Do assédio ao óbito

Do assédio ao óbito

 

 


Do assédio ao óbito: o padecimento dos professores é político

Lígia Bacarin


Esse artigo objetiva levantar alguns apontamentos preliminares sobre a precarização estrutural, a violência institucional e o esfacelamento da educação pública como projeto de morte social no Brasil. Expõe como o adoecimento e a morte de professores são resultados diretos de um projeto político que mercantiliza a educação e esmaga a dignidade docente.

Introdução: Um Crime que Começa na Sala de Reuniões

Quando a professora Elisabete Tenreiro, 71, foi esfaqueada por um aluno de 13 anos em São Paulo, em 2023, a mídia tratou o caso como “tragédia isolada”. Mas o sangue na sala de aula escorre de feridas abertas por décadas de políticas que transformaram escolas em territórios de guerra. Enquanto o Brasil lidera rankings globais de violência contra educadores — com 54% dos professores relatando agressões verbais, físicas ou psicológicas —, o assassinato de docentes é a ponta de um iceberg de assédio moral, gestão autoritária e desmonte planejado do ensino público .

I. Estatísticas do Massacre Silencioso: Dados que Condenam

O Brasil ocupa o topo do ranking da OCDE em agressões a professores: 12,5% sofrem intimidação semanal, contra 3,4% da média global. Nas redes estaduais, 48% reportam agressão verbal, 20% assédio moral e 5% violência física .

Entre 2013 e 2023, os casos de violência interpessoal nas escolas dispararam 354% (de 3,7 mil para 13,1 mil). O bullying atingiu 40,5% dos alunos em 2019 — ante 30,9% em 2009 —, alimentando ciclos de agressividade .

Pesquisas registram 47 óbitos em ambiente escolar desde 2001, com picos após 2018. Para Betina Barros, pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a pandemia acelerou a crise: isolamento, exposição a discursos de ódio online e polarização criaram “combustível para ideias extremistas” .

Tabela 1: Mapa da Violência Docente no Brasil

INDICADOR DADOS FONTES

Professores agredidos verbalmente
48%  Apeoesp (2019)
 
Vítimas de assédio moral
20%  Apeoesp (2019)
 
Casos de violência escolar (2023)
13,1 mil ObservaDH

Mortes em escolas (2001-2023)
47 FAPESP/MDHC
 

II. Gestão Autoritária e Assédio Moral: A Fábrica do Adoecimento

A pesquisa da Universidade de Brasília (UNB) escancara a engrenagem perversa: 75% dos professores no Brasil, sofrem assédio moral, sendo 49% das agressões praticadas por direções escolares. São “críticas sistemáticas”, “bloqueio de comunicação” e “desprestígio laboral” — táticas para “destruir redes de comunicação e reputação”,segundo o pesquisador Antônio Portelada . E tais práticas não são acidentes: servem ao controle da força de trabalho pela humilhação.

Quando sindicatos apontam que 83% das vítimas desenvolvem ansiedade e insônias, e 25% recorrem a atestados médicos, revela-se a função do assédio: disciplinar corpos mediante o medo.

Portanto, cria-se a função de direções escolares como braço autoritário do Estado e a gestão democrática vira gestão do terror. Isso porque a terceirização e militarização converteram direções escolares em agentes de um Estado punitivista, substituindo colegiados democráticos por estruturas hierárquicas que reproduzem violência institucional. Eis como operam: 

Dados do Golpe à Democracia 

– Paraná: 72% das escolas terceirizadas extinguiram conselhos participativos (APP-Sindicato, 2024), enquanto 90% das militarizadas vetam assembleias docentes. E as escolas cívico-militares não operam através de gestão democráticas, tendo o autoritarismo das equipes diretivas como princípio de ação.

– Nacional: 68% dos diretores de escolas “parceiras” admitem receber bonificação por reduzir afastamentos médicos (CNTE, 2025). 

– SP: 40% dos diretores sofrem pressão de secretarias para punir professores que contestam plataformas digitais (Apeoesp, 2025).

“Escolhemos diretores que aceitam ser carrascos. Quem questiona metas é ‘inadaptado’” — Ex-secretário de Educação do PR (anonimato). 

2. Casos que Escancaram a Tirania

Caso 1: A Demissão por Facebook (Foz do Iguaçu/PR)

A professora Marília Rocha foi demitida em 2024 por postar: “Quizizz é digitalização da exploração”. A direção da escola terceirizada União Pela Educação alegou “quebra de decoro”, usando cláusula contratual que proíbe “críticas públicas ao método”. Seu processo judicial expôs o contrato: “Art. 5º: Docentes não podem emitir opiniões que descredibilizem a marca”. 

Caso 2: O Veto ao Debate Racial (Goiânia/GO)

No Colégio Militar Tiradentes, a diretora Capitã Silva proibiu a palestra “Racismo Estrutural nas Escolas”, alegando “doutrinação”. Estudantes denunciaram: “Chamaram polícia para expulsar quem questionasse” . A justificativa oficial? “Temas divisivos perturbam a disciplina” . 

3. A Lógica do Estado Penal na Educação

Como analisa Loïc Wacquant, escolas militarizadas/terceirizadas são “prisões brandas”: 

– Controle espacial: Câmeras monitoram sala dos professores e salas de aulas (PR: 100% das escolas “parceiras”); 

– Punição exemplar: Demissões por “insubordinação pedagógica” (ex: recusar aulas padronizadas); 

– Silenciamento: Reuniões pedagógicas viram sessões de adestramento para metas.

4. O Elo com o Assédio-Adoecimento-Morte

A pesquisa da UFPR comprova: escolas com direções autoritárias têm 3x mais casos de burnout. E os principais motivos são:  Presentismo forçado: 58% obrigam docentes com atestado a “compensar horas”; Cerimônias de humilhação: Reuniões onde professores “culpados” de absenteísmo são expostos; e perseguição a sindicalizados: 70% das demissões em redes terceirizadas atingem líderes grevistas.

Infere-se que o objetivo do assédio é o desmonte da resistência coletiva e sindical.   E esse argumento se sustenta ao analisarmos, por exemplo, que a morte de Silvaneide (PR) começou quando o Núcleo de Educação transformou metas em verdugos. Romper essa engrenagem exige: 

1. Fim da indicação política de diretores — eleições diretas com paridade docente-discente; 

2. Lei federal de proteção a denunciantes — impedir demissões por críticas pedagógicas; 

3. Desmilitarização imediata — extinção do Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares.

Como gritaram nas ocupações de 2016:  “Escola sem democracia é cela de condenação em massa! 

5. Burnout e a Normalização do Inumano: Quando Adoecer Virou “Falta de Resiliência”

Vivemos em uma epidemia silenciada com o agravante da perversão institucional, pois a Síndrome de Burnout — reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como fenômeno ocupacional em 2019 — transformou-se na pandemia invisível da categoria docente. Dados da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANMT) revelam: 30% dos professores brasileiros sofrem de esgotamento profissional, o dobro da média nacional de trabalhadores (15%) e superior à média global. No Paraná, estudos apontam que 47% dos docentes apresentam exaustão emocional crítica, com 11,6% em risco de colapso psíquico. A tragédia, porém, não está nos números, mas na naturalização patológica que converte sofrimento em “falha individual”. 

Por isso é importante expor a engrenagem do assédio institucional. Quando professores adoecem, as redes de ensino frequentemente respondem com: 

– Criminalização das licenças médicas: Em São Paulo, 83% das suspensões disciplinares em 2023 decorreram de “absenteísmo” por atestados, sob acusação de “abandono de função”. 

– Cerimônias da humilhação: Diretores obrigam docentes com Burnout a assinar “termos de compromisso” onde se declaram “incapazes”, sob ameaça de demissão — prática denunciada em 40% das escolas paulistas. 

– Heroificação da automutilação: Campanhas como “Deixem os professores doentes trabalharem” (título de reportagem do jornal Público, maio/2025) glorificam aqueles que lecionam com crises de pânico ou depressão, convertendo a autodestruição em “exemplo de dedicação” . 

O caso da USP sintetiza essa lógica perversa: professores que buscam afastamento por saúde foram alvo de Processos Administrativos Disciplinares (PADs) por “negligência”. Cristiane Araújo, docente da Faculdade de Medicina Veterinária, foi suspensa por 3 meses após denunciar assédio moral: “Quem contraria é punido. Eles evitam que eu cresça profissionalmente, me tornando uma pesquisadora sem prestígio”. A Comissão de Ética da universidade reconheceu o assédio, mas atribuiu “falhas de documentação” à vítima — tática clássica de inversão da culpa. 

Tabela 2 – Dados que Expõem a Cultura da Morte

Indicador Dado Fonte 

Professores com Burnout   
30% ANMT/ISMA

Docentes que ocultam adoecimento      
68% Unifesp (2024)

Escolas que negam violência psicológica   
40% ObservaDH (2025)

Demissões por “absenteísmo” com atestado

83% (SP, 2023)

Apeoesp 

 

A pesquisa de Carlotto (UFRGS) desnuda o paradoxo mortal: 28,9% dos professores mantêm alta realização profissional mesmo com exaustão extrema. Esse dado revela como o idealismo pedagógico é convertido em armadilha: o amor pela profissão torna os docentes reféns de sistemas que exploram seu sacrifício. Nas “escolas parceiras” do Paraná, por exemplo, planos de bonificação premiam docentes que renunciam a licenças médicas, enquanto multam os que “ultrapassam 3 dias/ano de afastamento”.

