Perseguições na consulta escolas militares
Perseguições e ausência de canais de diálogo: o contexto da consulta das escolas cívico-militares no Paraná
Comunidade escolar e professores relatam perseguição ao longo da mobilização que questiona o modelo
Desde a publicação do edital de anúncio do processo de consulta pública iniciado no Paraná sobre a implantação de 127 escolas cívico-militares, de 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, o ambiente entre a chamada comunidade escolar e o governo do estado tem sido tenso. A consulta à comunidade escolar inicia no dia 28 (hoje) e se estende até o dia 29, das 8h às 22h
O conflito se deve ao fato de que mães contrárias à implantação do modelo estadualizado do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (PECIM), sindicalistas, professores e estudantes, relatam um cenário de perseguição, ausência de canais e debate com a comunidade. Chegando até a guerra de informações e fake news.
Corpo a corpo e panfletagem
O corpo a corpo e o panfletaço nos locais de estudo têm revelado conflitos.
Maria (nome fictício), mãe e ativista comunitária no bairro Novo Mundo, em Curitiba, após vídeo que repercutiu muito nas redes, narrando situações de racismo sofridas pela sua filha no modelo militarizado, recebeu quatro ligações do colégio cívico militar no bairro Novo Mundo, no sábado (25). Maria e outras mulheres lutam para que a militarização não se estenda para o colégio Ivo Leão, para onde justamente a filha havia sido transferida.
“A escola ficou ligando, pediram para que eu fosse na escola para prestar esclarecimentos, no sábado me ligaram de manhã, que eu teria feito denúncias gravíssimas, que teria que comparecer à escola, para me explicar”, diz, receosa com eventuais perseguições. No entanto, de acordo com advogados da líder comunitária, não é necessária a apresentação e a intimação da maneira como foi feita, em uma escola onde Maria já não tem nenhum vínculo.
Interior
Em outro colégio estadual já militarizado, em Toledo (PR), desde o final de 2020, um professor há 14 anos, que pediu para não se identificar, relata a entrada na direção da escola de um diretor que, ao mesmo tempo, é PM aposentado e professor estadual, assumindo a direção no início de 2021. “O novo diretor pensa apenas na regra, regra, regra, e não consegue fazer um debate educacional. Já disse que está ali para atender o governo e não a comunidade”, classifica. E o professor complementa:
“Eu fui sindicalista em Toledo, mas sempre soube separar o trabalho sindical do trabalho pedagógico, que nós sabemos fazer. Neste sentido, iniciaram medidas de perseguição a partir desse ano. Por exemplo, solicitei um espaço, em conjunto com a Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), para debater a ditadura militar no Oeste do Paraná, baseado nos conteúdos de História e Geografia no Paraná, mas isso foi negado”, denuncia o professor, que, atualmente, encontra-se em licença médica.
“No dia 29 de abril deste ano, fui chamado de pateta na frente dos colegas. Não temos essa tradição de insultos, o que chocou os colegas”, relata o professor, agregando que também já houve episódios de ofensas diante dos alunos. “Entrei com ação judicial (contra o governo do Paraná), reunindo elementos que comprovam a prática de assédio moral e perseguição”, afirma.
Falta de canais de diálogo e informação
Também na região Oeste do Paraná, em Foz do Iguaçu, o professor Alejandro Flores é licenciando em Letras (Espanhol e Português) e enviou à reportagem, via redes sociais, que não pode divulgar opinião nos materiais da escola e que, portanto, publicou em outro periódico local sua opinião sobre o tema, questionando se a escola não deveria investir no fortalecimento de outros profissionais no ambiente escolar, em lugar da alocação do militar aposentado:
“Será que não seria mais benéfico contar com especialistas que compreendem as complexidades emocionais e cognitivas dos estudantes? Profissionais capacitados em psicologia, assistência social e psicopedagogia podem desempenhar um papel crucial na promoção do bem-estar emocional e no apoio ao desenvolvimento acadêmico”, afirmou, em publicação recente.
Consulta desta vez envolve 80 mil alunos
Segundo a Secretaria de Estado da Educação (Seed), cerca de 80 mil alunos da rede estadual estarão envolvidos no processo. O resultado da votação deve ser divulgado no dia 5 de dezembro. Hoje, o Paraná já possui 194 escolas cívico-militares.
A APP-Sindicato informa que, de acordo com a resolução Nº7919/23 estão habilitados a votar professores e funcionários de escola (QPM, QFEB e PSS), estudantes com 16 anos ou mais, mães, pais e responsáveis de estudantes com menos de 16 anos.
Para votar, eleitores precisam levar um documento com foto. O voto é secreto e inviolável.
Serão habilitados à mudança colégios que atingirem a maioria simples de votos e, em caso da não obtenção de quórum, uma nova votação será realizada no dia 30.
Sindicato divulga canal para receber irregularidades
No dia da votação, a APP-Sindicato oferece canal de denúncias caso o integrante da comunidade escolar "perceber irregularidades, for coagido ou pressionado a votar favorável". O sindicato pede registro da situação como puder e denúncia no canal appsindicato.org.br/denuncia ou pelo Whatsapp (41) 99249-2328.
