Qual o futuro do serviço público?
Fim da obrigatoriedade do RJU: qual o futuro do serviço público?
07/11/2024
A decisão do Plenário do STF, tomada ontem (6), sobre a constitucionalidade da quebra de obrigatoriedade de regimes jurídicos únicos (RJU) e planos de carreira para servidores da administração pública direta, de autarquias e das fundações públicas das três esferas da União, encerrou, de forma negativa, uma contenda que se arrastava há 26 anos.
É necessário, portanto, resgatar a origem desse processo que, na essência, representa o desmantelamento da organização estrutural dos serviços públicos, através da provável precarização das relações de trabalho no setor público.
O responsável direto por esse processo está no rol dos presidentes que promoveram o desmantelamento das estruturas estatais e públicas, Fernando Henrique Cardoso, eleito em 1994, com um programa de governo radicalmente voltado para o mercado, escamoteado por uma política cambial e monetária que trouxe reflexos positivos no combate à inflação, mas desestabilizou as contas públicas, com o aumento das taxas de juros. A resposta dada, então, foi implementar uma feroz política de privatizações como “enxugamento de ativos”.
Uma das principais propostas do governo FHC era “reestruturar” o Estado brasileiro, e isso significou conspurcar a Constituição de 1988, por meio da Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998, que alterou o artigo 39 da referida Constituição, retirando a obrigatoriedade da instituição dos regimes jurídicos nas três esferas da União.
A aplicabilidade dessa emenda foi contida em 2000, quando o PT, PCdoB, PSB e PDT entraram com a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2135, que questionava o trâmite rapidíssimo da proposta governamental e, por conseguinte, a considerava inconstitucional. Em 2007, foi acatada uma liminar que suspendia os efeitos da EC 19.
O julgamento de ontem encerrou definitivamente essa contenda, acatando a tese da constitucionalidade da EC 19, liberando, portanto, os entes federados para escolherem a forma de relações trabalhistas com os futuros servidores públicos. A decisão exige que as administrações públicas de todos os níveis adaptem suas práticas aos novos parâmetros de contratação, gerando alterações significativas nas relações de trabalho e nos direitos dos servidores públicos em todo o país.
Com isso, o setor público vai gerenciar mais de um regime, o que aumenta a complexidade da gestão de pessoas. O gestor público já atua com servidores estatutários trabalhando, por exemplo, ao lado de empregados de empresas terceirizadas ou de organizações sociais, ou seja, ele já lida com uma complexidade maior do que a do Regime Jurídico Único (RJU), apesar de poder contratar somente por meio do regime estatutário.
A decisão sobre o tema, de ampla repercussão, poderá impactar a gestão de pessoas no serviço público, envolvendo desde a estabilidade até o regime de contratação temporária.
Cabe destacar o que o atual presidente do STF, Luís Roberto Barroso, disse ao proferir seu voto. Ele criticou o RJU, argumentando que o modelo único já não atende adequadamente às demandas do serviço público moderno, manifestando apoio à flexibilização.
Essa decisão, que não tratou do mérito, mas da forma como a EC 19 foi aprovada, traz à tona o futuro do setor público, que já vem sendo preparado há anos, bastando lembrar que, em 2018, o próprio STF reconheceu a licitude da terceirização irrestrita, o que gerou formas de contratos diferenciadas.
Sob o manto da “modernização”, houve uma grande ofensiva contra o setor público, e não podemos deixar de incluir as reformas da previdência nesse contexto, que mudaram, na prática, as formas de relações de trabalho em todas as esferas do Estado brasileiro.
Essa decisão, que não atinge os atuais servidores públicos, servirá para que os gestores públicos possam introduzir mudanças profundas na esfera das relações de trabalho, e é preciso ficar muito atento ao impacto concernente aos direitos trabalhistas, assim como aos efeitos na prestação de serviços públicos à sociedade.
Natal, 7 de novembro de 2024
Wellington Duarte
Professor do Departamento de Economia da UFRN
Presidente do PROIFES-Federação
FONTE:
Nota: Decisão do STF sobre Regime Jurídico Único representa retrocesso para o setor público
08/11/2024
A decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade da Emenda Constitucional 19, de 1998, que desobriga os entes públicos a adotarem o Regime Jurídico Único (RJU) como forma de contratação de servidores públicos, encerra uma discussão iniciada em 2000, quando PT, PCdoB, PSB e PDT impetraram uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a forma como a emenda foi votada, tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado.
Embora os direitos dos atuais servidores públicos estejam preservados e não haja uma revogação do RJU, na prática, foram criadas as condições para que os entes federativos escolham a forma como estabelecerão futuras relações de trabalho com seus contratados.
O que chama a atenção é que essa decisão corrobora o processo de desmantelamento da estrutura do Setor Público, com impacto direto tanto na vida laboral dos servidores e servidoras públicas quanto na prestação de serviços à sociedade.
O PROIFES-Federação entende essa votação como uma derrota para o Setor Público de maneira geral e, de forma específica, como uma abertura para a fragilização das relações de trabalho na esfera pública, o que pode trazer consequências negativas para a prestação dos serviços públicos e fomentar a ampliação da privatização da esfera pública.
O PROIFES reforça que é fundamental que os movimentos sindicais redobrem seus esforços na defesa de um serviço público forte e que ofereça segurança jurídica a todos os seus trabalhadores. A defesa dos serviços públicos de qualidade e acessíveis à população deve ser priorizada, pois é um pilar essencial para garantir a justiça social e o desenvolvimento do país.
FONTE: