Região Sul: Habilidades limitadas

Região Sul: Habilidades limitadas

Habilidades limitadas: região Sul tem índice de 35% de analfabetismo funcional, maior do que a média nacional

Especialistas ressaltam a gravidade e os impactos individuais e sociais da falta de letramento de parte da população; entenda  

Sofia Lungui

Duda Fortes / Agencia RBS
Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) teve resultados divulgados nesta semana. Duda Fortes / Agencia RBS

 

 

Seis anos após o último levantamento, o analfabetismo funcional ainda é um problema grave no Brasil. No Sul, três em cada 10 habitantes com idades entre 15 e 64 anos não sabem ler e escrever, ou sabem muito pouco, sem  conseguir entender pequenas frases ou realizar operações matemáticas simples.

Conforme o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), na região Sul, 35% deste grupo etário são analfabetos funcionais. O índice superou a média do país, que atingiu 29%, mesmo percentual que o registrado em 2018. Os dados são referentes a 2024.   

Quando essas habilidades são limitadas, o indivíduo em vulnerabilidade social perpetua o ciclo intergeracional de pobreza.

PATRÍCIA CAMINI/ Professora da UFRGS

O trabalho não traz números por Estado, somente por região. O Sul fica atrás somente do Nordeste, que tem índice de 42%. Para a professora Patrícia Camini, da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), os dados têm impactos individuais e sociais

falta da alfabetização na idade adequada, até os sete anos, compromete o desenvolvimento do letramento e do numeramento, modificando o padrão de processamento de informações verbais e numéricas. Sem essa base, o indivíduo fica com a capacidade cognitiva prejudicada, com impactos por toda a vida, explica a professora: 

— Quando essas habilidades são limitadas, o indivíduo em vulnerabilidade social perpetua o ciclo intergeracional de pobreza: tem menos oportunidades no mercado de trabalho, não consegue auxiliar adequadamente nos estudos dos filhos, enfrenta dificuldades para cuidar da saúde de forma preventiva, devido à interpretação inadequada de informações — explica Patrícia. 

Também há efeitos negativos na trajetória profissional. No trabalho, o analfabetismo funcional aumenta a necessidade de retrabalho por erros de compreensão. Na democracia, torna as pessoas mais vulneráveis à desinformação, uma vez que o pensamento crítico é comprometido.

A professora Marta Nörnberg, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), entende que a gravidade do problema está ligada à redução de oportunidades ao longo da vida. O analfabetismo funcional acarreta em uma série de dificuldades nas mais diversas atividades cotidianas:

— Saber ler e analisar anúncios que são persuasivos, analisar propostas envolvendo venda de produtos, que geralmente contêm juros ou informações nem sempre explícitas, conseguir entender rótulos de produtos alimentícios ou medicamentosos, acessar e aplicar conhecimentos do campo das ciências e da cultura para transformar hábitos e práticas cotidianas, como saber selecionar entre usar um produto industrializado ou um produto natural ou orgânico. 

Níveis de alfabetização 

O Inaf classifica as pessoas conforme o nível de alfabetização com base em um teste aplicado a uma amostra representativa da população. A pesquisa contou com a participação de 2,5 mil pessoas de 15 a 64 anos, sendo que foram 371 na região Sul.  

Os níveis mais baixos, analfabeto e rudimentar, correspondem juntos ao analfabetismo funcional. No total, 30% dos habitantes do Sul foram classificados no grupo rudimentar, e 5% no grupo de analfabetos. Depois, vem o grupo elementar e os níveis mais elevados, que são o intermediário e o proficiente, compondo o consolidado. 

 

A pesquisa analisa as habilidades de alfabetização, letramento e numeramento na população, incluindo a capacidade de aplicar esses conhecimentos em situações em que são necessárias ferramentas digitais. Por exemplo, a realização de uma inscrição em um evento ou compra por aplicativo no celular.  

O levantamento também inclui a aplicação de testes cognitivos que avaliam a compreensão de textos verbais e numéricos. Para Patrícia, tratam-se de dados assertivos: 

— Essa metodologia produz dados muito mais precisos do que os do Censo e da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), que geram dados sobre a alfabetização da população com base em auto declaração dos participantes — explica.

Coordenado pela organização Ação Educativa e consultoria Conhecimento Social, o estudo é uma correalização da Fundação Itaú, em parceria com a Fundação Roberto Marinho, Instituto Unibanco, Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). 

Formação conectada com a realidade 

Para Patrícia Camini, combater o analfabetismo funcional envolve o aperfeiçoamento da formação de professores e das condições de trabalho dos docentes. Com diversos problemas, muitos professores se sentem despreparados e sobrecarregados para garantir a acessibilidade do ensino a todos, o que gera lacunas na aprendizagem.

As habilidades básicas de letramento e numeramento exigidas para a vida cidadã tornaram-se cada vez mais complexas, incluindo agora a capacidade de aplicá-las em ambientes digitais.

PATRÍCIA CAMINI/ Professora da UFRGS

— As habilidades básicas de letramento e numeramento exigidas para a vida cidadã tornaram-se cada vez mais complexas, incluindo agora a capacidade de aplicá-las em ambientes digitais. A formação de professores precisa atrair profissionais com alto nível de alfabetismo funcional, capazes de desenvolver estratégias eficazes para a progressão do aprendizado em contextos adversos e complexos — salienta Patrícia.

Na visão de Marta, a solução do problema do analfabetismo passa por diversas questões, como a necessidade de fomentar políticas públicas de apoio e investimento sistemático em espaços públicos de formação de pessoas leitoras, como bibliotecas e brinquedotecas, por exemplo. 

— No Rio Grande do Sul, os investimentos nessas políticas são totalmente insuficientes. Nas cidades de médio e grande porte, as escassas bibliotecas que existem são privadas ou localizadas nas regiões centrais — afirma a professora da UFPel. 

O teto de gastos com educação também é um empecilho. No âmbito micro, ela destaca que é fundamental assegurar boas condições de infraestrutura e de trabalho aos profissionais da educação, de modo a proporcionar projetos de alfabetização bem-sucedidos. 

 

FONTE:

https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao/educacao-basica/noticia/2025/05/habilidades-limitadas-regiao-sul-tem-indice-de-35-de-analfabetismo-funcional-maior-do-que-a-media-nacional-cmafq45xa01t9014u40d952tr.html 




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