Cursos técnicos gratuitos
Aposta do governo do RS, cursos técnicos gratuitos apresentam alunos ao mundo do trabalho
Estudantes relatam experiências e descobertas realizadas durante a Educação Profissional
08/02/2023 - ISABELLA SANDER
A rotina dos alunos da Educação Profissional pode ser cansativa – quando cursado em paralelo ao Ensino Médio, envolve aulas em tempo integral, e, quando feito após a formatura, muitas vezes traz consigo a demanda por conciliar trabalho e estudos. Mesmo assim, quem faz, não se arrepende.
Leia também a primeira parte da reportagem: Ponte entre escola e mundo do trabalho, Educação Profissional do RS precisa mais do que duplicar matrículas até 2024
— É uma experiência que todo mundo deveria tentar, não só junto com o Ensino Médio, mas também depois, porque conhecimento nunca é demais. A gente sempre pode aproveitar as oportunidades para adquirir mais conhecimento e habilidades — defende Laura Garcia, 16 anos, estudante de Técnico em Móveis.
A adolescente é uma entre os mais de 850 alunos da Escola Técnica Monteiro Lobato, em Taquara, no Vale do Paranhana, conhecida como Cimol. Partindo para o seu terceiro ano do curso, que é gratuito e integrado ao Ensino Médio, Laura não se arrepende da escolha, e pretende fazer faculdade de Arquitetura e Urbanismo depois de se formar.
— Quando a gente faz a prova, se pergunta se fez a escolha certa. Será que eu vou me arrepender? Vou gostar do curso? Fiquei bem nervosa, mas foi uma das melhores escolhas que eu fiz. Nós somos mais do que uma turma: somos uma família. E a gente vai aprendendo as coisas devargarzinho e aprendendo a amar o processo de mexer com a madeira — relata a estudante.
Já Camila Formighieri, 17 anos, escolheu estudar uma etapa anterior à confecção do móvel: o planejamento do seu desenho, no curso de Design de Móveis, também do Cimol. Igualmente em seu último ano de curso, a jovem já se entristece ao pensar que vai se formar.
— Quando eu fui entrar aqui, conversei com uma familiar minha, que disse: “aproveita muito, porque foram os melhores anos da minha vida”. Eu pensei que era bobagem, porque era uma escola qualquer, mas não. É realmente diferente, não só pelo ensino, mas por tudo o que a gente vive aqui dentro — analisa a adolescente, que disse ter conhecido muita gente diferente, vivendo um intercâmbio constante de experiências.
O curso de Camila envolve muitas visitas técnicas, o que ela adora. Com os colegas e professores, já visitou lugares como Gramado, Bento Gonçalves e Porto Alegre.
— É muito perfeito para os jovens testarem se é isso mesmo que eles querem fazer. Eu pretendo seguir na área da Arquitetura, então provavelmente vou usar o que aprendi. É cansativo, às vezes tu pensa que não vale a pena, mas é um bônus no teu currículo e uma experiência mesmo — comenta.
Eletrônica, Química e Mecânica: as escolhas e as oportunidades encontradas
As aulas no Cimol vão das 7h30min às 17h, com intervalo de almoço. Procurado por muitos moradores de outras cidades da região, como Parobé, Igrejinha, Três Coroas e Gramado, o colégio chama a atenção por sua grande estrutura, que envolve laboratórios específicos de cada um dos oito cursos oferecidos. Além de Técnico em Móveis e Design de Móveis, há também aulas de Eletrônica, Eletrotécnica, Mecânica, Química, Informática e Meio Ambiente.
O envolvimento dos alunos com a escola ficou claro durante a visita da reportagem de GZH ao local. Em pleno período de férias, 10 jovens fizeram questão de ir ao Cimol conversar com os jornalistas. Os perfis dos alunos eram bem diversos – Wendel Gustavo Fillmann e Vinícius Krummenauer, 18 anos, por exemplo, já até se formaram e, hoje, fazem o estágio obrigatório para concluírem o técnico em Informática. Enquanto isso, aguardam para iniciar a graduação, em março, em Sistemas de Informação, na Faccat. O curso ajudou a dupla a escolher o que queria fazer no futuro.
— O bom do Ensino Técnico que tivemos aqui é que várias pessoas puderam ver se era realmente aquilo que elas pretendiam cursar, pra não precisar iniciar uma faculdade pra ver que não é aquilo que tu vai seguir. Aqui tu tem toda uma experiência pra ver se vai querer ou não — comenta Wendel.
