Escolas submersas
ESCOLAS SUBMERSAS: O FUTURO DA EDUCAÇÃO NO OLHO DO CLIMA
Por João Guató
No Brasil, aprender a ler o mundo já não cabe apenas nos livros. É preciso decifrar o céu carregado, os rios que transbordam e as paredes rachadas das escolas que se tornam abrigos. As mudanças climáticas, que muitos ainda tratam como abstração científica, já batem à porta do sistema educacional brasileiro — e entram sem pedir licença.
Foi o que lembrou Marina Silva, em São Paulo, diante de uma plateia de educadores e gestores: 1.942 municípios do país estão em situação de vulnerabilidade a eventos extremos. O número parece técnico, mas, traduzido em cotidiano, significa aulas suspensas, alunos desalojados, professores improvisando em ginásios, cadernos boiando em corredores alagados. A educação, esse ato paciente de semear futuro, agora precisa também aprender a sobreviver às catástrofes.
Não é coincidência que o Rio Grande do Sul tenha transformado escolas em refúgios durante as enchentes de 2024. Nem que a Serra Fluminense viva sob a ameaça constante de deslizamentos. Cada tragédia climática é também uma tragédia pedagógica: interrompe calendários, dissolve vínculos e reforça a sensação de que estudar é luxo diante do caos.
Marina advertiu que precisamos de drenagem, rotas de fuga, abrigos. Ou seja: infraestrutura. Mas ela também lembrou que a natureza, quando desequilibrada, é sempre mais poderosa que nossas tentativas de controle. E isso nos coloca diante de uma lição desconfortável: sem sustentabilidade, não há permanência escolar; sem permanência escolar, não há cidadania capaz de enfrentar a crise ambiental.
Enquanto isso, Camilo Santana trouxe outro dado: 62 milhões de brasileiros não concluíram o ensino básico. E, embora a evasão tenha caído pela metade, a principal causa segue sendo a necessidade de ajudar no sustento familiar. Agora, somemos a essa equação o peso dos desastres climáticos: famílias desalojadas, empregos interrompidos, escolas interditadas. Como manter um jovem em sala de aula quando sua casa virou lama?
Se a educação já era um desafio histórico, a crise climática a transforma numa corrida contra o tempo. É preciso inserir sustentabilidade no currículo, mas também na arquitetura escolar, no planejamento urbano e nas políticas de proteção social. Caso contrário, continuaremos a ensinar a tabuada enquanto o teto pinga e o pátio vira enchente.
A COP30, em Belém, promete ser a “COP da implementação”. Mas, para o Brasil, ela pode ser também a COP da escola: ou enfrentamos a emergência climática como questão de aprendizagem e sobrevivência coletiva, ou assistiremos à erosão de nosso sistema educacional.
Afinal, o que adianta formar professores se as salas de aula desabam com a próxima tempestade? O futuro da educação brasileira está, literalmente, embaixo d’água.
FONTE:
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