O que celebrar no Dia das Crianças

O que celebrar no Dia das Crianças

Com fome, guerras e abusos na infância no mundo, o que celebrar no Dia das Crianças?

Para as potências econômicas e os centros mundiais de poder, massa de meninas e meninos famintos e cheios de doenças evitáveis são baixas colaterais

Carolina Vásquez Araya - Diálogos do Sul 

Cidade da Guatemala 11/10/2022

À infância se dedica um dia ao ano, como gesto simbólico e oportunidade política.

Na maioria dos países, o Dia das Crianças se celebra em diferentes datas. A marcada como oficial corresponde à Declaração Universal dos Direitos Humanos, emitida pela ONU em 1954. Esta, coincide com os aniversários do Dia Universal da Criança, a adoção da Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959) e a aprovação da Convenção dos Direitos das Crianças (1989). Todos eles, documentos da maior transcendência, firmados e ratificados por todos os países do mundo.

Mas o que acontece com esses direitos no cenário real? 4 milhões de recém nascidos no mundo morrem durante seu primeiro mês de vida. 148 milhões de menores de cinco anos nas regiões em desenvolvimento – onde se encontra nosso continente – têm um peso insuficiente para suas idades. 1 bilhão e 20 milhões de seres humanas passam fome todos os dias. 1 bilhão e 400 milhões de pessoas carecem de acesso à água potável, uma situação que piora a cada dia pela mudança climática e as migrações forçadas.

Organizações criadas especificamente para observar e contribuir à melhoria da situação da infância, coincidem em constatar como esta afeta a milhões de meninas, meninos e adolescentes, condenando-os a um cenário de pobreza extrema, violência, exploração e abuso. Somado a isso, os países do terceiro mundo consideram a infância e a adolescência um subproduto social, dada sua condição de vulnerabilidade e por não possuir a menor incidência nas decisões políticas. Devido a isso, se encontram sujeitas a decisões que não lhes favorecem e sofrem a carga adicional da marginalização na elaboração e aplicação de políticas públicas.

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Diante da devastação provocada pelos fenômenos climáticos, os efeitos das guerras, a injustiça das migrações forçadas, a polarização da riqueza e a corrupção dos governos, as maiores vítimas se concentram entre a população infantil e juvenil. Para as potências econômicas e os centros mundiais de poder político e econômico, essa massa de meninas e meninos famintos e cheios de doenças evitáveis são baixas colaterais. Diante dessa realidade, celebrações como a mencionada anteriormente não só resultam um simbolismo vazio, mas além disso são um recordatório obrigado da absoluta falta de observância das Declarações dedicadas a proteger aquelas que são seu principal objetivo.

Um dos mais graves efeitos do abandono no qual se desenvolvem as novas gerações é o aumento sustentado de problemas de desnutrição, autoestima, crise de identidade e depressão. Isto, que já era parte da situação de pobreza na qual se encontra a imensa maioria de meninos, meninas e jovens, experimentou um forte incremento a partir da pandemia. De acordo com o informe Estado Mundial da Infância 2021, elaborado pela Unicef, “o suicídio é a quarta causa principal de morte entre os adolescentes de 15 a 19 anos. A cada ano, quase 46 mil crianças entre 10 e 19 anos tiram a própria vida: ou seja, uma criança a cada 11 minutos”. 

Os discursos demagógicos e gestos condescendentes dos líderes políticos em suas promessas de campanha constituem, diante desse cru panorama da infância, um exemplo da aberrante perda de sentido da realidade que lhes condiciona quando acedem ao poder. A obrigação da cidadania é insistir no respeito pelos direitos desse setor, tão importante como marginalizado. Dele depende o futuro e essas não são palavras vazias. 

Quando uma criança tira a própria vida, algo morre também em cada um de nós. 

Carolina Vásquez Araya | Colaboradora da Diálogos do Sul da Cidade da Guatemala.
Tradução: Beatriz Cannabrava.


 

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