Corrupção na Educação da Capital

Corrupção na Educação da Capital

Operação Capa Dura aponta indícios de corrupção na Educação da Capital e avança sobre mais compras suspeitas

Contratos de R$ 58,2 milhões

Segunda fase da investigação tem seis aquisições da Smed como alvo. Indícios apontam que a ex-secretária Sônia da Rosa teria recebido vantagem pessoal depois de aprovar compras. Além dela são investigados o ex-secretário-adjunto Mário de Lima e a professora municipal cedida ao Gabinete do Prefeito Lia Wilges, além de outros servidores públicos, empresários e representantes comerciais

ADRIANA IRION  -  CARLOS ROLLSING

 

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Ferrari apreendida durante operação é de um dos empresários investigados.

Jefferson Botega / Agencia RBS

 

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Interior da Ferrari, acabamento em couro e vários dispositivos.

Jefferson Botega / Agencia RBS

 

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Além da Ferrari, outro carro foi levado para a sede do Deic.

Jefferson Botega / Agencia RBS

 

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Carros foram apreendidos durante segunda fase da operação Capa Dura.

Jefferson Botega / Agencia RBS

 

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Detalhes cromados chamam a atenção no carro apreendido.

Jefferson Botega / Agencia RBS

 

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Policiais verificam documentos Na sede de uma empresa investigada na zona sul da Capital.

Polícia Civil / Divulgação

 

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Policiais chegam para cumprimento de mandado na sede de uma empresa investigada
na zona sul da Capital.

Polícia Civil / Divulgação

 

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Foram cumpridos 36 mandados de busca e apreensão na segunda fase da Operação
Capa Dura. Na foto, policiais chegam a um prédio na zona sul da Capital.
Polícia Civil / Divulgação

 

A Polícia Civil pôs na rua nesta sexta-feira (5) a segunda fase da Operação Capa Dura, que avança para a apuração de supostos atos de corrupção na Secretaria Municipal da Educação (Smed) de Porto Alegre.

Entre os alvos dos mandados de busca, estão a ex-titular da Smed Sônia da Rosa, o ex-secretário-adjunto Mário de Lima e a professora municipal cedida ao Gabinete do Prefeito Lia Wilges, além de outros servidores públicos, empresários e representantes comerciais.

Sônia é suspeita de ter quitado parte do valor de um apartamento com dinheiro dado por empresários. Estão sendo cumpridos 36 mandados de busca e apreensão em 12 cidades do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. A prefeitura de Porto Alegre é alvo de buscas.

São investigados possíveis crimes licitatórios, lavagem de dinheiro e associação criminosa. Os delitos estariam relacionados a compras da Smed realizadas em 2022 junto a seis empresas, somando contratos de R$ 58,2 milhões.

As evidências colhidas em janeiro pela Polícia Civil, quando ocorreu a primeira fase da Operação Capa Dura, ampliaram as investigações contra Sônia. Nesta segunda etapa, a verificação avança sobre a possibilidade de a ex-titular da Smed ter recebido vantagens pessoais intermediadas pelo representante de empresas que fizeram negócio com a Smed. O valor de propina supostamente direcionado a ela teria sido usado como parte do pagamento de um apartamento. 

Os inquéritos se desdobraram sobre aquisições junto a empresas que tinham ficado de fora da primeira fase: kits de robótica, da Conceitto; brinquedos e jogos pedagógicos, da Edulab; conjuntos de livros didáticos e jogos, da Mindlab; e realização de um programa de educação ambiental nas escolas, da Ambiética.

Nesta segunda fase da operação, a Justiça determinou a suspensão do exercício de função pública de quatro servidores e a proibição de contratar com o poder público municipal e estadual para cinco pessoas físicas e sete jurídicas. Há ordens de sequestro de quatro veículos de alto valor.

Ao comentar nova fase da operação, Melo reitera posição

Em entrevista coletiva na manhã desta sexta-feira para falar sobre o trabalho de limpeza da cidade, o prefeito Sebastião Melo foi questionado sobre a operação. E disse:

 — Se alguém cometeu algum erro, que pague pelo erro, rigorosamente, sob as penas da lei. Eu não compactuo com corrupção, a minha vida é uma vida limpa, correta. Tenho mais de 20 anos de vida pública. Esse é um processo que está transcorrendo e que vai ter o final do inquérito, vai para o Ministério Público, vai para o Judiciário. Então minha posição continua a mesma, de ter investigado, mandado e se tem corrupção que seja punido rigorosamente na forma da lei. A secretária Sônia pediu para sair do governo e a minha posição é mesma, que continue sendo investigado e se tiver em relação a ela ou qualquer outro cidadão, que pague pelos seus erros. Essa é minha posição ontem, hoje e amanhã  — declarou.

Desperdício de material escolar em depósitos precários, suposto direcionamento de compras para grupos econômicos e inobservância das regras do setor público para despesas da Smed foram objeto de dezenas de reportagens do Grupo de Investigação da RBS (GDI) a partir de junho de 2023. Após as publicações, a Polícia Civil abriu inquéritos e duas CPIs foram instaladas na Câmara de Vereadores. A primeira fase da Operação Capa Dura prendeu temporariamente um empresário e três servidoras da Smed, incluindo a ex-secretária Sônia. Naquela etapa, a investigação estava focada na aquisição de livros junto às empresas Inca e Sudu. Agora, houve o avanço em relação a outras fornecedoras.

Todas as contratações foram feitas por modelos que dispensaram a ampla concorrência. O método mais usado foi a adesão à ata de registro de preço, conhecida como carona por permitir que um órgão como a Smed aproveite licitações já feitas por outros entes públicos do Brasil, com um fornecedor selecionado. Depois, empresas do mesmo grupo econômico forneciam orçamentos para demonstrar que era "vantajoso" para a Smed aderir aos preços da ata.

O outro mecanismo das compras sob investigação foi a inexigibilidade, autorizada quando somente uma empresa detém determinada solução ou produto para entregar.  

A segunda fase da Operação Capa Dura é liderada pelas 1ª e 2ª Delegacia de Combate à Corrupção, do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic). Estão à frente dos inquéritos os delegados Max Otto Ritter (1ª) e Augusto Zenon (2ª). As medidas foram autorizadas pelo juiz João Garcez de Moraes Neto, da 1ª Vara Estadual de Processo de Julgamento dos Crimes de Organização Criminosa e Lavagem de Dinheiro.

A operação de hoje dá seguimento na investigação de uma série de fraudes licitatórias e crimes correlatos, que lesaram os cofres públicos do município de Porto Alegre, em milhões de reais"
DIRETORA DO DEIC, DELEGADA VANESSA PITREZ

— A Divisão de Combate à Corrupção do Deic tem atuado de forma efetiva, técnica e imparcial na repressão a todo o tipo de ilícito que envolva bens ou serviços públicos. A operação de hoje dá seguimento na investigação de uma série de fraudes licitatórias e crimes correlatos, que lesaram os cofres públicos do município de Porto Alegre, em milhões de reais, fazendo com que as verbas destinadas à educação deixassem de ser investidas de forma séria e eficiente. Seguiremos apurando todo e qualquer crime que indique a malversação do dinheiro público — destacou a diretora do Deic, delegada Vanessa Pitrez.

Contraponto
A reportagem tenta contato com os investigados. O espaço está aberto para a manifestação.

A prefeitura de Porto Alegre se manifestou em nota do Gabinete de Comunicação Social: "Em relação à operação policial desencadeada na manhã desta sexta-feira, 5, a Prefeitura de Porto Alegre reitera que, por determinação do prefeito Sebastião Melo, apurou os fatos decorrentes de denúncias relacionadas à Secretaria Municipal de Educação ainda em 2023. Todas as informações provenientes da auditoria especial e da Investigação Preliminar Sumária (IPS) foram submetidas à Polícia Civil e a órgãos de controle. A administração municipal adotou medidas de reestruturação na pasta, como força-tarefa para distribuição de equipamentos e materiais pedagógicos e criação de um novo centro logístico, além de atos administrativos no âmbito de contratos e licitações. Cabe reforçar, por fim, que a gestão prima pela transparência e lisura na aplicação dos recursos públicos e tem o absoluto interesse na elucidação dos fatos, mantendo em plena colaboração com as instituições." 

O que diz João Pedro Petek, que defende a ex-secretária Sônia da Rosa:
Só vamos nos manifestar nos autos.

O que diz a Ambiética Assessoria Ambiental:
"A empresa vem a público esclarecer que sempre pautou suas atividades pela legalidade e ética, seguindo rigorosamente todas as diretrizes estabelecidas pelos órgãos competentes. Embora a investigação esteja sob segredo de justiça e não tenhamos tido acesso completo ao teor do processo, reiteramos nossa total disposição em colaborar com as autoridades para que todos os fatos sejam esclarecidos de maneira justa e transparente. Destacamos que todos os estudos, relatórios, atas, oficinas e acompanhamentos foram realizados, finalizados, entregues e aprovados pela respectiva SMED e seu quadro técnico, seguindo os cronogramas e cláusulas fixados no contrato firmado. Reafirmamos nosso compromisso com a verdade e com nossos clientes, parceiros e a sociedade em geral."

O que diz Marcelo Marcante, advogado de Lia Wilges:
"Ela sempre atuou primando pela ética e pela legalidade no exercício da função pública e irá comprovar a sua inocência. Assumiu as funções no gabinete do Prefeito em junho de 2022 pois, além de servidora pública de carreira desde 2009, possuía as capacidades técnicas para coordenar o Plano de Logística Sustentável (PLS), eis que é bióloga, possui mestrado em educação em ciências pela PUCRS e é doutoranda em Sustentabilidade Social e Desenvolvimento pela Universidade Aberta de Portugal."

