Cultivadores de assassinatos
Xadrez da confraria dos cultivadores de assassinatos, por Luis Nassif
Por trás do discurso anticomunista e anticorrupção, há muito mais coisas no ar do que aviões da Avianca.
Depois da destruição dos direitos, o país ingressa, agora, na era dos assassinatos endossados pelo Estado, em um sistema absolutamente similar ao que gerou os atentados perpetrados pelos porões da ditadura – de onde saíram os futuros comandantes de milícias.
A entrada definitiva na lei da selva começou com os governadores Joao Dória Jr, de São Paulo, e Witzel, do Rio, estimulando os assassinatos por parte da polícia. Na ponta jurídica, Sérgio Moro propondo a flexibilização das execuções através do chamado excludente de ilicitude, a autorização para matar “no estrito cumprimento do dever legal”.
Finalmente, tomando posse, Witzel anunciou a montagem de um esquema de “snipers” – atiradores de elite – colocados em pontos chave para “atirar na cabecinha” de qualquer pessoa suspeita de estar carregando uma arma.
As redes sociais já divulgaram diversos vídeos de moradores de favelas, mostrando helicópteros sobrevoando as regiões, com atiradores disparando tiros. Agora, reportagens do Extra e outros jornais mostrando cidadãos indefesos sendo assassinados por “snipers”.
Tudo isso acontece em um estado dominado pelas milícias, com a corrupção infiltrada em todos os poros e com o lado mais selvagem organizando-se em milícias digitais e seus discursos de ódio.
Aí, vem a suspeita. Trata-se de um assomo generalizado de selvageria, ou esse ódio disseminado obedece a uma lógica das organizações criminosas? Trata-se de uma suspeita fundada e terrível, das milícias infiltrando-se nos poderes constituídos e valendo-se do poder de Estado para combater organizações criminosas adversários.
Vamos a um conjunto de características envolvendo os principais personagens da violência explícita do Rio de Janeiro e suas relações.
Personagem 1 – o capitão Adriano
Veio do submundo das forças armadas, os integrantes dos porões. É o principal suspeito do assassinato de Marielle Franco. Foi identificado, agora, como o dono do edifício que desabou no condomínio de Muzema, depois de ter sido levantado clandestinamente.
Personagem 2 – Flávio Bolsonaro
O ex-deputado estadual que homenageou os principais matadores das milícias. Empregou mãe e esposa do capitão Adriano. Na Câmara de Vereadores, o irmão Carlos tinha posição ostensivamente agressiva em relação a Marielle. Há um oceano de indícios de ligações com as milícias. Pode ser que não tenha sabido antecipadamente dos planos das milícias para executar Marielle. Pode ser que não.
Personagem 3 – a desembargadora Marília Castro Neves
Ganhou fama depois de atacar a memória de Marielle Franco e propor a execução de Jean Willys. Faz parte de grupos de WhatsApp que juntam juízes e desembargadores do Estado em torno de discursos radicais.
Foi ela quem deu a liminar impedindo o embargo do edifício que caiu. Pode ter sido mera coincidência entre pessoas com afinidades políticas. Pode ser que não.
Personagem 4 – o governador Witzel
Tem relações antigas com Flávio Bolsonaro. Candidatou-se apoiado pela família Bolsonaro e em um partido claramente dominado pelas milícias. Participou de eventos agressivos, como o comício no qual foi rasgada a placa da rua Marielle Franco. E deu o aval para a estratégia de assassinatos.
Assim que terminaram as eleições, marcou viagem a Israel com Flávio Bolsonaro, para negócios obscuros com a industria de armas. Pretendia adquirir drones com capacidade de atirar.
Note-se que há uma disputa pelo controle dos morros entre as milícias e o tráfico. Não se ouve falar em ação sistemática contra as milícias. Pode ser que a ação dos “snipers” seja apenas contra negros favelados. Pode ser que não.
Conclusão
Há afinidades entre os principais personagens dessa trama, de assassinos reais, como o capitão Adriano, a defensores reais de assassinatos, como Witzel, a desembargadora e Flávio Bolsonaro.
Por trás do discurso anticomunista e anticorrupção, há muito mais coisas no ar do que aviões da Avianca.
Em circunstâncias normais, o federalismo brasileiro – a exemplo do seu modelo, o norte-americano – autorizaria intervenção federal em estados sob suspeita de estarem controlados por organizações criminosas.
Mas jamais o governo de Jair Bolsonaro iria se insurgir contra o governo de Wilson Witzel. E Supremo Tribunal Federal e Procuradoria Geral da República não parecem dispor de força e vontade política para defender a população carioca de um sociopata que assumiu o governo do Estado.
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