Guerra ou pacificação da eleição

Guerra ou pacificação da eleição

Com estratégia de guerra, Bolsonaro não irá abraçar pacificação da eleição

Leonardo Sakamoto - Colunista do UOL 12/07/2022

 

O presidente da República não conclamou os seus seguidores a "baixarem as armas" após o assassinato do tesoureiro petista por um bolsonarista em Foz do Iguaçu. Na verdade, nem poderia, pois isso bateria de frente com toda a estratégia montada até agora para a sua reeleição, que passou por armar, literalmente, seus fãs. Desde a campanha de 2018, ele alimenta seus fiéis com uma retórica de que estão em uma guerra do bem contra o mal. Mais do que um governo, trata-se de uma cruzada para impor ao Brasil os "valores corretos" - processo pelo qual, segundo Jair Bolsonaro, vale a pena pegar em armas para matar ou morrer.

Adotando esse discurso de que estão em uma missão civilizatória (ou divina), ele manteve uma parcela da população ao seu lado mesmo nos piores momentos da pandemia e da economia. Temos 17% que acreditam em absolutamente tudo o que Bolsonaro diz, segundo o Datafolha, contingente que, mesmo na baixa, nunca variou muito disso.

Esses seguidores fanáticos e engajados são um dos maiores ativos de sua campanha, capazes de produzirem e capilarizarem rapidamente conteúdo digital em prol do presidente, pressionarem seus empregados, familiares e amigos a votarem no "mito", encherem manifestações de rua (como as previstas para o 31 de julho e o 7 de setembro) e, se tudo der errado no voto, contribuírem para uma tentativa de golpe eleitoral.

Aliados políticos no Congresso entendem isso, mas defendem que, neste momento, Bolsonaro, mais do que defender os votos que já tem, precisa atrair indecisos ou tirá-los de outros candidatos. E a imagem de um candidato que, com seus discursos, fomenta a violência física contra oponentes não é atraente. Na verdade, é ruim até para candidatos a deputado que são seus aliados.

O presidente aposta, contudo, que, com a distribuição de dinheiro através da PEC da Compra dos Votos e a redução momentânea da inflação com a queda do ICMS dos combustíveis, a população não vai se preocupar com uma morte. Até porque, se com 670 mil mortes da covid-19, ele continua um dos favoritos na corrida eleitoral, não é um assassinato político que vai tirá-lo do jogo.

O problema é que essa pode ser a primeira morte da campanha, mas não será a última tendo em vista que o ambiente que a gerou segue cada vez mais tóxico.

Logo após o assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda pelo agente penitenciário Jorge Guaranho, a máquina de guerra digital do bolsonarismo foi acionada para tentar evitar um impacto negativo para a sua imagem, evidência de que, Galvão, ele sentiu.

Buscou-se afastar a responsabilidade do presidente pelas ações dos seus seguidores, mesmo quando um deles o obedeceu ao pé da letra. Bolsonaro até tentou um contorcionismo semântico, tentando convencer que falava em sentido figurado. Mas isso não cola porque, dia após dia, ele vem transformando adversários em inimigos e defendendo que os bolsonaristas peguem em armas para defende-lo.

Seis dias antes dos atos de caráter golpista e antidemocráticos de 7 de setembro do ano passado, Jair afirmou, em um evento da Marinha, que "se você quer paz, se prepare para a guerra".

O provérbio, que vem do latim (si vis pacem, para bellum) e é repetido ao longo de séculos, é uma variação de uma declaração atribuída ao escritor romano Flávius Vegetius Renatus, que viveu no final do 4º século de nossa era. Significa isso mesmo que parece.

Bolsonaro não falou em sentido figurado. Há uma guerra vindo. E um dos lados, aquele que ataca a liberdade em nome da liberdade, foi armado até os dentes. Se houver violência, mesmo que artificialmente construída, ele deve usá-la como justificativa para intervir nas eleições.

