Resultados da avaliação dos estudantes
“Alunos do 3º ano estão saindo com nível de matemática da 7ª série”, admite secretária da Educação do RS
Em fala a deputados estaduais, Raquel Teixeira apresentou os resultados da mais recente avaliação com estudantes da rede estadual
GABRIEL JACOBSEN
Raquel Teixeira se reuniu com deputados da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa
Cesar Bender / Agência ALRS
Muito assustador. Essa foi a expressão utilizada pela secretária estadual da Educação, Raquel Teixeira, para descrever o atual cenário de aprendizado de matemática no Ensino Médio na rede que ela comanda.
Raquel apresentou na Assembleia Legislativa, nesta terça-feira (28), os resultados da mais recente avaliação diagnóstica feita com alunos da rede pública estadual. Ao tratar dos indicadores de matemática, a secretária explicou que os níveis atuais de ensino na saída do Ensino Médio correspondem ao que os estudantes deveriam dominar na 6ª série do Ensino Fundamental.
– No (indicador do) 3º ano do Ensino Médio, você pode chorar dois dias sem parar, porque 92% dos alunos estão abaixo do básico. Isso significa que os alunos do 3º ano estão saindo (da escola) com nível de matemática da 6ª, 7ª série do Ensino Fundamental. Ou seja, raciocínio lógico, dedutivo, abstrato não existem. Esse é um quadro muito assustador — alertou Raquel.
Em março, a Secretaria Estadual de Educação (Seduc) realizou uma avaliação diagnóstica de Português e matemática que contou com a participação de 624 mil alunos de 2.147 escolas estaduais. Estudantes do 2º ao 9º ano do Ensino Fundamental e do 1º ao 3º ano do Ensino Médio responderam as questões.
Minoria tem resultado satisfatório
Os resultados dos testes mostraram que apenas a minoria dos estudantes tem resultados positivos (classificados nas categorias "adequado" ou "avançado").
A maioria dos alunos da rede estadual, tanto em Português quanto em matemática, foi classificada nos grupos de conhecimento "básico" (inferior ao mínimo necessário) ou "abaixo do básico" (nível considerado crítico).
— Quero fazer um esclarecimento. O nível mínimo é o nível adequado. Quando a gente fala em nível básico o aluno já está com um ano de defasagem em relação ao adequado. O nível que serve de referência para nós é o adequado — detalhou a secretária.
Veja abaixo os resultados de matemática da avaliação da Seduc
A apresentação dos dados ocorreu durante sessão da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa. Durante a reunião, a secretária elencou os programas que são realizados para melhorar os indicadores:
— Os caminhos que estão sendo trilhados para essa recuperação vão desde o aumento da carga horária de Português e matemática, mais o programa Escolha Certa, a Bolsa de Permanência.
Atualmente, a rede estadual de ensino conta com 33,6 mil contratos de servidores efetivos e 24 mil contratos de servidores temporários. Conforme a Seduc, o próximo concurso terá edital lançado em julho e será realizado em outubro.
Nos próximos dias, a secretária prometeu retornar à Comissão de Educação da Assembleia para seguir o diálogo iniciado nesta terça com os parlamentares.
Melhora no desempenho em matemática levará até três anos, projeta secretária de Educação do RS
De acordo com Raquel Teixeira, os índices foram acentuados com a pandemia e o ensino remoto, mas já não eram positivos em 2019
Secretária de Educação do RS, Raquel Teixeira Gustavo Mansur / Palácio Piratini, Divulgação
A preocupante constatação de que apenas 1% dos alunos do último ano do Ensino Médio têm desempenho adequado em matemática chama a atenção para a distância entre a realidade do ensino gaúcho com as metas desejadas para a área. Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade desta sexta-feira (13), após a publicação após a reportagem publicada em GZH sobre o tema, a secretária de Educação do Rio Grande do Sul, Raquel Teixeira, afirmou que até três anos serão necessários para alcançar a melhora desejada no desempenho adequado da disciplina.
De acordo com a secretária, os índices foram acentuados com a pandemia e o ensino remoto, mas já não eram positivos antes mesmo da crise sanitária que obrigou o fechamento de escolas. No Rio Grande do Sul, as aulas presenciais na rede estadual só foram retomadas no segundo semestre de 2021, um ano e meio após terem sido suspensas.
— É bom lembrar que antes da pandemia era 10%, já não era bom. [...] Esses 10% de alunos, antes da pandemia, quando você faz o recorte por raça, por exemplo, 18% por cento dos brancos tinham nível adequado de matemática na rede pública, e 5% dos negros. Então dava a média de 10%, mas os dados já eram marcados por forte desigualdade econômica e racial. E a pandemia, claro, acentuou isso porque exatamente as camadas mais vulneráveis não tinham os equipamentos adequados para acompanhar (as aulas).
Para traçar um plano de como melhorar o ensino gaúcho, a Seduc promoveu o Avaliar É Tri, uma avaliação diagnóstica em que foram aplicados questionários de Língua Portuguesa e Matemática para os alunos do 2º ao 9º ano do Ensino Fundamental e do 1° ao 3° do Ensino Médio – 624 mil estudantes de 2.147 escolas estaduais participaram. Na avaliação, a partir das pontuações nos questionários, os alunos foram classificados nos níveis "avançado", "adequado", "básico" e "abaixo do básico".
Para melhorar os índices
Na entrevista, a secretária destacou que, para tentar cumprir o objetivo de alcançar a meta almejada, algumas iniciativas já são executadas pelo Estado. Entre elas, o "Escolha Certa", um projeto de ensino complementar destinado a alunos que concluíram o Ensino Médio em 2020 e em 2021, focado na transição para a universidade ou mercado de trabalho.
— O Escolha Certa é um pacote com robustez de língua portuguesa, matemática, língua inglesa, cultura digital, computação e informática, projeto de vida e o pré-ENEM. [...] Ele vai funcionar experimentalmente, até porque a gente não sabe como é que que vai ser a própria adesão. Nós criamos 32 polos distribuídos pelo Estado e ele vai ser híbrido, vai ter aulas remotas e aulas presenciais. Todos os polos terão estagiários permanentes, são os professores do Conselho das Universidades Comunitárias que vão atuar. Então eu acho que aí estava a primeira resposta para um problema muito sério.
A partir da avaliação diagnóstica, que visou mapear as lacunas de aprendizagem, foram elaborados materiais didáticos específicos para essas falhas no ensino. Também houve aumento na carga horária em duas horas semanais nas aulas de língua portuguesa e três horas semanais nas aulas de matemática.
Segundo Raquel Teixeira, o Estado dará início também à ampliação do ensino em tempo integral, especialmente no Ensino Médio. Atualmente, o Rio Grande do Sul tem os piores índices em termo de oferta deste tipo de ensino — no Ensino Médio, somente 1% das matrículas são em escola em tempo integral, segundo a secretária.
— Ensino Médio que é a grande demanda pra ensino integral, quando o impacto é maior, pela formação profissional, pelo tempo de trabalho, pela iniciação científica, pelo desenvolvimento do projeto de vida, pelo protagonismo que desenvolve. É 1% aqui no Rio Grande do Sul. Então é o pior índice, se você olhar a lista, nós estamos lá no 27º lugar, e é uma pena. Esse é um esforço que a sociedade gaúcha vai ter que fazer daqui pra frente.
Ouça a entrevista
Apenas 1% dos alunos do último ano do Ensino Médio têm desempenho adequado em matemática, aponta avaliação da Seduc
Dificuldades na aprendizagem da disciplina são enfrentadas há anos, mas foram intensificadas com ensino remoto
13/05/2022
Dados mostram que as dificuldades na matemática aumentam conforme o avanço da trajetória escolar do estudante Mateus Bruxel / Agencia RBS
Somente 1% dos estudantes matriculados no último ano do Ensino Médio em escolas estaduais do Rio Grande do Sul apresentam desempenho adequado em matemática, conforme dados divulgados pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc) no início deste mês. A grande maioria desses alunos (92%) teve atuação abaixo do básico, enquanto 4% atingiram o nível básico e, 2%, o avançado. Os números são resultado da primeira edição de 2022 do Avaliar é Tri — uma avaliação diagnóstica promovida pela pasta desde o ano passado para analisar as perdas de aprendizagem entre os estudantes gaúchos durante a pandemia e as competências pedagógicas que precisam ser reforçadas.
Entre os dias 11 e 15 de março deste ano, 624 mil alunos de 2.147 escolas estaduais participaram da prova. Estudantes do 2º ao 9º ano do Ensino Fundamental e do 1º ao 3º ano do Ensino Médio responderam questões de português e de matemática.
Dificuldade é maior no Ensino Médio
Os resultados mostram que as dificuldades na matemática aumentam conforme o avanço da trajetória escolar. No 2º ano do Ensino Fundamental, por exemplo, somente 11% dos alunos apresentaram desempenho abaixo do básico. Já no 3º e no 4º ano, esse número salta para 32% e 49%, respectivamente. Na reta final do Ensino Fundamental, 8º e 9º anos, o grupo já representa a maioria: 71% e 80%.
Em língua portuguesa, os dados também são preocupantes, já que apenas 6% dos alunos de cada série do Ensino Médio apresentam desempenho adequado. Ainda assim, a porcentagem de estudantes com atuação abaixo do básico é menor quando comparada aos resultados na matemática: 57% no 1º ano e 62% nas séries seguintes.
Aulas remotas como obstáculo
Questionada pela reportagem, a Seduc afirmou, em nota, que o impacto ocasionado pela pandemia de covid-19, com um longo período sem aulas presenciais, contribuiu para acentuação do baixo desempenho dos alunos do Ensino Médio em matemática. Neste cenário, a pasta lançou o Avaliar é Tri e, a partir dos resultados da primeira edição, implementou o Aprende Mais, um programa de recuperação e aceleração da aprendizagem. Com ele, a carga horária de matemática foi ampliada em três horas semanais e, a de língua portuguesa, em duas horas semanais. Além disso, segundo a Seduc, “os educadores foram orientados sobre como trabalhar com os resultados da avaliação diagnóstica de modo a potencializar a recuperação das fragilidades identificadas nos estudantes”.
O texto da pasta também destacou que, para garantir a permanência dos estudantes em sala de aula, evitar a evasão escolar e recuperar as perdas de aprendizagem causadas pela pandemia, tem realizado, desde 2021, uma série de medidas para qualificar a oferta de ensino público gaúcho de forma mais inclusiva e equitativa e capacitar os profissionais envolvidos.
Entre as iniciativas citadas, estão a bolsa Todo Jovem na Escola (auxílio de R$ 150 mensais a alunos creditado no cartão Cidadão), o Programa Merenda Melhor (aumenta em 166% o repasse da alimentação escolar e garante a oferta de refeições quentes todos os dias da semana) e o Livre para Aprender (repasse de recursos para compra de absorventes higiênicos pelas escolas).
Durante seis dias, GZH buscou a Seduc para uma entrevista com a secretária Raquel Teixeira, mas sem sucesso. Na manhã desta sexta-feira, quando a reportagem já estava publicada, a secretária falou ao programa Gaúcha Atualidade e destacou as ações que o Estado tem desempenhado para reverter a situação. Raquel afirmou ainda que serão necessários ao menos três anos para que os índices melhorem no Ensino Médio.
— O Escolha Certa é um pacote com robustez de língua portuguesa, matemática, língua inglesa, cultura digital, computação e informática, projeto de vida e o pré-ENEM. [...] Ele vai funcionar experimentalmente, até porque a gente não sabe como é que que vai ser a própria adesão. Nós criamos 32 polos distribuídos pelo Estado e ele vai ser híbrido, vai ter aulas remotas e aulas presenciais. Todos os polos terão estagiários permanentes, são os professores do Conselho das Universidades Comunitárias que vão atuar. Então eu acho que aí estava a primeira resposta para um problema muito sério.
Problema histórico
Apesar da avaliação do governo do Estado ter como foco os impactos da pandemia na educação, os problemas na aprendizagem da matemática são enfrentados há muitos anos por escolas de todo o Brasil. A última edição do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), realizada em 2019, mostra que apenas 10,3% dos estudantes brasileiros matriculados no Ensino Médio tiveram aprendizagem adequada na disciplina, somando rede pública e privada. Entretanto, na pública, essa porcentagem baixa para 5,2%, enquanto na privada aumenta de forma expressiva para 41,3%.
