O último espetáculo da direita
Globo encenou o último espetáculo da direita esfacelada
"O fim de Bolsonaro vai abrir caminho para renovações que o bolsonarismo não permite que prosperem", escreve Moisés Mendes
Por Moisés Mendes, para o 247
O debate de ontem na Globo foi devastador para a direita brasileira. Expôs o que sobrou do que se resume a antilulismo e antipetismo, ao juntar num palco de luxo figuras que geralmente aparecem dispersas.
A degradação da direita, a partir da ascensão de Bolsonaro, permitiu que se criasse essa paisagem tenebrosa.
Para que o horror seja completo, temos como novo figurante a última assombração de quatro anos de fascismo. Mas o padre Kelmon é só aparentemente a única caricatura surgida às vésperas da eleição.
Não é. Todos os que se uniram para atacar Lula são figuras quase burlescas, com exceção de Simone Tebet.
Felipe D’Avila não ata o nó da gravata de um Afif Domingos, seu ancestral liberal de 1989. Ciro Gomes parece ser superior na sua arrogância das estatísticas, mas finalmente chegou ao mesmo nível de Soraya Thronicke, sem o humor da senadora.
É autoengano da direita e da extrema direita achar que o padre fake estaria sozinho como o grotesco em meio ao que é dado como normal. Não há mais normalidade no que já foi o contraponto às esquerdas.
O debate expôs a precariedade do conjunto. Seria diferente se o time tivesse João Doria, Mandetta, Eduardo Leite, Rodrigo Pacheco ou Luciano Huck? Seria menos pior, desde que não tivesse Sergio Moro.
Acentua-se nessa eleição a degradação da direita brasileira, depois de duas décadas de hegemonia tucana como oposição ao lulismo, agravada com o surgimento de Bolsonaro. O debate só iluminou a cena.
O Brasil ficou diante do bagaço do que se assume como fascismo e do que, ao lado, ainda se apresenta genericamente como liberalismo. Tudo é precário, muito abaixo do raso e do senso comum.
O conjunto é tão ruim que Lula, quase sempre brilhante, atrapalha-se um pouco diante deles. Falta qualidade na discordância e até no ataque desleal.
Mas o debate fez também um favor à direita como última advertência antes do fim de Bolsonaro.
Este é o aviso: saiam da armadilha que o golpe de 2016 criou, com a ajuda da Globo e da grande imprensa, e livrem-se do sujeito, dos militares e dos milicianos.
Soraya e Simone até que tentaram, agora como oponentes diretas do genocida, dizer que chegou a hora de saltar fora do projeto tutelado pelos generais.
Com uma vitória em primeiro turno, Lula poderia contribuir para que se antecipe o projeto de salvação também do que restou da direita.
O fim de Bolsonaro vai abrir caminho para renovações que o bolsonarismo não permite que prosperem. O debate foi o espetáculo derradeiro.
A direita não pode desistir da própria sobrevivência e se resignar a entregar seu destino a Arthur Lira e ao centrão.
Lula, o PT, as esquerdas, o futuro governo, os que ainda se definem como de centro e os velhos conservadores assustados com o que viram ontem dependem, tanto quanto as instituições e a democracia, de uma direita sóbria e renovada.
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.
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