Toda guerra deixa suas vítimas. Nesta, pode ser a democracia.


https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2022/07/12/com-estrategia-de-guerra-bolsonaro-nao-ira-abracar-pacificacao-da-eleicao.htm?fbclid=IwAR3Usrf3j4XyCM69l9Ad9nNpRPNFfu1SkXjwRBiZlsvMToMYV4-oIdHK0W0 

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Leonardo Sakamoto - Colunista do UOL 13/07/2022

Desde o assassinato do guarda municipal petista Marcelo Arruda pelo agente penitenciário bolsonarista Jorge Guaranho, o presidente Jair Bolsonaro e o vice-Hamilton Mourão atuaram para desmerecer a gravidade do caso. Caso convençam uma parcela da população disso, vão jogar ainda mais gasolina nas eleições de outubro.

Preocupado com o impacto do caso para a sua imagem, Bolsonaro tem dado declarações para encobrir que Guaranho reproduzia a sua retórica intolerante quanto a adversários. Em sua conta do Facebook, por exemplo, o assassino ecoava Bolsonaro ao afirmar que o Brasil precisa de uma "limpeza" dos petistas.

Ao invés de condenar a violência e pedir para que seus seguidores e os demais brasileiros desarmem os espíritos para a eleição, Bolsonaro deu declarações no sentido contrário. Em uma delas, nesta terça (12), usou o famigerado "mas" para tentar mostrar que o "outro lado", ou seja, o do agressor, também tinha suas razões.

E na tentativa de convencer que essa violência não tem cunho político, o presidente vem repetindo números de homicídios no Brasil, apontando que houve uma redução de mortes sob o seu governo. Para ele, se as mortes caíram no país, o bolsonarismo é vida, não morte, e não tem a ver com o ocorrido.

Fazer essa comparação descabida é o equivalente a alguém, contestado após estimular o racismo ou a homofobia, afirmar que tem amigos negros ou LGBTQIA+.

Esse discurso foi corroborado pelo general Hamilton Mourão. Comentando a tragédia em Foz do Iguaçu, ele tentou minimizá-la, nesta segunda (11). "Olha, é um evento lamentável, né? Ocorre em todo final de semana, em todas as cidades do Brasil, de gente que provavelmente bebe e aí extravasa as coisas, né?", disse a jornalistas.

Ou seja, Mourão afirmou que ocorre todo final de semana alguém invadir uma festa de aniversário fechada, decorada com as cores do PT e imagens de Lula, discutir com o aniversariante por política, ameaçar acabar com todos os presentes, depois ir para a casa, buscar uma arma e voltar para matar.

O mesmo processo que fez com que uma pessoa comum, como Jorge Guaranho, se tornasse um assassino intolerante, está presente na tentativa de minimizar o crime.

A sobreposição dos discursos de Bolsonaro ao longo do tempo, fomentando ódio contra políticos, magistrados, jornalistas, entre outros, distorce a visão de mundo de seus seguidores e torna a agressão "necessária'' para tirar o país do caos e extirpar o "mal", alimentando a violência.

Da mesma forma, a sobreposição de discursos afirmando que o crime não tem relação política acaba por normalizar a violência política, que passa a ser encarada como briga de bêbado na esquina.

Bolsonaro e Mourão, com isso, ajudam a semear ainda mais violência em uma eleição que será marcada por tumultos.

Não admira que o governo diga que não haverá tentativas de golpe com a ajuda de seguidores armados do presidente. Para ele, serão apenas "manifestações cívicas com Deus e a Família pela liberdade e a democracia".

 https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2022/07/13/governo-arma-uma-bomba-ao-vender-que-assassinato-de-petista-foi-crime-comum.htm?fbclid=IwAR3Qf2N2hc1doN27JtaETrNObUSe-Rnm4BIiAkvp3F8HZ9V0OJF-T12l9Ks 

 

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