Vinícius comenta que ao entrar na escola, que chama a atenção por seu tamanho, o aluno fica até perdido, mas, com o tempo, vai conhecendo as potencialidades da instituição.
— É bem puxado, não tem como negar, mas compensa. O Cimol te prepara para o mercado de trabalho, independentemente da área que tu for cursar, e tu vai sair daqui um profissional formado. É trabalhoso, mas compensa — opina o jovem.
Agora procurando estágio para concluir o curso de Química, Maria Eduarda Mattes, 17 anos, e Leonarda Peters, 18, tiveram poucas noções dessa área antes de optar por ela no Cimol. Mesmo assim, as duas também se encontraram entre os microscópios e tubos de ensaio e querem seguir por esse caminho na graduação.
— Eu acho que as melhores práticas são da área da química orgânica, porque a gente consegue fazer síntese, extrair óleos e fazer uma infinidade de coisas. É a parte mais legal do laboratório — conta Maria Eduarda, empolgada.
A jovem, agora, aguarda completar 18 anos, no final de fevereiro, para procurar um estágio – como a área que se interessa é a de indústrias químicas, muitas empresas exigem maioridade para os estagiários, por segurança. Sua vontade é seguir ou na área industrial, ou no setor farmacêutico.
Leonarda, que já é maior de idade, está aguardando retornos de empresas que procurou. Seus contatos foram principalmente na área alimentícia.
— Durante o curso, a gente faz vários trabalhos e seminários, e a maioria dos meus seminários foi dentro da indústria da cerveja e da questão alimentícia. Essa área realmente me chamou a atenção — relata a jovem, que quer fazer faculdade de Engenharia Química no ano que vem.
Estudante do técnico em Mecânica, Gabriel Mateus Ferreira, 17 anos, vai iniciar o terceiro ano em 2023. Escolheu essa área porque boa parte de sua família trabalha nisso e seus tios estudaram no Cimol. Perguntado sobre se não cansa da rotina intensa de estudos, o adolescente diz que não:
— É exaustivo, mas eu sempre digo que a gente tem que usar a vida, e não deixar a vida usar a gente. Eu aproveito muito essa oportunidade. Se eu só estudasse de manhã, eu trabalharia à tarde em algum mercado ou padaria, mas eu estou aqui, ganhando experiência. Quando sair, vou encontrar uma empresa que vai me dar um bom salário e uma estrutura, então vou ter um norte do que fazer da minha vida — observa Gabriel.
Quando terminar as aulas, o estudante quer atuar na área de modelagem, programando máquinas para seguirem determinados modelos de produtos. Segundo o jovem, as possibilidades de empregos vão desde a indústria calçadista até mecânica industrial e farmacêutica.
Já Carlos Daniel Schillreff, 17 anos, escolheu o curso de Eletrônica porque desde cedo gostava de desmontar e montar equipamentos eletrônicos, como celulares e notebooks. Quando ia ingressar no Ensino Médio, resolveu juntar o útil ao agradável.
— Estou fazendo Eletrônica e, quando terminar, vou fazer Eletrotécnica, para ter as duas capacitações. É muito bom. Os professores incentivam muito a gente — diz o estudante, que inicia neste mês o terceiro ano de curso e de Ensino Médio.
Mas nem todo mundo tem certeza sobre se irá seguir na área em que fez o técnico. É o caso de Isadora Keller, 18 anos, que concluiu em 2022 as aulas de Meio Ambiente e, agora, faz estágio na prefeitura de Três Coroas nessa área.
— Escolhi por ser uma área mais de Ciências Humanas, e agora estou descobrindo mais sobre como é na prática. Na prefeitura, a gente faz tudo o que está envolvido com a legislação ambiental — relata a jovem, que está em dúvida sobre cursar Ciências Biológicas ou Psicologia.
Diretora do Cimol, Karine Kersting afirma que a procura pelos cursos técnicos do colégio é grande, e que eles são uma grande oportunidade para o aluno conhecer o mundo do trabalho e escolher o caminho que deseja seguir.
— Os jovens que saem do Ensino Médio, muitas vezes, não vão nem trabalhar e nem estudar. Já os que saem das escolas técnicas, é exatamente o oposto. Eles saem daqui, fazem o estágio e muitos já ficam nas próprias empresas em que estagiaram. É a solução para aquilo que a gente ouve sobre empresas que têm vagas, mas não têm pessoas habilitadas para aquelas vagas — comenta Karine.
Irmão Pedro