NOTA da Secretaria Estadual de Educação - em resposta dos questionamentos do Brasil de Fato Paraná sobre perseguições contra mães, professores, divulgação de fake news e ausência de canais de informação. Confira a resposta da Secretaria Estadual.
Por orientação jurídica, o nome da escola foi ocultado para preservar a denunciante:
A Escola Estadual XX, ao tomar conhecimento da situação, imediatamente iniciou apuração detalhada dos fatos relatados.
A diretoria da escola enfatiza que, em momento algum, emitiu orientações aos colaboradores no sentido de solicitar modificação do corte, comprimento, estrutura ou qualquer apresentação no cabelo dos alunos. Como todas as instituições de ensino, sejam elas de caráter cívico-militar ou não, o Colégio Estadual XX respeita o direito dos estudantes de optarem por sua apresentação pessoal da maneira que desejarem.
Quanto à forma como a suposta advertência foi comunicada, a escola reforça seu compromisso com o respeito no tratamento com os estudantes e está conduzindo uma investigação interna junto ao corpo docente para esclarecimentos mais precisos sobre a situação.
É importante salientar que a escola enviou um convite formal à mãe denunciante, convidando-a a comparecer à instituição para fornecer informações adicionais e colaborar na elucidação dos fatos. Até o momento, não obteve-se resposta por parte da mãe.
A Secretaria de Estado da Educação do Paraná (Seed-PR) reforça que permanece aberta ao diálogo e reitera seu compromisso com a transparência e a justiça. Caso a mãe denunciante deseje discutir a situação ou esclarecer quaisquer dúvidas, as portas da escola estão abertas para recebê-la a qualquer momento.
A instituição está empenhada em garantir um ambiente educacional inclusivo, respeitoso e que promova o pleno desenvolvimento de seus estudantes.
Edição: Lucas Botelho
FONTE:
Governo do Paraná descumpre recomendação do MP e segue com prática antissindical na consulta das escolas cívico militares
Dirigente da CUT Paraná e da APP-Sindicato foi intimidado na tarde desta terça-feira (28)
via CUT Paraná
A APP-Sindicato, que representa professores e funcionários de escola no Paraná, denunciou na tarde desta terça-feira (28) uma nova tentativa de intimidação de representantes do Governo do Estado. As reiteradas práticas antissindicais por parte da gestão de Ratinho Júnior resultaram, inclusive, em uma recomendação do Ministério Público do Trabalho para que atitudes como esta cessem de forma imediata.
O embate se dá em virtude da tentativa de Ratinho Júnior em ampliar o número de escolas militarizadas no Estado. Este modelo tem sido alvo de denúncias da comunidade escolar devido a prática de assédio contra alunos e alunas. Ao tentar entrar em uma das escolas, o professor e secretário de comunicação da CUT Paraná e da APP-Sindicato, Daniel Matoso, foi intimidado por um funcionário do Núcleo Regional de Educação. Matoso estava acompanhado da estagiária de jornalismo da APP. Confira no link o vídeo da intimidação.
“Infelizmente não surpreende. É uma ação reiterada que já foi alvo de processo da APP-Sindicato e que foi vitorioso. O Ministério Público do Trabalho reconheceu estas práticas e agora esperamos uma nova providência da justiça. Tentam nos intimidar e usam instrumentos ilegais e antidemocráticos em todo o processo. Mas não conseguirão. Seguiremos em luta por uma escola pública de qualidade, democrática e inclusiva”, apontou o dirigente.
A tentativa de intimidação ocorreu em uma escola no bairro Santa Felicidade. Ao ser informado de uma denúncia recebida pela APP-Sindicato de que materiais a favor da militarização da unidade escolar foram enviados nos grupos institucionais da escola, fato reiterado em todo o Paraná, o funcionário do Núcleo de Educação ainda se negou a verificar os fatos apontados.
“Estamos ao lado da APP-Sindicato e da comunidade escolar. A falta de diálogo de Ratinho Júnior com as entidades sindicais e com a sociedade de uma forma em geral, a exceção do empresariado amigo, é uma marca registrada desde o seu primeiro governo. Agora avança em outros passos, adotando práticas antissindicais. Não vamos permitir esse tipo de comportamento e vamos somar forças com a APP para denunciar e buscar tomar as medidas legais cabíveis”, completou o presidente da CUT Paraná, Marcio Kieller.
Nesta quarta-feira (29) o programa semanal de entrevistas da CUT Paraná em parceria com o jornal Brasil de Fato Paraná, o Quarta Sindical, produzido em parceria com o Jornal Brasil de Fato, receberá dirigentes sindicais para falarem sobre a militarização das escolas no Estado. O programa é exibido ao vivo pelos perfis da CUT Brasil, CUT Paraná, Brasil de Fato Paraná no Facebook, além de outras entidades parcerias a partir das 11h30.
Edição: Ana Carolina Caldas
FONTE: