Sindicato denuncia ataque à educação
Sindicato dos professores de SP denuncia ataque à educação após afastamento de 30 diretores
Secretaria de Educação justifica afastamento por desempenho abaixo da média; SINESP afirma que medida é ilegal, fere a gestão democrática e abre caminho para privatização das escolas
25/05/2025

Por Laura Kotscho
O afastamento de 30 diretores da rede municipal de São Paulo por suposto baixo desempenho no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), ocorrido nesta quinta-feira (22), acendeu o alerta entre educadores. Para o Sindicato dos Especialistas de Educação do Ensino Público Municipal de São Paulo (SINESP), a medida representa um “ataque sem precedentes à gestão democrática das escolas” e está inserida em um plano mais amplo da Prefeitura para privatizar a gestão educacional.
“A Prefeitura já tem um projeto para tentar terceirizar ou até privatizar as escolas públicas. E o SINESP já vinha denunciando, inclusive em Brasília, para tentar barrar esses ataques”, afirma Douglas Eduardo Rosa, diretor do Sindicato.
Segundo Douglas, a ação foi tomada sem qualquer diálogo prévio com os profissionais afetados ou com a comunidade escolar. Os gestores foram convocados pelas Diretorias Regionais de Educação (DREs) e informados de que seriam afastados para participar de uma “formação”, enquanto novos responsáveis seriam indicados para o cargo.
Críticas aos critérios de afastamento
De acordo com o SINESP, a troca de diretores foi feita sem qualquer critério técnico transparente ou participação da categoria. O sindicato classifica os novos responsáveis como “interventores” e denuncia que o processo tem sido conduzido de forma autoritária.
“Estão desrespeitando os conselhos escolares, que são compostos por representantes da comunidade. Isso é um desmonte da gestão democrática”, critica Douglas. Ele aponta que a justificativa utilizada pela Secretaria de Educação vai além dos índices do IDEB. “Além das notas, das avaliações externas, estão considerando se o diretor ficou muito tempo na escola ou se tirou poucas licenças médicas”, diz.
Para ele, o uso do IDEB como justificativa é inadequado: “Não faz o menor sentido afastar o diretor só porque a escola não teve avanço na média do IDEB. O IDEB não é para fazer ranking, ele foi criado para fortalecer as políticas públicas de educação básica. Dependendo da situação da escola, um décimo ou dois de crescimento já é um avanço significativo”.

Professores da rede pública denunciam plano do prefeito Ricardo Nunes para tercerizar e privatizar as escolas municipais de São Paulo (Foto: Rovena Rosa / Agência Brasil)
O clima nas escolas é de insegurança e indignação. “Está um clima tenso, de tristeza também, claro, porque estão sendo muito desrespeitados”, lamenta o sindicalista. Ele alerta ainda para os riscos pedagógicos: “Corre o risco de voltarmos a uma educação bancária, como dizia Paulo Freire, que tem como objetivo apenas a classificação. Isso a educação não pode ter.”
O SINESP atribui os afastamentos à Lei Municipal nº 18.221, sancionada no fim de 2024, que permite a avaliação de diretores escolares com base em indicadores como o IDEB, sem considerar as desigualdades sociais e regionais. A lei foi aprovada sem debate com a categoria. “Foi uma lei aprovada na calada da madrugada, sem discussão com os servidores públicos municipais. Essa é a base para essa medida arbitrária”, o diretor. “Coincidentemente ou não, logo após as eleições, o prefeito já falava publicamente sobre escolas com notas baixas no IDEB. A gente já enxergava o caminho que estavam traçando”, completa Douglas.
Histórico de terceirizações
O diretor sindical ressalta que a terceirização já é uma realidade nas escolas municipais em setores como limpeza e alimentação, e, agora, o mesmo modelo estaria sendo direcionado para a gestão pedagógica.
Além disso, o afastamento dos diretores representa, na visão do sindicato, uma ameaça concreta à estabilidade dos servidores concursados. “ Muitos gestores estão com medo de perder seus cargos, suas escolas. Temos vários diretores com mais de 10 ou até 20 anos na mesma escola. Não faz sentido afastar um profissional com tanta história e colocar no lugar alguém que não conhece a realidade daquela comunidade.É uma forma de precarizar a carreira pública. Quando atacam o diretor, atacam toda a escola e, principalmente, o estudante”, critica Douglas.
Resposta do sindicato
Diante do cenário, o SINESP que está oferecendo apoio jurídico e emocional aos diretores afetados. A entidade já havia ingressado com ação na Justiça contra a Lei nº 18.221, e agora também articula uma frente política com outras entidades da educação para barrar o que considera “um projeto de desmonte da escola pública”.
“Já tivemos vitórias na Justiça em outras frentes, como quando tentaram cortar 33% do salário de alguns gestores. Vamos lutar até o fim”, diz.
O que diz a Prefeitura
Leia a íntegra da nota:
A Secretaria Municipal de Educação (SME) informa que 25 diretores de escolas municipais em tempo integral serão convocados para participar, entre maio e dezembro, de uma requalificação intensiva do Programa Juntos pela Aprendizagem.
Esses profissionais atuam há, pelo menos, 4 anos em unidades prioritárias, selecionadas devido ao desempenho obtido no Ideb e Idep de 2023.
A capacitação, inédita, inclui vivência em outras unidades educacionais e tem como objetivo o aprimoramento da gestão pedagógica para melhorar a aprendizagem de todos os estudantes.
FONTE:
Comunidade escolar se manifesta contra decisão de Ricardo Nunes que afasta diretores de escolas de SP
Nesta segunda, ao menos dois atos foram registrados na capital paulista; medida atinge 25 profissionais

