Gastos do Sistema de Justiça

Gastos do Sistema de Justiça

Sistema de Justiça consome mais que áreas sociais no RS 

Estudo nacional mostra que carreiras jurídicas públicas ampliam gastos e pressionam cofres públicos em âmbito federal e estadual. Sistema gaúcho é o quinto que mais gasta

Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 7 de abril de 2025

 

Sistema de Justiça consome mais que áreas sociais no RS
Foto: MPRS/Divulgação

 

Em meio ao aperto fiscal que afeta diversas áreas essenciais da administração pública, gastos com o sistema judiciário brasileiro (ver quadro) seguem em ritmo crescente no Brasil. No Rio Grande do Sul, essa tendência não foi diferente em 2023: o estado é quinto que mais gastou com suas instituições de justiça (R$ 5,1 bi) e, ao lado da Bahia, também é o quinto que mais gastou com folhas de pagamento do setor (R$ 3,3 bi).

Os dados fazem parte de um levantamento realizado pelo centro de pesquisa Justa, especializado em economia política da Justiça. O trabalho aponta que os estados brasileiros desembolsaram R$ 77 bilhões com o sistema de justiça no ano passado. Desse total, R$ 52,7 bilhões — ou 69% — foram consumidos exclusivamente com folhas de pagamento.

A pesquisa destaca que os repasses não apenas se mantiveram elevados, como ultrapassaram os limites orçamentários previstos em lei: os estados utilizaram créditos adicionais que chegaram a elevar em até 23% os valores inicialmente aprovados nas Leis Orçamentárias Anuais (LOAs).

Irracionalidade orçamentária

Sistema de Justiça consome mais que áreas sociais no RS

Luciana Zaffalon, diretora-executiva do Justa.
Crédito: Carol Godefroid/Divulgação

 De acordo com a diretora-executiva do Justa, Luciana Zaffalon, o sistema de justiça opera sob uma lógica de “irracionalidade orçamentária”, na qual as carreiras jurídicas acumulam reajustes e benefícios mesmo diante de restrições fiscais.

“Independentemente do contexto, essas instituições conseguem garantir aumentos orçamentários constantes. O teto remuneratório, na prática, virou piso para esses profissionais”, afirmou.

Luciana denuncia que só o orçamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), ultrapassa a soma do que o estado investe em transporte, assistência social, tecnologia, meio ambiente e comércio. “Se a gente entra nos dados com mais cuidado, só o que foi gasto com o TJRS é mais do que todo o recurso investido em diversas áreas sociais”, aponta.

O contraste entre as prioridades orçamentárias fica ainda mais evidente ao se comparar o crescimento das despesas. De 2022 para 2023, o orçamento geral do estado subiu 15%. Já os gastos com o sistema de justiça gaúcho cresceram 22%.

Foram puxados pelo TJRS, com aumento de 27%, de acordo com o levantamento do Justa. “É razoável que um sistema de justiça, que já tem um orçamento tão expressivo, siga crescendo mais que o orçamento geral do estado? Me parece que não”, questiona Luciana.

Na última sexta-feira, 4, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu um passo para manutenção dessa irracionalidade. A corte formou maioria para deixar verbas do Judiciário fora do limite fiscal da União (Arcabouço Fiscal). O argumento é que a autonomia prevista na Constituição exige liberdade para gerir recursos e garantir a separação dos Poderes

Recursos x Poder

Segundo a diretora executiva do Justa, a disparidade está ligada à forma como as disputas por orçamento se estruturam no país. “Quando a gente fala de disputa orçamentária, na verdade, estamos falando de poder. E quem tem mais poder, leva mais recursos”, afirma.

As carreiras jurídicas, segundo ela, exercem forte pressão, tanto externa — influenciando os demais poderes — quanto interna, por meio de suas eleições institucionais recorrentes. Luciana fala, em especial das chamadas listas tríplice, elaboradas para a definição de um Procurador ou Defensor Geral e, no caso da magistratura, pelo rito interno que é baseado em regras previstas na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) e no Regimento Interno de cada tribunal.

São processos muitas vezes baseadas em promessas de mais benefícios e aumento orçamentário, lembra Luciana.

 

Sistema de Justiça consome mais que áreas sociais no RS
Arte: EC

 

Cheque em branco

A diretora do Justa também critica o uso de créditos adicionais — recursos remanejados sem aprovação do Legislativo — como estratégia para ampliar os orçamentos do Judiciário e do Ministério Público.

“Se isso já é um problema dentro do Executivo, é ainda mais grave quando falamos de órgãos que têm a responsabilidade de fiscalizar o Executivo. Os valores são sempre muito expressivos”, diz.

No RS, por exemplo, registra ela, os adicionais destinados às carreiras jurídicas superaram todo o orçamento conjunto de urbanismo, saneamento, indústria, desporto e lazer.

Apesar do orçamento elevado, o desempenho do sistema de justiça segue sendo questionado.

Recentemente, um estudo do Tesouro Nacional ranqueou o Judiciário brasileiro como o mais caro do mundo. Se há quem aponte que os salários e “penduricalhos” de nossos magistrados contribuem para isso, ao não permitir a ampliação do quadro de servidores, Luciana contrapõe: “temos também uma proporção de servidores por juiz muito maior do que os tribunais de outros países”, destaca.

Para ela, os servidores em menor ou maior grau fazem parte “desse equacionamento de um Judiciário pouco atento, não só à realidade brasileira, mas à realidade global também”.

Falta de transparência

Questionada sobre a disparidade salarial entre juízes, promotores e defensores, diante dos demais servidores, Luciana é cautelosa, mas direta: “Qualquer servidor público parece receber pouco quando comparado à remuneração de juízes e promotores. Mas a comparação mais justa é entre servidores jurídicos e outros servidores concursados de nível superior. Ainda assim, há discrepâncias significativas.”

Ela também aponta a falta de transparência como um obstáculo para análises mais precisas. “Infelizmente, a gente não tem uma transparência das instituições de justiça, ao menos numa qualidade que nos permita aferir esse tipo de detalhe. Por isso, recorremos a bases como o Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi) e o Tesouro Nacional.”

Por fim, a diretora do Justa reforça a importância de repensar o modelo atual. “O que os dados mostram é a urgência de se rediscutir as prioridades do orçamento público. Não é razoável cortar 95% do orçamento de saneamento num estado como o Rio Grande do Sul e, ao mesmo tempo, ampliar benefícios para as carreiras jurídicas”, conclui.

FONTE:

https://www.extraclasse.org.br/economia/2025/04/sistema-de-justica-consome-mais-que-areas-sociais-no-rs/?utm_source=NEWS++7%2F4%2F2025&utm_medium=NEWS++7%2F4%2F2025&utm_campaign=NEWS++7%2F4%2F2025&utm_id=NEWS++7%2F4%2F2025&utm_term=DINHEIRO+P%C3%9ABLICO&utm_content=DINHEIRO+P%C3%9ABLICO 




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