Há uma patologização da luta de classes, visto que a estigmatização do professor doente é estratégia de controle biopolítico: 

1. Medicalização da resistência: Sindicatos denunciam que diagnósticos como “depressão” ou “ansiedade” são usados para despolitizar queixas trabalhistas. Em Rondônia, 70% das demissões por “incapacidade” referem-se a docentes que organizaram greves. 

2. Produtivismo como norma: A cobrança por “metas de aprendizagem” em escolas sem infraestrutura cria a ditadura do desempenho (Han, 2015). Professores são forçados a automedicar-se para cumprir jornadas — no Rio Grande do Sul, 51% usam ansiolíticos diariamente. 

3. Morte simbólica: Quando um docente é afastado, direções apagam sua existência — eliminam nome de muralistas, deletam e-mails, suspendem aulas. Como descreve Paulo Rodrigues (USP), “tornamo-nos inúteis. E os inúteis são apagados”. 

“A pior forma de violência não é a que destrói corpos, mas a que destrói a possibilidade de luta. O Burnout é o estágio final dessa violência: quando o professor acredita que sua dor é culpa sua.” — Izabel Borsoi (UFES). A normalização do Burnout não é acidente: é projeto político que desarma a resistência docente. Enquanto gestões autoritárias tratam saúde como “custo”, a luta anticapitalista exige: 

1. Fim dos PADs por adoecimento — reconhecimento do Burnout como doença ocupacional com indenização integral; 

2. Comitês de saúde autogeridos— com poder para fiscalizar assédio e interditar escolas insalubres; 

3. Campanhas de desobediência pedagógica— recusa coletiva a metas abusivas e modismos tecnológicos sem suporte . 

Como lembra Wendy Segantim, “a internet não substitui o trabalho de um professor”. Recuperar a humanidade da docência exige mais que políticas paliativas — exige a revolução do cuidado como ato político. Afinal, um professor que tem direito à doença é um professor que pode voltar a lutar.

6. O Paraná em Chamas: Burnout como Projeto de Governo

O Paraná transformou-se no epicentro nacional da epidemia de burnout docente, com números que escancaram a política de extermínio psicológico. E os dados que expõem a engrenagem de exaustão planejada.: 

– 65% dos professores da rede estadial reportam sintomas de burnout, incluindo exaustão emocional (37%) e despersonalização (22%) — quase o dobro da média nacional de 30%. 

– Em 2024, a Secretaria de Estado da Administração registrou 8.888 afastamentos por saúde mental apenas no primeiro semestre — equivalente a 24 professores por dia. 

– Estudos da UFPR apontam que 47% dos docentes apresentam exaustão emocional crítica, com 11,6% em risco iminente de colapso psíquico.

Observa-se uma perfídia institucional, visto que os doentes são punidos, e as mortes heroificadas. Nesse sentido, a rede estadual paranaense opera um sistema duplo de coerção:

1. Criminalização por Adoecimento: Professores que buscam licença médica são submetidos a “termos de compromisso” onde declaram “incapacidade laboral”, sob ameaça de demissão — prática denunciada em 40% das escolas. 

2. Morte como Espetáculo: Após o óbito de duas professoras em sala de aula em Curitiba (maio-junho/2024), o governo estadual emitiu nota enaltecendo sua “dedicação até o último instante”, omitindo que ambas sofriam cobranças por metas do programa Desafio Paraná.

“Meu pai, aposentado por depressão, vê colegas seguindo o mesmo caminho” — relato anônimo sob postagem viral de professor paranaense.

7. Tecnologia como Cárcere Digital: O Caso Quizizz

O programa Desafio Paraná (baseado na plataforma Quizizz) sintetiza a lógica produtivista: 

– Professores são forçados a gerar “pontuação por engajamento” via respostas de alunos a questões padronizadas. Escalas cromáticas (verde, amarelo, vermelho) classificam desempenho, vinculando gratificações a índices artificiais. 

– Quando o professor de inglês Ednilson Cordeiro contestou a uniformização do conteúdo (“mesmo exercício para todos os anos”), sofreu ameaças de demissão e difamação: “Recomendaram que eu saísse do colégio. Tentaram contatar minha escola particular para me difamar”.

