Pedagogia e resistência
Pedagogia e resistência: homenagem e luta no Dia do Pedagogo

Jonas Reis (*)
Neste Dia do Pedagogo, é essencial ir além das comemorações simbólicas e reconhecer, com profundidade, o papel transformador de todos aqueles e aquelas que educam a nação brasileira. Celebrar os pedagogos e as pedagogas é também reverenciar sua luta diária — não apenas pelas aulas lecionadas, mas também pela construção do direito à educação e pela defesa de melhores condições de trabalho para toda a classe docente.
A trajetória de professores e professoras no Brasil sempre foi marcada por dificuldades. A complexidade da educação pública no contexto atual, dentro de uma sociedade capitalista e individualista, impõe desafios ainda maiores. A competição, o isolamento e o enfraquecimento do senso de coletividade minam os ideais de solidariedade e justiça social que devem nortear a educação pública. Mesmo diante desse cenário, são os educadores rebeldes que dão o tom da resistência — os pedagogos e pedagogas engajados, que há décadas empunham a bandeira de mais escolas, mais educação, mais cadernos, mais lápis — e menos armas, menos ódio.
Pedagogos como Paulo Freire são uma inspiração. A pedagogia crítica freiriana continua a iluminar o caminho da educação emancipadora. Seu legado inspira lutas do passado, do presente e do futuro. Defensores da escola pública encontram em suas ideias uma base sólida para resistir aos retrocessos e construir um projeto educativo plural, democrático e libertador.
Defender a escola pública é também defender a democracia. A escola que não escolhe seus alunos, que acolhe a diversidade, é uma trincheira contra as opressões históricas. Nesse sentido, é urgente lembrar e honrar os lutadores sociais que atuaram — e atuam — na resistência contra regimes autoritários, como a ditadura militar brasileira (1964–1985). O compromisso pedagógico também é político: educar é formar consciência crítica, é lutar para que os erros do passado não se repitam.
O percurso da pedagogia brasileira é repleto de conquistas obtidas com muita luta. Entre elas, destaca-se a Lei do Piso Nacional do Magistério (Lei nº 11.738/2008), proposta pelo então ministro Tarso Genro e sancionada no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa lei foi fruto da escuta ativa das demandas históricas dos educadores por reconhecimento e dignidade profissional.
Contudo, mesmo com essa conquista legal, muitos prefeitos e governadores criam subterfúgios legislativos para não aplicar o piso nacional, desvalorizando o trabalho docente e ignorando que não há educação pública de qualidade sem valorização do magistério.
Infelizmente, vivemos um ciclo de retrocessos a partir do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, seguido pelo governo golpista de Michel Temer e o protofascismo do governo Bolsonaro. Esses governos promoveram cortes drásticos no orçamento da educação e ataques sistemáticos às carreiras do magistério.
Durante os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, a educação pública foi alvo de uma série de escândalos e desmontes estruturais. No governo Temer, o congelamento de investimentos sociais por 20 anos, por meio da Emenda Constitucional 95, já representou um duro golpe ao financiamento educacional. No governo Bolsonaro, a situação agravou-se com escândalos envolvendo o Ministério da Educação (MEC), como as denúncias de um “gabinete paralelo” de pastores que negociavam verbas públicas em troca de propina, favorecimentos e até pedidos de “barras de ouro”. Ministros como Milton Ribeiro chegaram a ser investigados e presos por envolvimento direto nesses esquemas. Enquanto isso, universidades e escolas sofriam com cortes orçamentários severos, abandono de políticas públicas e uma tentativa sistemática de deslegitimar educadores e instituições de ensino. Esses episódios revelam o desprezo desses governos pelo direito à educação e seu alinhamento com interesses privatistas e antidemocráticos de direita.
No Rio Grande do Sul, o governo Leite promoveu a destruição do plano de carreira do Magistério Estadual no ano de 2020, achatando salários e desestimulando a formação continuada. Em Porto Alegre, a reforma administrativa do governo Marchezan aprofundou o desmonte das carreiras públicas municipais, afetando mais de 4 mil professores.
Neste dia, é essencial lembrar que a defesa da educação passa pela garantia e fortalecimento de legislações fundamentais, como:
– Constituição Federal do Brasil de 1988;
– Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) – Lei nº 9.394/1996;
– Lei do Piso Nacional do Magistério – Lei nº 11.738/2008;
– Novo Fundeb – Emenda Constitucional nº 108/2020.
Essas leis são cruciais para assegurar o financiamento, a valorização docente e a democratização da educação. No entanto, elas estão constantemente ameaçadas por interesses neoliberais que buscam desresponsabilizar o Estado e transformar a educação em mercadoria, tratando alunos como produtos e professores como meros executores de metas empresariais.
Há um projeto de desmonte do Estado brasileiro perpetrado pelos neoliberais, e a meta final deles é destruir os mínimos constitucionais para que não tenhamos mais políticas sociais, como a política pública da educação para todos e todas — mas apenas para quem puder pagar. Por isso, a luta dos pedagogos e de todos os trabalhadores em educação, em defesa da democracia, da Constituição Federal e das leis supracitadas, é fundamental para não retrocedermos mais.
Contra esse projeto de desmonte, reafirmamos: educação não é mercadoria, e o professor não é servo do capitalismo. A pedagogia é, antes de tudo, uma prática de resistência e de construção da humanidade. Enquanto houver pedagogos e pedagogas, haverá esperança, luta e compromisso com a transformação social.
Nesse sentido, lembramos Dermeval Saviani: “Aos pedagogos e estudantes de pedagogia que, contra a maré montante de tantas profissões glamorosas, não perderam o fascínio por este que é o mais apaixonante de todos os ofícios: produzir a humanidade no homem.”
Que, neste dia, possamos agradecer, sim, mas principalmente nos comprometer com a defesa da escola pública, da carreira docente e da dignidade daqueles que dedicam sua vida a formar cidadãos e cidadãs para um mundo mais justo e igualitário.
(*) Vereador, pedagogo, doutor em Educação e líder da Oposição da Câmara Municipal de Porto Alegre.
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