Censo da Educação Superior, EAD cresceu
Censo da Educação Superior aponta que EAD cresceu 700% em 10 anos; média é de 171 alunos por professor na rede privada
Ministro da Educação, Camilo Santana, demonstrou preocupação com o aumento e afirmou haver necessidade de prezar pela qualidade
10/10/2023 ESTADÃO CONTEÚDO
Dados do Censo da Educação Superior divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) nesta terça-feira (10), mostram uma explosão da educação a distância (EAD) no Brasil. Segundo as estatísticas, o número de cursos na modalidade ofertados no país aumentou 700% nos últimos 10 anos, saindo de 1.148 em 2012 para 9.186 no ano passado.
O crescimento na oferta de cursos EAD tem sido registrado no país desde os anos 2000. O ritmo de criação de novos cursos aumentou a partir de 2018, impulsionado pela edição de um decreto do então presidente Michel Temer no ano anterior, que flexibilizou a abertura de polos de educação a distância no país. Desde então, houve um crescimento de 189,1% na oferta de cursos nessa modalidade.
Ainda de acordo com o MEC, considerando dados da rede privada, que detém a maior parte das matrículas de Ensino Superior no país, o ensino a distância apresenta uma expressiva quantidade de alunos por professor. Os dados mostram que o número de alunos por professor na EAD é mais de sete vezes maior do que no presencial. A média é de 171 alunos para cada professor nos cursos a distância e 22 estudantes por docente na modalidade presencial.
A análise é feita anualmente pelo Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em instituições de ensino públicas e privadas. Nos últimos anos, o Censo da Educação Superior vem mostrando algumas tendências da etapa como o crescimento da EAD - sobretudo depois da pandemia de covid-19. A edição do ano passado mostrou que seis em cada 10 estudantes ingressaram no Ensino Superior na modalidade EAD. Durante a pandemia, o ensino presencial encolheu 28%.
O ministro da Educação, Camilo Santana, demonstrou preocupação com o aumento vertiginoso da EAD no Brasil. Segundo ele, o MEC vai aprimorar a regulação do setor, implementando novas diretrizes para qualificar os cursos a distância.
— Estou bastante preocupado primeiro com a qualidade desses cursos. Claro que facilita muito a vida do trabalhador, que tem que trabalhar, se deslocar. Temos de avaliar qual tipo de curso ofertado para boa formação do profissional que possa ser a distância — disse Santana.
Segundo o chefe da pasta da Educação, não se trata de "demonizar" o ensino a distancia:
— Ele é importante para facilitar a vida. Mas, quero prezar pela qualidade da oferta desses cursos.
Número de matrículas
O crescimento na quantidade de matrículas a distância é expressivo, passando de 1.113.850 em 2012 para 4.330.934 em 2022, um aumento de 289%. Apesar do aumento, o número de alunos na modalidade presencial ainda é ligeiramente maior do que na EAD: 5.112.663. A tendência de alta na educação a distância, no entanto, indica que esse modelo poderá superar em breve o ensino tradicional.
Desde 2019, o número de estudantes que ingressam no Ensino Superior a distância é superior à quantidade de pessoas que entram na modalidade presencial. Em 2022, dado mais recente, foram 3.100.556 novos ingressantes na EAD, um recorde. Enquanto isso, no presencial foram apenas 1.656.172 novos alunos.
Formação de professores
Outro ponto de preocupação do MEC é a formação de professores. Os dados do Censo mostraram que cerca de oito em cada 10 estudantes que entram em cursos de licenciatura optam pela modalidade a distância. Atualmente, 64% das matrículas nesses cursos são por EAD, o que demonstra que a maior parte dos professores de Educação Básica do país estão obtendo sua formação a distância.
— Não tenho dúvidas de que vamos ter desafios enormes em relação principalmente aos cursos de licenciatura — diz Camilo Santana.
O ministro destacou que dados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) mais recentes mostraram que é preciso melhorar a qualidade dos cursos. Segundo o ministro, nessa perspectiva, o MEC vai reservar 40% das vagas remanescentes do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para licenciaturas.
— Precisamos rever, porque o último Enade já mostrou que todas licenciaturas numa escala de 0 a 10 estão abaixo de 5. Pedagogia tem 3,6 na escala de 0 a 10. E vamos aguardar o dado do novo Enade que será apresentado — explicou.
Presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Celso Niskier destacou o papel da EAD na ampliação do acesso de estudantes às universidades. A ABMES é uma das instituições que participa do grupo de trabalho do MEC a respeito da reformulação das regras para o setor.
— EAD é fundamental para democratizar o acesso à educação superior, sem ele nossas taxas não estariam crescendo, mas é necessário sempre que isso seja feito com uma qualidade importante. Conseguimos vencer a batalha da quantidade, agora nos cabe lutar pela qualidade — defendeu Niskier.
Consulta pública debaterá o avanço do EAD
Uma consulta pública será aberta pelo MEC para debater o tema. O Ministério da Educação avalia autorizar que as graduações em Direito, Enfermagem, Odontologia e Psicologia possam ser cursadas a distância (EAD). Conselhos representativos das classes, no entanto, são contrários à medida. Já entidades das instituições de ensino particulares são favoráveis à mudança.
— Nas universidades federais, 34% dos cursos EAD são nota 4 ou 5. Na privada, são 19%. É muito baixo o número de cursos EAD de nota 4 ou 5. Eu determinei realizar uma supervisão especial nos cursos a distância para rever todo o marco regulatório disso. A nossa preocupação não é o fato de ter um curso a distância, mas garantir qualidade nesse curso que está sendo oferecido para formação desse profissional. E é impossível determinados cursos serem feitos a distância nesse país — argumentou o ministro Camilo Santana.
FONTE:
Maioria dos professores se formou em graduações EaD; proporção cai pela metade nos demais cursos
Resultado de levantamento feito pelo Todos Pela Educação com base em formandos de 2010 a 2020 preocupa especialistas
25/07/2022 ISABELLA SANDER
Seis em cada 10 professores formados entre 2010 e 2020 cursaram graduações a distância. O dado faz parte de levantamento realizado pelo Todos Pela Educação com base no Censo da Educação Superior, realizado anualmente pelo Ministério da Educação (MEC), focando em concluintes dos cursos de licenciatura e de Pedagogia.
Entre os cursos de formação inicial de professores, o percentual de graduados em educação a distância (EaD) é de 61%, sendo 57% das matrículas em instituições privadas e 4% em públicas. Quando se olha para as graduações de outras áreas, porém, a proporção cai para 25% — 24% na rede privada e 1% na pública.
A alta proporção preocupa especialistas na área. Coordenador de Políticas Educacionais do Todos pela Educação, Ivan Gontijo destaca que a diferença gritante entre o percentual de EaD em cursos de licenciatura e Pedagogia e as demais graduações demonstra que este é um fenômeno específico da formação de professores que precisa ser trazido para debate público.
— A EaD tem um custo mais baixo e, nos cursos de formação de professores, oferece um potencial de empregabilidade alto. No entanto, se não regularmos esse mercado, o que acontece é a proliferação de cursos de baixa qualidade. Precisamos trazer esse assunto para o debate público para que o Ministério da Educação enfrente a situação — analisa Ivan.
O especialista destaca que os cursos EaD são importantes enquanto exceções à regra, para permitir o acesso, por exemplo, de pessoas que moram em cidades mais remotas que não têm cursos superiores na área, ou àqueles que só assim conseguiriam conciliar o estudo com o trabalho e os cuidados com a família. No entanto, pontua a importância das atividades práticas nesses cursos.
— A “culpa” não é de quem opta por fazer esses cursos, afinal, são mais baratos e oferecem uma flexibilidade de horários maior. O problema é que a regulação que o Ministério da Educação faz sobre esses cursos é frágil. Precisamos entender qual a qualidade das graduações em EaD que temos hoje e melhorar os instrumentos de mensuração dessa qualidade — defende o coordenador.
Hoje, o MEC avalia os cursos de graduação, sejam presenciais ou a distância, por meio do Conceito Preliminar de Curso (CPC). As notas, que vão de 1 a 5, são divulgadas no e-MEC. Conforme Ivan, grande parte dos cursos tem recebido o conceito 3, uma nota intermediária, que deixa dúvidas sobre como interpretá-la.
— Toda a forma como essa regulação acontece deixa difícil entender quais cursos são bons e quais são ruins e precisam ser fechados. Precisamos melhorar essa régua, para incentivar a ampliação dos cursos bons e iniciar de forma mais contundente o fechamento dos cursos ruins — explica o especialista.
Patricia Alejandra Behar, professora da Faculdade de Educação e dos cursos de pós-graduação em Educação e em Informática na Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), observa que nos últimos anos houve um aumento expressivo no número de cursos EaD, mas ainda faltam pessoas capacitadas para ministrar essas formações com qualidade. No entanto, ressalta a seriedade do assunto quando se fala em formação de professores.
— É preciso tempo e prática para formar professores, e essa modalidade (EaD) precisa ser muito melhor regulamentada e fiscalizada pelo MEC. O curso a distância deve ter um modelo pedagógico por trás que seja muito bem estruturado, o que não está acontecendo em todas as instituições — observa a pesquisadora.
A docente defende que é preciso haver um paradigma epistemológico que embase o curso, que leve em conta o perfil do aluno e tenha estratégias pedagógicas que deem dinamicidade. Ela cita quatro elementos necessários para isso: é preciso pensar no conteúdo, na metodologia, na organização e na plataforma a ser utilizada.
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