir no que está mal arquitetado.”

MEC
Por meio da assessoria de imprensa, o Ministério da Educação (MEC) informou que a medida cautelar da ministra Cármen Lúcia está limitando os recursos para o Fundo Social. O órgão minimizou ainda o risco de não cumprimento da meta do Plano Nacional de Educação (PNE) de investimento de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação. O objetivo, diz o MEC, “leva em consideração a participação de todos os entes federativos”, e por isso os recursos do Fundo Social “serão mais uma fonte a contribuir para atingir a meta”.

R$ 926 milhões
É o valor que os municípios e o estado do Paraná teriam recebido entre abril de 2013 e dezembro de 2014 caso a Lei nº 12.374 estivesse em vigor. Desse total, 75% seria destinado à educação, conforme previsto na Lei Estadual nº 18.139/2014.

Prefeitos tentam convencer o STF
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) tem sido a principal porta-voz na batalha para tentar derrubar a decisão judicial que impede a distribuição de recursos de royalties pela Lei nº 12.734/2012. Em maio, durante a marcha anual de prefeitos a Brasília, os gestores foram convidados a fazer um abaixo-assinado para ser encaminhado à ministra Cármen Lúcia, relatora da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que trata do tema.

A lei questionada prevê a distribuição de royalties e fundo especial para todos os municípios e estados, mesmo os não produtores de petróleo. O pedido partiu do Rio de Janeiro, que se sentiu prejudicado com as novas regras e ingressou com a ADI nº 4.917.

Com a liminar expedida por Cármem Lúcia em março de 2013, apenas os produtores e confrontantes estão recebendo os recursos. Estudo da CNM divulgado no mês passado aponta que o conjunto de municípios e estados deixou de receber cerca de R$ 15,7 bilhões em decorrência da liminar.

Segundo a CNM, se a Lei nº 12.734 estivesse em vigor, as cidades do Paraná e o estado teriam recebido um acréscimo de R$ 780 milhões entre abril de 2013 e dezembro de 2014. O valor efetivamente pago chegou a R$ 146 milhões.

 

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