O que diz Marcelo Marcante, advogado de João Eduardo Reymunde:
"Nunca teve qualquer vínculo contratual ou foi representante da empresa Mindlab do Brasil Comércio de Livros, sendo infundadas as suspeitas. Na época em que se sucedeu o processo de contratação feito pela Prefeitura, estava licenciado de suas funções na Secretaria Municipal da Saúde, pois residia na Espanha, onde cursava Doutorado em Segurança Humana e Direitos Globais na Universidade Autônoma de Barcelona."

Confira detalhes das compras sob investigação

Inca Tecnologia de Produtos e Serviços Eireli e Sudu Inteligência Educacional

  • O que foi comprado: cerca de 500 mil livros de reforço, extracurriculares e literários

  • Valor: R$ 27,9 milhões da Inca e R$ 8,6 milhões da Sudu

  • Método de contratação: Adesão à ata de registro de preço

  • Contexto: as duas empresas teriam relações, representadas em Porto Alegre pelo empresário Jailson Ferreira da Silva. As publicações ficaram por meses sem uso em galpões precários

  • Suspeita: está sob investigação a possibilidade de a ex-titular da Smed Sônia da Rosa ter recebido vantagem pessoal (corrupção) dessas empresas pelas compras

Conceito Comercial de Equipamentos e Suprimentos de Informática

  • O que foi comprado: 942 kits de robótica

  • Valor: R$ 2,3 milhões

  • Método de contratação: inexigibilidade

  • Contexto: kit de robótica da Conceitto teria concorrentes no mercado, sob custo mais baixo. A única proprietária da empresa à época da compra era Verônica Almuas, alvo de mandado de busca. O depoimento dela na CPI chamou atenção pelo desconhecimento sobre o kit

  • Suspeita: apreensões da primeira fase da Operação Capa Dura indicam que a negociação entre a Conceitto e a Smed foi combinada previamente. Uma executiva ligada à Conceitto, Marjorie Nunes, teria amizade com a ex-secretária Sônia. Marjorie é investigada
Edulab Comércio de Produtos e Equipamentos
  • O que foi comprado: materiais, jogos e brinquedos pedagógicos

  • Valor: R$ 4,2 milhões

  • Método de contratação: adesão à ata de registro de preço

  • Contexto: servidoras da Smed encaminhavam a compra de brinquedos de uma empresa que não é investigada, mas o representante da Edulab, Ciríaco Pereira Freire Junior, teria conseguido uma intervenção na prefeitura, por cima da Smed, para que a operação com a concorrente fosse cancelada e direcionada para a Edulab

  • Suspeita: direcionamento e burla à licitação supostamente em favor da Edulab. A investigação aponta que o ex-secretário-adjunto Mário de Lima teria retornado de reuniões externas com a determinação de que o negócio fosse fechado com a Edulab

Mindlab do Brasil Comércio de Livros

  • O que foi comprado: livros e jogos didáticos

  • Valor: R$ 14,4 milhões

  • Método de contratação: inexigibilidade

  • Contexto: compra teria sido direcionada após atuação de um representante da empresa, João Reymunde. Ex-servidora Michele Bartzen e assessora do Gabinete do Prefeito Lia Wilges têm versões conflitantes sobre quem tomou a iniciativa de abrir o processo de compra. Polícia Civil suspeita que Lia, à época na Smed, possa ter participado do suposto direcionamento por conhecer Reymunde. Michele já era investigada

  • Suspeita: direcionamento da compra e subutilização dos materiais adquiridos.  Investigadores querem aprofundar investigação para saber se houve vantagens pessoais
Ambiética Assessoria Ambiental
  • O que foi comprado: programa de educação ambiental para as escolas

  • Valor: R$ 680 mil

  • Método de contratação: inexigibilidade

  • Contexto: processo de contratação começou com orçamento da Ambiética nominal para a servidora Lia Wilges, à época lotada na Smed e, atualmente, no Gabinete do Prefeito. Jackson Müller era sócio-minoritário da empresa. A inexigibilidade foi justificada pelo conhecimento dele na área ambiental. A Polícia Civil aponta que Müller estava proibido de contratar com o poder público em 2022 por conta da Operação Caritas. Ele deixou o quadro societário em junho de 2022, pouco após a assinatura do contrato. Investigadores entendem que a permanência do filho dele como único sócio, sem expertise no tema, derrubou a hipótese de inexigibilidade por notório saber.

  • Suspeita: direcionamento da contratação e execução precária do serviço

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FONTE:

https://gauchazh.clicrbs.com.br/grupo-de-investigacao/noticia/2024/07/operacao-capa-dura-aponta-indicios-de-corrupcao-na-educacao-da-capital-e-avanca-sobre-mais-compras-suspeitas-cly8gy6ea02090120cu5hml90.html?utm_source=newsletter&utm_medium=e-mail&utm_campaign=news-destaques-do-meiodia




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