O bode da sala
A RETIRADA DO BODE DA SALA É NOSSA PRIORIDADE MÁXIMA. TEMOS DE SOMAR FORÇAS, EM VEZ DE REAVIVAR RANCORES!
Se não fui o primeiro, certamente estava entre os primeiros articulistas de esquerda a advertir contra o perigo Bolsonaro em 2018. Passei o ano inteiro apontando-o como o único dos presidenciáveis com chances de vitória cujo triunfo deveríamos evitar a todo custo.
O motivo? É que desde o início ele me pareceu o cavalo de Tróia ideal para a extrema-direita vencer o pleito (eu levava em conta as lições que a esquerda deveria ter extraído da vitória de Fernando Collor em 1989, mas ela parece ter desaprendido de pensar...), capaz de causar muito estrago se eleito.
Ou seja, seus dons histriônicos e a possibilidade de, devido à sua insignificância até então, passar-se por uma alternativa ao status quo (embora nem de longe o fosse) atrairiam eleitores desencantados com o colapso do stablishment após o impeachment da Dilma e a tentativa destrambelhada de impedimento do Michel Temer a partir de uma tramoia saco-de-gatos (Organizações Globo + Operação Lava-Jato + Joesley Batista + o parlapatão Rodrigo Janot).
Não deu outra. O falso cruzado contra a corrupção e defensor fake do liberalismo econômico repetiu a proeza do caçador de marajás fajuto.
Mesmo assim, jamais temi Jair Bolsonaro, em si, como o possível instaurador de uma nova ditadura de 21 anos. Medíocre demais. Insano demais. Frouxo demais (um gatinho imitando rugidos de leão).
Mas, rodeado pelos pimpolhos de sua familícia e por outros prosélitos de Steve Bannon e Olavo de Carvalho, ele poderia provocar tamanho pandemônio que propiciasse a tomada de poder pelos militares, os quais (como qualquer observador que tenha um mínimo de familiaridade com a cultura da caserna sabe) empossariam um general e botariam para escanteio o capitão da reserva maluco que, na ativa, não passara de um tenente terrorista.
Realmente, golpe não houve nem haverá: qualquer possibilidade neste sentido foi definitivamente sepultada pela troca de guarda na presidência dos EUA.
O completo e genocida fracasso do Bozo na administração da nossa pior crise sanitária em mais de um século, seu reingresso no centrão como tábula de salvação para evitar o impeachment (evidenciando quão mentirosas eram suas promessas de combater a corrupção) e sua política econômica errática e desastrosa são mais do que suficientes para os militares perceberem entrarão numa roubada se assumirem o papel de síndicos de um Brasil falido.
O perigo agora é outro: enquanto o palhaço sinistro carregar a faixa presidencial, a depressão econômica só vai acentuar-se cada vez mais.
Isto porque, em tempos de vacas magras, um Brasil que o Capitão Pinel tornou pária da humanidade não contará com a ajuda de nenhum país importante para sair do buraco sem fundo no qual se enfiou. Nem será capaz de fazê-lo sozinho, sob um governo tão desmoralizado.
Então, o que temos desesperadamente de evitar é que a penúria devastadora imposta aos nossos coitadezas gere uma explosão social de consequências imprevisíveis, que poderá colocar o Brasil definitivamente no caminho do caos e da entropia.
O único caminho que vejo para desarmarmos tal bomba-relógio é o rápido afastamento do Bozo e a estruturação de um governo de salvação nacional, que imponha pelo menos uma trégua à polarização suicida, somando os esforços de todos que ainda tentam evitar o pior.
E, sendo a retirada do bode da sala a prioridade absoluta neste momento, não faz sentido nenhum hostilizarmos quem quer que se disponha a contribuir com ela.
Chega desses mesquinhos cálculos de vantagens futuras, com as mágoas por comportamentos passados sendo reavivadas apenas para afastar concorrentes!
Que se pense na divisão do poder e de suas boquinhas só depois que o palhaço sinistro tiver sido expelido. Agora, o tempo em que ele permanecer no Palácio do Planalto está sendo contado em vidas.
Nada de hostilizarmos possíveis aliados! Devemos, isto sim, somar forças com eles para que nossas manifestações sejam impactantes ao máximo, agilizando a salvação do Brasil e dos brasileiros.
Aos 17 anos, já fiquei enojado ao ver, num ato público contra a ditadura militar em 1968, o Zé Dirceu discursando para uma parcela dos participantes num canto do Largo São Francisco e a Catarina Meloni fazendo o mesmo no canto diametralmente oposto. Cada um deles se considerava o(a) presidente da verdadeira União Estadual dos Estudantes e ambos pareciam estar confusos quanto a qual era o verdadeiro inimigo.
