Criação do Sistema Nacional de Educação

Criação do Sistema Nacional de Educação

‘SUS da educação’: entenda como as redes de ensino serão afetadas por proposta que voltou ao Senado

A proposta de criação do Sistema Nacional de Educação busca organizar responsabilidades entre União, estados e municípios e pode mudar repasse de recursos e avaliação escolar

Escrito por Thatiany Nascimento       thatiany.nascimento@svm.com.br

Ceará

Legenda: SNE pretende garantir mais equilíbrio na qualidade do ensino em todo o país.     Foto: Thiago Gadelha

 

 

Um sistema que atribua regras e diga como municípios, estados e Governo Federal devem atuar isoladamente e em conjunto, de modo que seja possível estabelecer as responsabilidades de cada nível de gestão, assim como já ocorre no Sistema Único de Saúde (SUS). Essa proposta permeia agora outra área estruturante para o país: a educação. Esse mês, o projeto de criação do Sistema Nacional de Educação (SNE), chamado de ‘SUS da Educação’, que tramita desde 2019, voltou ao Senado Federal. Mas, se aprovado, como ele funcionará e no que afetará as redes de ensino?

Um ponto de partida nessa discussão é que hoje mesmo que a Constituição Federal preveja que as gestões (federal, estadual e municipal) devam colaborar na educação, oferecendo apoio técnico e financeiro, as redes educacionais até chegam a fazer ações de forma conjunta, mas essa não é uma regra ou uma prática generalizada no país.

Além disso, na ausência de um “regramento” estabelecido oficialmente, cada rede acaba atuando de modo isolado, ainda que de forma precária. Um exemplo dessa dinâmica foi evidenciado na pandemia de Covid, quando o trabalho de muitas redes de ensino acabou sendo executado de forma separada, o que refletiu em condições de aprendizagem muito distintas dentre um mesmo estado, e por efeito, no país como um todo. 

Esse mês, o Projeto de Lei (PLP 235/2019) para criar o SNE, que é de autoria do Senado, retornou à casa legislativa após ter tramitado por pouco mais de 3 anos na Câmara Federal. A proposta voltou para o Senado porque na Câmara (que a recebeu em março de 2022) ela foi modificada, logo, demandou que fosse reavaliada na casa legislativa de origem. 

O projeto busca fortalecer a colaboração entre União, estados e municípios nas políticas educacionais. Entre as medidas propostas estão:

Criação de um identificador nacional para cada aluno (um “CPF estudantil”);

Criação de uma plataforma unificada de dados sobre escolas e qualidade do ensino;

Formação de comissões tripartites (União, estados e municípios) e bipartites (estados e municípios);

Definição do cálculo do Custo Aluno Qualidade (CAQ), indicador que mede as necessidades das escolas e aponta onde investir mais;

Implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb) e do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Profissional e Tecnológica (Sinaept).

A existência do SNE está prevista na Constituição Federal de 1988, mas até hoje o sistema não foi criado. O atual Plano Nacional de Educação (PNE), em vigor desde 2014, previa que os parlamentares deveriam ter aprovado a implementação do SNE até 2016, o que não ocorreu. 

O Governo Federal é responsável por coordenar o SNE e definir a política nacional de educação. Também deve oferecer apoio técnico e financeiro aos estados, Distrito Federal e municípios, além de regular, avaliar e supervisionar o sistema federal de ensino. Outra função é acompanhar o cumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE) e criar e manter a Comissão Intergestores Tripartite da Educação (Cite).

 

Legenda: Os governos estaduais e municipais ficam responsáveis por criarem os planos de educação.  Foto: Thiago Gadelha

 

Os governos estaduais devem coordenar, regulamentar, avaliar e supervisionar os sistemas de ensino da rede estadual. Também têm a função de criar e manter a Comissão Intergestores Bipartite da Educação (Cibe), apoiar tecnicamente e financeiramente os municípios e desenvolver sistemas próprios de avaliação da educação básica, em articulação com a avaliação nacional. 

Já os municípios são responsáveis por coordenar, regulamentar, avaliar e supervisionar seus sistemas de ensino (ou integrar-se ao sistema estadual, se preferirem). Devem ainda elaborar o plano municipal de educação e organizar a oferta de vagas de acordo com a demanda local.

Na versão do projeto aprovado pelos deputados prevê a criação da Infraestrutura Nacional de Dados da Educação (Inde), que reunirá informações sobre cada estudante em um Identificador Nacional Único, usando o CPF como número de referência. Esse sistema funcionará como um “prontuário eletrônico” com toda a trajetória escolar do aluno.

Também será criada a Comissão Intergestores Tripartite da Educação (Cite), formada por 18 membros: 6 da União, 6 dos estados e 6 dos municípios. Essa comissão será responsável por propor políticas educacionais comuns em todo o país, definir padrões mínimos de qualidade para a educação básica (da creche ao ensino médio) e calcular o Custo Aluno Qualidade (CAQ), que estabelece quanto deve ser investido por estudante para garantir um ensino adequado.

 

Legenda: O projeto que cria o 'SUS da Educação' voltou a tramitar
no Senado.   
Foto: Thiago Gadelha

  


Além disso, os estados deverão criar as Comissões Intergestores Bipartite da Educação (Cibe), com 6 representantes do governo estadual e 6 dos municípios, que terão funções parecidas com a Cite. Esses colegiados são inovações trazidas pelo SNE e têm semelhança com estruturas previstas no SUS.

Outra novidade é o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb), que aplicará avaliações a cada 2 anos. Serão analisados aspectos como: perfil de alunos e professores, acesso e permanência na escola, aprendizagem, valorização docente, gestão escolar, infraestrutura, recursos pedagógicos e participação social. Semelhante ao que é feito atualmente, caberá ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) a elaboração e o cálculo dos indicadores da avaliação. 

Também haverá o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Profissional, coordenado pelo Governo Federal, que a cada 2 anos medirá o rendimento dos estudantes da educação profissional e tecnológica, além de avaliar o perfil dos alunos e das instituições.

Na educação superior, a União continuará avaliando universidades e institutos por meio de exames nacionais: um para a graduação e outro para mestrado, doutorado e pós-doutorado. O Enade, já aplicado pelo Inep, seguirá medindo o desempenho dos estudantes universitários.

Reforço de estruturas já existentes

O projeto de criação do SNE também reforça o estabelecimento de certas estruturas que hoje são previstas apenas em leis temporárias ou decisões dos ministérios. Nesse casos, a proposição inclui na lei federal:

O funcionamento do Fórum Nacional de Educação, que coordena reuniões sobre educação em diversas regiões. 

O Fórum de Valorização dos Profissionais da Educação que, dentre outros, irá acompanhar a atualização do valor do piso salarial nacional dos professores.  Hoje, essa entidade funciona com base em portaria do Ministério da Educação;

A elaboração dos planos estaduais e municipais de educação, que é uma exigência prevista hoje no Plano Nacional de Educação. 

Quais os próximos passos?

A proposta agora voltou a tramitar no Senado e entidades como a Campanha Nacional pelo Direito à Educação - entidade da sociedade civil que atua no campo da educação - pressionam para que a casa legislativa “corrija alguns pontos” do texto que foram modificados na Câmara. 

Dentre eles, um ponto relativo ao ensino superior, com o pedido para que o texto traga expressamente a competência da União em financiar diretamente as instituições federais de ensino de modo a "garantir a segurança orçamentária dessas instituições, fundamentais para o desenvolvimento nacional", diz a entidade. 

Outro ponto é o estabelecimento de um calendário articulado para a elaboração dos planos de educação a cada 10 anos de modo sincronizado entre municípios, cidades e estados. Hoje, eles são feitos em anos diferentes. E também a competência da União em assegurar a oferta educacional para populações do campo, indígenas, quilombolas, dos povos das águas e das florestas, obrigação que constava no texto inicial e foi retirada na Câmara. 

 

 

 

 




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