Direitos humanos são de esquerda

Direitos humanos são de esquerda

Direitos humanos são coisa de esquerda?

Isabella Sander, colaborou Juliano Tatsch

Tida, por muitos, como "coisa de esquerdista", a defesa dos direitos humanos está acima de qualquer partido ou ideologia política. A história do mundo, por sinal, apresenta uma porção de regimes totalitários, marcados pela tirania e o desrespeito à dignidade humana, tanto à direita quanto à esquerda no espectro político. À direita, os casos mais emblemáticos são o nazismo alemão e o fascismo italiano, e, na América Latina, as ditaduras militares vividas em países como o Brasil, a Argentina e o Chile. À esquerda, o regime autoritário mais conhecido é o comunismo praticado pela antiga União Soviética e, atualmente, por Cuba, China, Coreia do Norte e, mais recentemente, o regime bolivarianista venezuelano.

Ativistas e estudiosos do tema afirmam que, no Brasil, costuma-se relacionar direitos humanos com a esquerda em função de o totalitarismo conhecido pela população ter sido praticado pela direita, deixando aos opositores esquerdistas a função de criticar e combater violações como a tortura e a censura à imprensa. Em outros países, a história se inverte: a direita é vista como defensora dos direitos humanos e a esquerda, como violadora deles.

"Essa é uma realidade muito brasileira e latino-americana, porque se vivem muitas ditaduras de direita, mas, se pensarmos na Rússia, na China, em Cuba, na Coreia do Norte, em Moçambique ou no Vietnã, o processo foi inverso", pontua Marcos Rolim, doutor em Sociologia e consultor na área de direitos humanos.

De acordo com o presidente do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Organização das Nações Unidas (ONU), Renato Zerbini Ribeiro Leão, a associação dos direitos humanos com a esquerda no Brasil gera o discurso de que estes são fruto de uma ideologia, e que uma ideologia pode ser destruída conforme o governo vigente. "O conceito de direitos humanos não descansa tranquilamente. Justamente porque os direitos humanos são de todos para todos, nenhuma ideologia tem seu monopólio", observa. Essa visão maniqueísta da questão resulta em riscos de governos não identificados com a esquerda retirarem assinatura de tratados internacionais da área por acharem que a pauta está ligada ao opositor político.

A violação grave de direitos humanos não escolhe território, posição política ou grau de desenvolvimento. Tampouco é privilégio de uma ou outra cultura ou religião. Nem o desenvolvimento econômico garante a uma nação o total respeito aos DH. "Há países com violação mais generalizada, devido a crises políticas e humanitárias, como Congo, Síria e Venezuela, mas não significa que países mais desenvolvidos não violem, como os Estados Unidos, que têm superencarceramento da população pobre e negra, crimes de ódio contra minorias e violações contra migrantes e refugiados", cita a diretora do escritório no Brasil da Human Rights Watch, Maria Laura Canineu.

Leão afirma que, em países desenvolvidos, o comitê que preside percebe um trabalho mais focado na cooperação humanitária voltada a países em desenvolvimento, ao passo que, nos menos desenvolvidos, há uma necessidade maior da presença de defensores de direitos humanos para proteger as camadas mais necessitadas, como pessoas em situação de rua e população carcerária. "A diferença é que, nos países desenvolvidos, se trabalha não só para defender e desfrutar dos direitos humanos, mas para promover esses direitos mundo afora", resume.

Atualmente, uma das principais lutas de defensores dos direitos humanos, em nível internacional, é pela garantia de condições dignas para migrantes e refugiados. Para o professor de Direito Internacional da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Valerio Mazzuoli, trata-se de uma crise dos próprios estados que violam esses direitos. "Enquanto os estados descartarem seres humanos como têm descartado, haverá crise de refugiados no mundo e os organismos de direitos humanos terão problemas à frente, pois não têm condições de salvar todas essas pessoas da tirania de determinados estados", ressalta. Segundo o docente, esse é um problema mais político do que jurídico que o mundo precisa resolver.

 

Leia mais do caderno especial do Jornal da Lei:

 

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