Será que, mais de meio século depois, nada foi aprendido e tudo foi esquecido? (por Celso Lungaretti)
PUNINDO SEUS GRAVÍSSIMOS CRIMES!
Ricardo Kotscho
NEM GOLPE NEM IMPEACHMENT:
ACORDÃO DEIXA BOLSONARO SOLTO
"O Brasil virou uma outra coisa que ninguém sabe bem o que é" (Washington Olivetto, autoexilado em Londres)
O medo dele era ser preso, mas Bolsonaro e seus generais ficam onde estão, garante o grande acordão costurado entre os Poderes, sob as bênçãos de Michel Temer, o golpista que virou pacificador. A Faria Lima respira aliviada.
Este é o trágico resumo da Semana da Pátria.
Na ponta do lápis, ainda faltam 474 dias para essa agonia acabar, com a posse de um outro presidente, qualquer um, se deixarem ter eleições e respeitarem o resultado.
Depois do fracasso do autogolpe e da carta de rendição ao Judiciário assinada por Jair Bolsonaro, não se fala mais em impeachment nem em qualquer punição pelos crimes em série cometidos pelo capitão no levante do 7 de setembro.
"Perdoá-lo seria como soltar o curandeiro João de Deus se ele pedisse desculpas às dezenas de mulheres que violentou", escreve hoje Ascânio Seleme em sua coluna no Globo.
Mas o ministro Gilmar Mendes, do STF, acha que "é preciso acreditar na boa fé de Bolsonaro". Quem, em sã consciência, ainda pode acreditar nisso? Parece brincadeira...
Deixamos de ser uma democracia no golpe de 2016 e ainda não somos uma ditadura.
Aquele Brasil que o amigo Washington Olivetto, em boa hora, deixou para trás, não existe mais. Não somos mais nada aos olhos do mundo.
É tudo tão desalentador que os mesmos grupos responsáveis pela chegada de Bolsonaro ao poder vão protestar contra ele na avenida Paulista, neste domingo 12, num comício da patética terceira via, que busca desesperadamente um candidato.
Se depender deles, o presidente pode dormir tranquilo, depois de dias de insônia.
O fato é que hoje não temos nem governo nem oposição, nenhum projeto de país, qualquer esperança de que as coisas possam mudar tão cedo. Vamos nos arrastando, apenas tentando sobreviver, um dia de cada vez.
Resta apenas o vazio e a lembrança das quase 600 mil vítimas desta insanidade; da destruição da Amazônia; da educação e da cultura, entregues a um bando de bárbaros saqueadores, cafajestes que declararam guerra ao próprio país, onde o presidente faz acordos até com um tal de Zé Trovão, homiziado no México, para segurar-se na cadeira e não ser atropelado pelos caminhoneiros.
Aonde foi parar o Brasil feliz e confiante que existia aqui, admirado pelo mundo, não faz muito tempo, onde não se vivia sobressaltado com o medo do amanhã, como nos tempos da ditadura militar, tão exaltada pelos atuais ocupantes do poder?
O que fizemos do nosso país? Até quando vamos aguentar tanta humilhação?
A semana que termina apenas aumentou a incerteza sobre o nosso futuro.
Qual Brasil sobreviverá até as próximas eleições?
Quanto tempo levará para reconstruir o país?
Não dá para ficar batendo palmas para ver louco dançar à beira do abismo e achar que tudo isso é normal.
Perdão pelo desabafo, mas também não dá pra ficar com o grito preso na garganta.
Bom fim de semana.
Vida que segue. (por Ricardo Kotscho)
Toque do editor – Incomoda-me ver um bom homem e uma lenda viva do jornalismo brasileiro tão desconsolado. Mas, como convencê-lo de que os acontecimentos históricos não são determinados apenas pelo que está à vista de todos, como o blefe ridículo e o recuo vergonhoso do Bozo na sua palhaçada de Dia da Pátria?
Nunca se sabe o exato momento em que os cidadãos não aguentarão mais as condições subumanas de vida que lhes estão sendo impostas e explodirão em revolta, como as que pipocaram por tantos países no final da década passada.
O certo é que o Brasil está cada vez mais perto de um desses momentos, pois há gente demais sofrendo demais com a depressão econômica que eterniza-se sem perspectiva nenhuma de melhora sob o genocida louco.
Não precisa ficar contando os dias que faltam até 1º de janeiro de 2023, meu caro Kotscho. O desfecho do drama virá muito antes, apesar da tibieza e pusilanimidade dos atores políticos e empresariais que preferem esticar o elástico ao máximo antes de agir.
Acabarão sendo obrigados a fazê-lo no sufoco, quando se virem ameaçados de perder não só os os anéis, mas também os dedos e todo o resto. E ainda ficarão com as caras marcadas pelo estouro dos elásticos... (por Celso Lungaretti)