Carga presencial mínima EaD
Carga presencial mínima nas licenciaturas EaD está em debate no CNE
Nova regra do EAD reacende polêmica: qual o mínimo presencial necessário para formar bons professores?
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 21 de julho de 2025

A recente regulamentação da educação a distância (EaD) pelo governo federal reacendeu uma polêmica de peso no campo da formação docente: qual deve ser o percentual mínimo de aulas presenciais nos cursos de licenciatura? Embora o novo marco regulatório, assinado em maio pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tenha estabelecido a modalidade semipresencial como possível para essas graduações, especialistas alertam que, na prática, o ensino presencial pode ser reduzido a apenas 7,5% da carga horária total.
A estimativa é do movimento Todos Pela Educação, que analisou os impactos da nova legislação sobre a estrutura típica das licenciaturas — hoje compostas por quatro núcleos de formação (pedagógico, específico, extensão e estágio), somando 3.200 horas ao longo de quatro anos. A crítica central é que, caso os 30% obrigatórios de atividades presenciais sejam absorvidos apenas pelos estágios e as atividades de extensão, restariam apenas 240 horas presenciais para os conteúdos específicos e pedagógicos.
“Esse cenário compromete significativamente a aprendizagem prática cotidiana, indispensável ao desenvolvimento profissional do futuro professor”, aponta o estudo. Para a presidente-executiva da entidade, Priscila Cruz, “o fator que mais explica a qualidade do ensino no país é a qualidade dos professores. E a qualidade dos professores depende diretamente da formação que recebem”.
A legislação atual não detalha como os diferentes tipos de atividades — presenciais, síncronas mediadas (remotas em tempo real) e assíncronas (feitas a qualquer tempo) — devem se distribuir entre os núcleos curriculares. Essa ausência de diretrizes específicas permite interpretações divergentes, criando um vácuo normativo que o Conselho Nacional de Educação (CNE) e o Ministério da Educação (MEC) tentam agora preencher.
A questão nas mãos do CNE
Márcia Sebastiani, relatora da Comissão Bicameral de Formação Inicial e Continuada de Professores e Gestores da Educação do CNE, reconhece a complexidade do debate. “Estamos analisando a situação e as diferentes propostas. É uma situação complexa… e seja qual for a decisão final, não vai agradar a todos”, afirmou à reportagem.
Ela explica que há visões distintas sobre o que caracteriza a presença em sala de aula. “Para o Todos, as atividades síncronas mediadas não são presenciais. Para outros, são. Essa diferença de entendimento altera significativamente o cálculo do tempo presencial nos cursos.”
Segundo a relatora, estão sobre a mesa pelo menos três caminhos possíveis: manter os percentuais definidos no decreto presidencial (30% presenciais e 20% síncronas), manter os critérios da Resolução 04/24 (que exige 50% de presencialidade nas licenciaturas) ou propor uma solução intermediária. “Uma carga horária entre as duas alternativas pode ser um caminho. Tudo indica que será necessário emendar a Resolução 04/24, já que ela trata de EAD em um contexto anterior ao novo marco”, disse.
Sebastiani, no entanto, evita externar sua posição pessoal. “Prefiro não, porque como relatora vou ter que seguir a maioria”, justificou.
Pensamentos divergentes carga presencial
O embate é, também, político e institucional. Enquanto entidades como a Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes) e a Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed) defendem maior flexibilização e acolhem o novo modelo com entusiasmo, universidades públicas, a União Nacional dos Estudantes (UNE) e o próprio Todos Pela Educação pleiteiam salvaguardas à presencialidade.
Em nota, a Abmes afirmou apoiar a revisão das diretrizes, considerando-a “fundamental para garantir segurança jurídica, clareza regulatória e efetividade na aplicação das novas diretrizes”. A entidade ainda defende a ampliação do modelo para cursos superiores de tecnologia na área de saúde, argumentando que a combinação entre presencialidade e atividades síncronas mediadas pode promover “qualidade, inovação e flexibilidade”.
Do outro lado, o argumento central é que a formação de professores exige vivência real no ambiente educacional, trocas presenciais constantes e experiências práticas que não podem ser plenamente substituídas por tecnologia. Para esses grupos, a flexibilização, se não for bem delimitada, pode gerar um retrocesso na qualidade da formação docente.
Próximos passos e prazos
Apesar das pressões, o CNE não trabalha com urgência, segundo Sebastiani. “Prazo não é ponto crucial… O importante neste momento é analisar com base nos números e na realidade antes de decidir. Ouvir os dois lados, ponderar as justificativas e verificar o quanto os argumentos são reais ou ‘parcialmente reais’.”
O MEC, por sua vez, reiterou em nota que o decreto assinado em maio permite que as diretrizes curriculares de cada curso definam percentuais superiores de presencialidade, se necessário. E afirmou que “eventuais propostas de revisão das diretrizes serão avaliadas”, destacando que essa atribuição é do CNE.
As instituições de ensino superior terão até maio de 2027 para se adaptar às novas regras — prazo considerado suficiente por ambos os lados para que se construam diretrizes claras e coerentes com as necessidades da formação docente.
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