Perigo para comunidade escolar

Perigo para comunidade escolar

Para professores, volta às aulas no Rio Grande do Sul é perigo para comunidade escolar

Educadores temem que aglomerações resultem em mortes de funcionários e familiares

12/08/2020 

 

Medo e insatisfação são algumas das reações externadas por professores e entidades da categoria em relação à decisão do governo Eduardo Leite de retomar as aulas no Rio Grande do Sul. Profissionais da linha de frente da educação ouvidos por GaúchaZH entendem que a decisão não deveria ocorrer neste momento da pandemia de coronavírus, que está em seu pior estágio no Estado, e que os protocolos sanitários definidos pelas autoridades são insuficientes para assegurar a segurança de todos. 

O governo afirma que haverá limite de 50% na lotação das salas de aula ou das escolas e que haverá um rodízio, com a turma dividida pela metade e se alternando entre alguns dias na instituição e outros, em aula remota. Também serão distribuídas máscaras e notebooks às escolas.

A impossibilidade de manter distanciamento entre crianças é a maior crítica, mas há outras dúvidas: ao dividir uma turma em duas partes para aplicar o rodízio, será preciso planejar aulas em dobro? Senão, será suficiente apenas filmar a aula e enviar a quem ficou em casa? O que acontecerá com professores idosos ou com comorbidades? Como evitar disseminação de vírus quando milhares de jovens estiverem nas ruas?

Os sindicatos de professores, tanto de escolas privadas quanto públicas, são contra a retomada e classificam a liberação como “irresponsável” e “prematura” – já o sindicato das escolas privadas é a favor e afirma que as instituições particulares estão prontas para receber os estudantes. 

Infraestrutura de escolas públicas dificulta retorno

As carências na infraestrutura de escolas públicas devem dificultar a aplicação de um sistema híbrido, observa a professora dos ensinos Fundamental Médio de escolas da rede municipal e estadual de Guaíba Michelle Azambuja. Ela cita que docentes já trabalham sobrecarregados durante a pandemia e que a necessidade de planejar conteúdos "em dobro" trará um nível ainda maior de trabalho – sobretudo em uma realidade de atraso de salários. 

— Nenhuma aula presencial simplesmente vira direto aula online, a gente precisa adaptar, mas nossa carga horária já está excedida durante a pandemia. E tem sala de aula sem internet, a gente vai ter que levar álcool gel de casa, os alunos do Médio pegam ônibus, a gente pipoca de um lugar para outro... Não entendo a logística de dar aula presencialmente e fazer rodízio de turma com cada professor dando 12 disciplinas e tendo que dividir ao meio cada turma. O terceiro ano deveria voltar em rodízio por causa do Enem e do vestibular, mas é impossível crianças ficarem com máscara a manhã toda. Isso não existe — avalia. 

Aglomeração causa receio

Professores da rede particular da Capital ouvidos pela reportagem, que não quiseram ter a identidade divulgada por medo de represália, reconhecem a realidade privilegiada de instituições privadas, mas acreditam que, apesar dos protocolos, há riscos. Um professor de português de Ensino Fundamental chama o retorno de "precipitado" e observa que o trabalho presencial renderá menos em meio ao esforço dos professores em constantemente pedir distância dos estudantes.

— No nosso papel, dar aula e ter todo esse cuidado a mais sobrecarrega muito física e emocionalmente. Não temos certeza se as aulas vão acontecer com câmera em sala ou se vai ter aula presencial seguida de outra aula para quem está em casa, de forma remota. Eu acho bem precipitado esse retorno. Mesmo para municípios que tenham bandeiras amarelas, a possibilidade de ampliar a infecção na população é muito grande — afirma. 

Uma professora de idiomas para anos iniciais do Ensino Fundamental teme o risco na mobilidade de pessoas envolvida em uma volta às aulas. O Censo Escolar de 2019 aponta que o Rio Grande do Sul tem 2,29 milhões de estudantes na educação básica e 116 mil professores nas redes municipal, estadual, federal e particular. 

— O contato é muito importante para os pequenos, a gente abre o caderno, mostra a página, aponta a atividade. É muito difícil fazer qualquer medida de afastamento e higiene. Sem contar que várias pessoas são envolvidas nas aulas, como os pais que levam os filhos, o tio da van, os professores que pegam ônibus… Ainda há ambientes comuns, como a cozinha, a biblioteca, o refeitório e os corredores estreitos — pontua. 

Sindicatos de professores criticam retomada

A presidente do Cpers-Sindicato, que representa professores das escolas estaduais, Helenir Schurer, avalia que a retomada das aulas ocorreria no pior momento da pandemia

 — A cada dia os óbitos crescem, os leitos de hospitais diminuem as vagas. Em um momento em que a pandemia está em uma curva ascendente, é uma irresponsabilidade falar em volta às aulas. Não é possível pensar em voltar às aulas — diz Helenir. 

A diretora do Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinpro-RS), Cecília Farias, classificou o movimento como “prematuro”, e mostra preocupação com as aulas na Educação Infantil.

— As crianças menores serão as primeiras a voltar, elas serão, com certeza, transmissoras da covid-19. Como as crianças normalmente são assintomáticas, esses vírus nelas é invisível, e temos muita preocupação de que os professores sejam bem atingidos com isso — avalia Cecília.

O Sindicato do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinepe) emitiu nota, na manhã desta quarta-feira (12), na qual afirma que as escolas particulares estão prontas para receber os alunos. A instituição afirmara na terça-feira (11) que as aulas virtuais seguirão acontecendo até o fim do ano. 

“Com a retomada das atividades do comércio, da indústria e dos serviços, é inevitável a necessidade do retorno das crianças à escola. Neste sentido, saudamos a possibilidade aventada pelo governo da volta às aulas ainda no mês de agosto, o que acreditamos ser uma medida correta. Esta retomada deverá ser gradual. Defendemos que cada instituição possa definir quais alunos devem voltar primeiro, pois são elas quem melhor conhecem as necessidades de seus alunos”, diz a nota.




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