Projeto proíbe doutrinação política
Como pode a direita defender Escola sem Partido e, supostamente, a "liberdade de expressão"?
Câmara aprova projeto que proíbe "doutrinação política" em escolas municipais
Rodrigo Lopes
Minha primeira reação diante da aprovação pela Câmara de Porto Alegre do projeto Escola Sem Partido, que proíbe a “doutrinação política ou ideológica” em escolas municipais, foi de que essa seria uma ação contraditória: como pode a direita reivindicar liberdade de expressão, quando critica a regulamentação de redes sociais, e podá-la dentro da sala de aula?
Pensei também em desconhecimento: como vai a plenário um projeto de lei cujo conteúdo da matéria já foi considerado inconstitucional pelo Supremo em 2019, em caso semelhante em Alagoas?
Como não espero coerência nem tampouco na ignorância dos vereadores sobre aspectos jurídicos, aposto em oportunismo político. A lei, que irá a sanção do prefeito Sebastião Melo provoca mais barulho do que, efetivamente, coíbe “doutrinação política ou ideológica”.
Em defesa do projeto, dizem-se que o objetivo é trazer "bom senso de volta às escolas", um suposto ambiente neutro, entre a primeira e quinta séries da rede pública municipal. Quem descumprir a lei, será responsabilizado, com penas que podem incluir advertência, suspensão e até multa.
A medida aprofunda a patrulha entre pais e professores, em um ambiente escolar já por demais polarizado, onde, além de divisões políticas, corre solto, aliás, o bullying - esse, sim, um problema que os nobres vereadores deveriam enfrentar. Direitos humanos, questões de gênero, respeito às diferenças e, acima de tudo, diálogo, é justamente de que os pequenos cidadãos em formação precisam. Senão na escola, onde aprenderão sobre esses temas? Nas redes sociais?
FONTE:
Após aprovação dos vereadores da Capital, Escola sem Partido volta a dividir opiniões; entenda
Projeto prevê a proibição de “doutrinação política ou ideológica” nas escolas municipais. Especialistas apontam problemas na decisão
Nesta semana, voltou a ser discutido em Porto Alegre um tema que divide pais, professores e especialistas – o projeto de lei (PL) Escola sem Partido, aprovado nesta quarta-feira (11) pela Câmara de Vereadores. A proposta ainda depende do parecer do prefeito Sebastião Melo, que pode sancionar, vetar ou silenciar sobre o projeto.
O texto estabelece orientações sobre o comportamento de gestores, funcionários e corpo docente a respeito de questões sociopolíticas, "preconizando a abstenção da emissão de opiniões de cunho pessoal que possam induzir ou angariar simpatia a determinada corrente político-partidária-ideológica".
O PL ainda prevê a proibição de “toda e qualquer doutrinação política ou ideológica” nas escolas da rede municipal de Porto Alegre, bem como "responsabilização do professor, administrador ou representante de estabelecimentos de ensino público municipal" que "desrespeite os princípios estabelecidos no projeto".
A autoria da iniciativa é do então vereador Valter Nagelstein, em 2016. A matéria chegou a ser aprovada pelo plenário em 2019, mas uma decisão judicial impediu a continuidade da tramitação do projeto. Em julho deste ano, a proposta foi desarquivada a pedido da vereadora Fernanda Barth (PL) e voltou a ser discutida, dividindo opiniões, sobretudo por conta do caráter moral do debate.
O que pode mudar
Caso seja sancionado, o que ainda não tem previsão para acontecer, o Escola Sem Partido deve “tranquilizar pais e mães", dando a garantia de que não haverá conteúdo que não seja pedagógico dentro de sala de aula, segundo a vereadora Comandante Nádia (PL), que apoia o projeto:
— Diferentemente do que a oposição está dizendo, quando falamos do projeto, não é deixar de falar sobre racismo, por exemplo. Não tem nada a ver com racismo, porque isso não é política partidária, isso é política de todas as pessoas que querem o bem, que não aceitam o preconceito — diz.
Segundo ela, o professor deve ser um guia, e não um “impositor de sua opinião”. Na prática, os docentes e funcionários deixariam de levar nomes de figuras políticas para atividades em sala de aula, por exemplo. No entanto, o projeto não traz detalhes sobre como isso será fiscalizado.
Conforme a vereadora, os próprios pais devem ficar atentos ao que está sendo abordado na escola, a partir de diálogo com os filhos e observando o material didático. “A responsabilização (...) será atribuída mediante processo legal, civil e administrativo, quando for o caso, impondo-se penas disciplinares de advertência, suspensão e multa”, consta no PL.
Risco a professores e ao ensino
Um dos riscos elencados por quem se opõe ao projeto é que os professores sejam ameaçados e atacados, tanto por alunos quanto por familiares dos estudantes, tendo em vista que a violência moral e física contra professores é cada vez mais frequente.
Para o professor e integrante da Rede de Pesquisa em Juventude no Brasil (Redejuve) Ricardo Severo, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), trata-se de um retrocesso na educação.
— Essa pauta é reacionária. Na verdade, o projeto busca vilanizar professores e desconstruir a escola como um espaço de saber legítimo, e isso é feito a partir de estratégias como o pânico moral — afirma o pesquisador.
Conforme Severo, isso atrapalha o avanço da educação, porque as pessoas acabam desconfiando do conteúdo abordado nas escolas. Severo defende que não há maneira de fiscalizar as regras que o projeto busca estabelecer, porque são questões arbitrárias:
— Questões como a obrigatoriedade das vacinas, a proteção contra covid-19, as mudanças climáticas e questões de gênero são impossíveis de serem colocadas como elementos objetivos. Como a gestão da escola vai dizer o que é ideológico ou não? Quem vai definir isso é a arbitrariedade.
A proposta defende que é necessário “respeitar a neutralidade das opiniões, desprovendo de partidarismo suas manifestações”, ao tratar sobre questões “das ideologias políticas”.
FONTE:
Conversas Cruzadas: Escola sem Partido em Porto Alegre é avanço ou retrocesso na educação?
O programa é transmitido no streaming, de segunda a sexta-feira, às 17h30min
No episódio do Conversas Cruzadas desta sexta-feira, às 17h30min, o apresentador Paulo Rocha recebe a vereadora (PL), Comandante Nádia, e a vereadora (PSOL), Karen Santos, para debater se o Escola sem Partido em Porto Alegre é um avanço ou retrocesso na educação.
O Conversas Cruzadas vai ao ar de segunda a sexta-feira, no streaming, com os assuntos que mais impactam o público. O espaço discute economia, cidades, política, educação e saúde. O programa é transmitido ao vivo no canal do Youtube de GZH e também pelo site e pelo aplicativo.
FONTE: