Canetadas desiguais no Orçamento

Canetadas desiguais no Orçamento

As canetadas desiguais de Bolsonaro no Orçamento

As prioridades do governo: gasto com “emendas do relator” supera compra de vacinas. Pensões militares consomem 66 vezes mais recursos que combate ao desmatamento. Mudanças climáticas foram a área que menos recebeu investimentos

Publicado 28/01/2022

Por Camille LichottiMarta Salomon e Renata Buono, na Piauí


Os investimentos feitos com o Orçamento da União em 2021 deixam claras as prioridades do governo. Foram gastos quase 17 bilhões de reais com emendas de relator, instrumento pouco transparente de repasse de verbas dos parlamentares. Esse valor superou o gasto do governo com a compra de vacinas da Pfizer. O principal destino das emendas parlamentares foi a compra de máquinas de construção produzidas por uma empresa de Minas Gerais. Para isso, o governo desembolsou 382 milhões de reais – oito vezes o dinheiro usado em apoio à educação infantil. Os militares também receberam uma fatia generosa do Orçamento. A compra de caças para a Força Aérea Brasileira, por exemplo, custou 1,4 bilhão de reais – onze vezes o valor usado para proteger terras e direitos indígenas. Alguns setores foram preteridos. O pacote de investimentos relacionados às mudanças climáticas – que inclui estudos e projetos para a redução das emissões de carbono – ficou na última posição do ranking de investimentos do governo. O =igualdades desta semana ilustra o desequilíbrio na utilização do Orçamento da União em 2021.

A União destinou 16,7 bilhões de reais do Orçamento de 2021 às emendas de relator, instrumento pouco transparente de repasse de verbas a parlamentares. Esse valor supera o que foi pago na compra de vacinas contra a Covid-19 da farmacêutica Pfizer – 12,2 bilhões de reais. A Pfizer foi a empresa que mais recebeu recursos da União no último ano, durante a maior campanha de imunização da história do país. Até dezembro de 2021, o Brasil aplicou 153 milhões de doses de vacina da Pfizer – quase metade do total de doses. 

O principal destino das emendas parlamentares em 2021 foi a compra de caminhões guindaste, carregadeiras, escavadeiras, motoniveladoras e rolos compactadores da empresa XCMG Brasil Indústria LTDA, localizada em Minas Gerais. Ao todo, os parlamentares destinaram 382 milhões de reais do Orçamento à compra desse maquinário. Já para a construção e ampliação de escolas de educação infantil, incluindo compra de equipamentos e mobiliário, o governo empenhou 50 milhões de reais.

 A pavimentação de vias, muito visada por parlamentares que desejam agradar seus redutos eleitorais, consumiu 9,6 bilhões de reais do Orçamento da União em 2021. Isso é quase triplo do valor necessário para garantir que alunos e professores de escolas públicas tenham acesso à internet – ação que o governo fez de tudo para não executar. O projeto de conectar alunos da rede pública à internet foi aprovado pelo Congresso no início de 2021. O presidente Jair Bolsonaro vetou o projeto, os parlamentares derrubaram o veto, e Bolsonaro recorreu então ao STF para não ter que liberar o dinheiro.

Os equipamentos militares figuram entre os maiores investimentos do governo federal. A aquisição de caças para a FAB custou 1,4 bilhão de reais aos cofres públicos em 2021. A compra faz parte do pacote de programas da Defesa Nacional, que ocupa o segundo lugar no ranking dos investimentos mais caros do Orçamento – 7 bilhões, ao todo. Enquanto isso, programas de proteção a territórios indígenas receberam uma fatia muito menor do bolo. Nessa área, o governo empenhou 130 milhões de reais do Orçamento de 2021.

Em 2021, o governo federal usou 23,6 bilhões de reais do Orçamento para pagar pensões a parentes de militares. O valor destinado às pensões foi 66 vezes o investido no combate ao desmatamento (360 milhões de reais). 

O pacote de investimentos relacionados às mudanças climáticas – incluindo estudos e projetos para a redução das emissões e a adaptação aos efeitos do aquecimento global  – ficou na última posição do ranking de investimentos do governo, em 2021. A União usou apenas 134 mil reais do Orçamento para investir nessa área. O valor é metade do que foi usado para bancar as viagens internacionais do ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes – 280 mil reais. O astronauta foi quem mais gastou dinheiro público em viagens internacionais no governo.    

A distribuição de dinheiro público em emendas parlamentares também foi desproporcional. Em 2021, cada deputado ou senador teve uma cota de 16,3 milhões de reais em emendas individuais. Essas emendas são de execução obrigatória: os parlamentares indicam o destino do dinheiro, e o governo paga. A cidade de Carapicuíba, na região metropolitana de São Paulo, recebeu 50 milhões de reais do Orçamento via emendas parlamentares. Com 405 mil habitantes, foi o segundo município que mais recebeu recursos no país, atrás apenas do Rio de Janeiro. Isso significa que o governo, via emendas parlamentares, enviou a Carapicuíba 124 reais por habitante. Já a cidade de Salvador, capital da Bahia, recebeu pouco menos de 8 milhões – ou seja, 3 reais por habitante. Outros 185 municípios não receberam nenhum centavo de emendas. 

Fontes:  Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento; Tesouro Nacional; Portal do Orçamento do Senado Federal (SIGA Brasil); Portal da Transparência da Controladoria-Geral da União.

 

https://outraspalavras.net/outrasmidias/as-canetadas-desiguais-de-bolsonaro-no-orcamento/ 




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