Manifestantes se reuniram na manhã desta segunda (26) em protesto contra o afastamento do diretor do Espaço de Bitita, no bairro Canindé, em São Paulo - Caroline Oliveira / Brasil de Fato
A comunidade da Escola Municipal de Ensino Fundamental Espaço de Bitita, no bairro Canindé, na zona norte de São Paulo, realizou uma manifestação na manhã desta segunda-feira (26), contra o afastamento do diretor da unidade, Cláudio Marques.
Ele é um dos diretores da rede municipal que serão afastados para participarem, até o final do ano, de um curso de formação. A justificativa apresentada pela gestão Nunes é a de oferecer formação para que os servidores retornem para as suas unidades e promovam um trabalho pedagógico que resulte em melhorias.
O afastamento atinge 25 diretores da rede municipal e considera o desempenho obtido no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e no Índice de Desenvolvimento da Educação Paulistana (Idep) 2023. A medida é classificada por parlamentares da oposição e membros da comunidade escolar como “ilegal e arbitrária”.
Uma mobilização em apoio aos profissionais também foi registrada na Escola Municipal de Ensino Fundamental Vinícius de Moraes, no Jardim Tietê, na zona leste da capital. A entrada do prédio foi bloqueada pelos manifestantes.
de Moraes, no Jardim Tietê | Divulgação
A deputada federal Luciene Cavalcante (Psol-SP), que esteve na manifestação no Espaço Bitita, afirmou que a gestão de Ricardo Nunes (MDB) está usando de uma convocação para afastar os diretores, o que só pode ser feito por meio de um processo administrativo com os devidos ritos legais.
“É muito violento e criminoso o que o Ricardo Nunes está fazendo com a educação pública aqui da cidade de São Paulo e o Espaço de Bitita. Não tem legalidade para se colocar o interventor aqui dentro. Ele [Ricardo Nunes] só pode afastar depois de um processo administrativo com amplo direito de defesa”, defende a deputada.
“Ele chama isso de convocação para o curso de informação que vai durar nove horas por dia até o final do ano. Ele usa esse dispositivo de convocação, que é para formação, mas é um afastamento”, diz.
Diretores ouvidos pelo Brasil de Fato e o Sindicato dos Especialistas de Educação do Ensino Público Municipal de São Paulo (Sinesp), no entanto, afirmam que a justificativa para o afastamento “não se sustenta”, uma vez que as escolas escolhidas têm projetos pedagógicos com resultados positivos e que os índices escolhidos não refletem o avanço das unidades no médio e longo prazo.
A Escola Espaço de Bitita tem em seu currículo os prêmios Heitor Villa-Lobos, Territórios Tomie Ohtake, Paulo Freire e Criativos da Escola. A instituição também é parte do Programa das Escolas Associadas da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco, na sigla em inglês).
De acordo com o diretor da escola, Cláudio Marques, 40% dos alunos são imigrantes. Ele é mestre e doutor em Educação e tem pós-doutorado pela Universidade de São Paulo (USP). Ele dirige o espaço desde 2011.