— Os desafios na aprendizagem da matemática no Brasil foram aprofundados pela pandemia, mas já tínhamos problemas muito grandes no desempenho dos estudantes. Esses problemas começam logo no início da trajetória escolar, nos primeiros anos do Ensino Fundamental, continuam e se aprofundam conforme os alunos vão passando de série, chegando ao Ensino Médio com indicadores muito críticos — ressalta Gabriel Corrêa, líder de políticas educacionais do Todos pela Educação.
A dificuldade histórica é consequência de uma conjunção de fatores, aponta Corrêa. Entre eles, a falta de apoio da gestão pública ao trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas, a formação oferecida aos professores e o suporte dado às instituições para o ensino da matemática — incluindo materiais e condições estruturais disponibilizadas.
Se nada for feito, isso pode prejudicar toda a trajetória escolar e de vida dessas crianças e jovens
GABRIEL CORRÊA/Líder de políticas educacionais do Todos pela Educação
De acordo com o representante do Todos pela Educação, as escolas brasileiras estavam apresentando avanços, especialmente no Ensino Fundamental, antes da pandemia. Mesmo assim, os níveis ainda eram críticos. Com a adoção de um ensino remoto frágil, muitos estudantes ficaram quase dois anos sem evoluir na aprendizagem da matemática. Agora, os níveis estão bem abaixo do que seria esperado para a idade de cada aluno:
— O ensino remoto poderia minimizar as perdas na aprendizagem se fosse adotado com melhor qualidade. Mas muitos estudantes sequer tiveram a oportunidade de aprender, e muitos professores ficaram sem nenhum apoio durante a pandemia. O resultado que temos visto foi uma queda muito grande na aprendizagem dos estudantes e, se nada for feito, isso pode prejudicar toda a trajetória escolar e de vida dessas crianças e jovens.
Rede privada
Ainda conforme os dados do Saeb, no Rio Grande do Sul, 13,5% dos alunos do Ensino Médio, considerando rede pública e privada, apresentaram desempenho adequado em matemática em 2019, índice um pouco acima do nacional, mas abaixo do que foi obtido em 2007 — 14,3%. No ensino privado, a taxa aprendizagem ficou em 45,9%, enquanto na pública foi de 7,5%.
O presidente do Sindicato do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinepe), Bruno Eizerik, afirma que a entidade fica preocupada com esses dados e que o número nacional demonstra a falta de políticas públicas voltadas à educação. Ele destaca que, na rede privada, quase 50% dos estudantes tiveram aprendizagem adequada em matemática, mas entende que todos os alunos deveriam ser proficientes na disciplina.
— Estamos extremamente preocupados com o Brasil, com o Rio Grande do Sul e com a rede privada também. Não podemos comemorar um resultado muito superior à rede pública, quando o nosso resultado também não é satisfatório. A diferença é grande, mas isso não diminui o problema — comenta Eizerik, ressaltando que, enquanto não houver ações efetivas de Estado, as dificuldades tendem a permanecer.
Medidas para reverter o cenário
Gabriel Corrêa destaca que o principal desafio é combater a evasão escolar, um problema antigo e que piorou após o fechamento prolongado das escolas. Também será preciso cuidar da saúde mental dos estudantes e professores, além de recuperar o que foi perdido. Portanto, é necessário diagnosticar as dificuldades de cada estudante para estruturar programas de reforço e recuperação, que devem atender turmas menores e agrupadas com alunos no mesmo nível de aprendizado.
Apoio e formação para que os professores possam atuar neste novo contexto e avaliações frequentes para identificar se os estudantes estão avançando são medidas importantes no desenvolvimento desses programas. Além disso, é fundamental investir na elevação da carga horária nas instituições de ensino para que cada aluno tenha seu direito de aprender garantido.
— Parte do trabalho das escolas será ensinar no Ensino Médio as competências e habilidades de matemática que os alunos deveriam ter desenvolvido no Ensino Fundamental. Se isso não for feito, esses estudantes serão muito prejudicados e terão suas chances de acesso ao Ensino Superior reduzidas — alerta o líder de políticas educacionais.