Tabela 3: O Circuito da Morte no Paraná 

Mecanismo Impacto Fonte

Afastamentos por saúde mental (2024) |
8..888 docentes  SEAP-PR

Professores com burnout   
65% UFPR 

 Plataformas digitais impostas

R$ 9,6 milhões investidos em 2024
Tribuna PR 

Salas superlotadas   

40 alunos/turma (média)
APP-Sindicato 

 

Os dados do Paraná não são acidentais: são projeto político-metodológico. Enquanto o governo injeta R$ 9,6 milhões em plataformas gamificadas, corta 2 mil cargos de apoio (merendeiras, bibliotecários) e ignora que 80% das escolas não têm climatização. Nesta lógica, o burnout docente é a materialização da mais-valia absoluta: extrai-se até a última gota de energia vital, descartando corpos quando esgotados. Como gritou Sebastião Santarosa, professor que viralizou nas redes:  “Não somos mártires. Somos trabalhadores esfaqueados por políticas que transformam educação em linha de produção!”

8. Duas Mortes que escancaram o Projeto Destruidor

Em menos de uma semana de junho de 2025, o Paraná sepultou duas professoras em salas de aula: 

– Silvaneide Monteiro Andrade, 56 anos, morreu de infarto fulminante no Colégio Cívico-Militar Jayme Canet (Curitiba) após ser cobrada por “baixo engajamento” em plataformas digitais. Testemunhas relatam que a coordenação a pressionava por metas minutos antes do colapso. 

– Rosane Maria Bobato, 29 anos de rede estadual, faleceu no Colégio Santa Gemma Galgani (também em Curitiba), unidade terceirizada. Passou mal na coordenação, sem receber socorro imediato. Seu corpo jazia no chão quando colegas chegaram. 

Ambas as escolas eram símbolos do modelo paranaense: militarização e terceirização. O governo estadual emitiu notas de “pesar”, mas omitiu que Rosane trabalhava há meses sem ar-condicionado, em salas com 40 alunos, e que Silvaneide acumulava atestados por burnout ignorados. 

Mas é importante reforçar que o Paraná não é exceção. Desde 2021, óbitos docentes em escolas explodiram: 

– SP: Professora Elisabeth Tenreiro, 71, esfaqueada por aluno em 2023 na EE Thomazia Montoro. Sobreviventes relatam sangue no chão por semanas como “lembrança institucional”. 

– Dados nacionais: Contratos encerrados por morte na educação subiram 128% (jan-abr/2021 vs. 2020). São Paulo lidera: 531 mortes em 4 meses. A Covid-19 acelerou a tragédia, mas a raiz é a pressão por produtividade em condições desumanas. 

Nesse sentido, Silvaneide e Rosane não ‘passaram mal’. Foram mortas por um sistema que cospe docentes como caroços de laranja após extrair todo o suco. Seus casos comprovam: a violência física é o ápice de anos de assédio moral, terceirização e militarização. Enquanto governos enaltecem “resiliência”, professores tombam como soldados em uma guerra não declarada — a guerra contra a educação pública. E os dados do Paraná reforçam a urgência do fim da plataformização e da desmilitarização das escolas. Visto que as estatísticas demonstram que existe um   vínculo entre a violência extrema que os professores estão submetidos e a precarização estrutural da educação.

A luta dos professores paranaenses é um alerta: queimar não é morrer — é combustão para revolução.

III. Terceirização e “Escolas Parceiras”: A Periferia do Preconceito

O modelo de “escolas parceiras” — terceirizadas que operam com professores temporários e planos de aula engessados — aprofunda a violência epistêmica. Nelas, a rotatividade docente chega a 80% em 2 anos, inviabilizando vínculos pedagógicos. O resultado? Estudantes de periferias, majoritariamente negros, possuem um ensino descontextualizado, enquanto professores são punidos por “não atingir metas”. Como afirma Angela Soligo (Unicamp), a não aplicação das leis 10.639/2003 (história africana) e 11.645/2008 (culturas indígenas) nessas escolas reforça o racismo institucional — terreno fértil para conflitos.

1. Tecnologia sem Pedagogia: O Fetiche da Inovação como Armadilha

Existe uma imposição de plataformas digitais sem formação docente ou infraestrutura adequada. Essa é a face “modernizante” da opressão: escolas públicas sem internet estável, onde professores são forçados a usar apps de gestão de aulas que monitoram cada minuto de trabalho — ferramentas que João Bacchetto (Inep) denuncia como “chicotes digitais”. A falácia da “tecnologia como salvação” encobre a real função: intensificar a produtividade via vigilância, enquanto simulam “avanço”. O desgaste é tão brutal que 47% dos docentes apresentam exaustão emocional, com 11,6% em estágio crítico.

IV. O Caso do Paraná: Laboratório do Neoliberalismo Educacional

A situação do Paraná sintetiza a fusão entre neoliberalismo e autoritarismo. Sob o governo de Ratinho Junior (PSD) e o secretário Renato Feder (ex-empresário do Grupo Positivo), o estado implementou o programa “Parceiro da Escola” (Lei 345/2024), que privatizou 200 escolas públicas em apenas três dias, afetando 100 mil estudantes e extinguindo 2 mil cargos de funcionários (merendeiras, bibliotecários) . O modelo opera com três eixos perversos: 

1. Financeiro: Transferência de R$ 1,4 bilhão/ano dos cofres públicos para empresas, com repasse de R$ 800/aluno* (contra R$ 7/aluno na rede pública). 

2. Pedagógico: Substituição de professores por “Smart TVs” da Unicesumar (empresa de Feder), com licitações suspeitas de R$ 35 milhões. 

3. Autoritário: Fim das eleições para diretores, repressão policial a greves (como a prisão da presidenta do sindicato docente) e militarização de escolas que foram epicentros de ocupações estudantis em 2016. 

Por óbvio, a degradação das condições docentes não é fruto de “crise” ou “onda conservadora isolada”, mas de uma engrenagem intencional: 

a) Neoliberalismo como Projeto Sistêmico

– Desmonte do Estado: Segue o Consenso de Washington (anos 1990), convertendo educação em mercadoria. No Paraná, o Estado atua como “organizador de interesses empresariais”, criando nichos para grupos como o Sistema Positivo . 

– Técnicas de Mercado: responsabilização docente (cobrança por “metas”), terceirização (50% da mão de obra no Paraná) e gerencialismo que substitui pedagogia por controle. Como alerta Rosana Campos (UFSM), o neoliberalismo fabrica indivíduos competitivos, não cidadãos críticos. 

b) Aliança com o Conservadorismo 

– Convergência de Interesses: O neoliberalismo precisa de um Estado forte para impor reformas, mas fraco na regulação social. Isso atrai setores conservadores, que usam escolas para difundir valores como hierarquia (via militarização) e controle moral. 

– Exemplo Paraná: A militarização de escolas em regiões de resistência estudantil (pós-2016) e o discurso de “ordem” justificam a repressão a greves, sob o pretexto de combater “doutrinação”. 

c) Capitalismo Canibal: A Fase Predatória

Nancy Fraser define o estágio atual como “capitalismo canibal”: um sistema que devora bens públicos para sustentar lucros. No Paraná, isso se traduz em: 

– Saque aos recursos: Empresas recebem escolas públicas sem investir em infraestrutura, usando vídeos-aula por anos sem remunerar professores. 

– Segregação como Método: Escolas de aldeias indígenas e quilombolas são excluídas do “Parceiro da Escola”, pois não são lucrativas – o que aprofunda desigualdades. 

Conclui-se que a morte de professores no chão da escola é o ápice de um projeto que combina: 

1. Neoliberalismo predatório, que transforma educação em commodity; 

2. Autoritarismo gerencial, que esmaga autonomias; 

3. Conservadorismo moral, que naturaliza violências. 

A resistência, porém, emerge: as greves de 25 mil professores paranaenses em 2024 e a crítica ao “capitalismo canibal” apontam para um caminho: reconquistar a educação como bem comum, não como mercadoria. Como propõem Santos e Neto-Mendes, isso exige “desmercantilizar” a escola: estatizar redes terceirizadas, criar conselhos populares e vincular tecnologia a projetos pedagógicos coletivos – não a metas de lucro. A luta dos professores, afinal, é a luta por um projeto de sociedade que valorize vidas, não dividendos.  O neoliberalismo não é o fim da história, mas um beco sem saída. Sair dele exige lembrar que a educação é um ato de coragem – não de consumo.


REFERÊNCIAS

  1. FONTES JORNALÍSTICAS


2. FONTES INSTITUCIONAIS E GOVERNAMENTAIS

3. FONTES ACADÊMICAS E TEÓRICAS

Lei 345/2024 do Paraná (“Parceiro da Escola”), consulte o Diário Oficial do Estado.


Ligia Maria Bueno Pereira Bacarin

Professora de História na rede pública de ensino. Com mestrado em Fundamentos da educação e pós graduação em Educação Especial. Militante do Psol-PR e colaboradora nas mídias sociais da Geração 68.

 

FONTE:

https://68naluta.blog/2025/06/25/artigo-assedio-padecimento-professores-parana/ 

 

 

 




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