Sofrimento psíquico na escola
Mal-estar e sofrimento psíquico na escola e na universidade: impasses do saber e de sua transmissão
As tentativas de suicídio e as mortes autoprovocadas por jovens apresentam-se como um problema clínico-político da atualidade
Coluna da Appoa 23 de setembro de 2025
Por Larissa Costa Beber Scherer, Rose Gurski e Gerson Pinho (*)
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
A violência nas escolas tem assumido uma amplitude alarmante no Rio Grande do Sul. Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP-RS), só no primeiro semestre de 2025, foram registrados 1.500 casos de ameaças e agressões no ambiente escolar. Somente em Porto Alegre, tivemos 256 registros no período. Uma escola pública da Vila Cruzeiro fechou os portões por não ter possibilidade de garantir a segurança de professores e funcionários, visto as violências e ameaças que sofrem. A presença destas condições nas instituições educacionais produz efeitos de sofrimento, potencializando o mal-estar dos educadores e provocando sentimento de impotência e desistência das trajetórias docentes.
Ora, além das problemáticas que assolam os educadores, o intenso sofrimento que acomete adolescentes escolares e jovens universitários tem sido uma questão não só para as instituições educacionais, mas para o Estado e a sociedade como um todo. As estatísticas do IBGE, em 2023, apresentaram índices expressivos de abandono escolar na faixa etária acima dos 15 anos de idade. Os resultados da última Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PENSE), realizada com adolescentes do ensino fundamental, apontam também que 21,4% dos alunos entrevistados afirmaram sentir que a vida não vale a pena. Nesse cenário, as tentativas de suicídio e as mortes autoprovocadas por jovens apresentam-se como um problema clínico-político da atualidade, sendo a segunda causa de morte na faixa etária entre 15 e 29 anos (WHO, 2019).
Precisamos escutar de forma mais cuidadosa as condições do laço social e educativo atual e seus efeitos para a saúde mental de educadores, adolescentes e jovens. Saúde mental e mal-estar são temáticas profundamente articuladas que repercutem nos índices de evasão e permanência de estudantes e universitários de forma geral. Nesse sentido, importa destacar como as reflexões psicanalíticas em diálogo com a educação podem ajudar a pensar as problemáticas atuais no campo educacional.
Sabemos, desde Freud, que o mal-estar é uma condição inerente ao pertencimento do sujeito à cultura, isto porque a própria liberdade individual é condicionada às normas e leis inscritas no laço social. Identificamos também o quanto a fonte de sofrimento decorre das relações entre os sujeitos, aspecto do mal-estar bastante frequente nas instituições educacionais – um lugar de (des)encontros. Quando escutamos educadores, testemunhamos que o mal-estar pode assumir distintos contornos, tais como o sofrimento e a impotência.
A incidência atual do sofrimento psíquico, as tentativas de suicídio e o suicídio consumado que acomete população juvenil vêm mobilizando pesquisadores do campo da psicanálise e educação. As inquietações compartilhadas acerca da ausência de perspectivas de futuro na vida dos jovens, especialmente, nas universidades públicas, impulsionou, entre outras ações, a construção da Pesquisa “Psicanálise e saúde mental na Universidade: políticas de vida, escuta e sobrevivência psíquica em tempos sombrios” – projeto multicêntrico que reúne diversas universidades públicas no Brasil, na Argentina e na França. O projeto investiga o modo como o mal-estar e o sofrimento se apresentam nas universidades públicas brasileiras. Temos compreendido que uma das possíveis condições deste agravamento entre jovens universitários está relacionada às vulnerabilidades experimentadas pela população de estudantes que ingressam através de políticas de ações afirmativas. Ao mesmo tempo que essas políticas trazem uma maior diversidade racial, social e de gênero para dentro das instituições públicas, incluem grupos mais suscetíveis aos efeitos das desigualdades que já eram vividos fora da Universidade.
Diante de um cenário que aponta para uma espécie de lento cancelamento do futuro e de intensa ausência de perspectivas, tanto por parte dos estudantes como dos educadores, importa interrogarmos o lugar da educação no contexto social atual, buscando compreender os desdobramentos sobre a transmissão de saberes e a aposta em um futuro comum.
Essas problematizações serão debatidas na IV Jornada do NUPPEC – Núcleo de Psicanálise, Educação e Cultura UFRGS que vem coroar um tempo de produções e parcerias do Núcleo acerca do tema do mal-estar na educação. Uma ação que ocorre a partir dos compartilhamentos entre o PPG Psicanálise: clínica e cultura UFRGS, a FACED UFRGS e o PPG Psicologia da UFSM. O Evento acontecerá no dia 3 de outubro de 2025 no auditório do ICBS/UFRGS e contará com palestrantes de diferentes instituições locais e nacionais. A ação também reúne o apoio do Núcleo Compartilha (PPG Psicologia/ UFSM), LEPSI-MG, LAPSE-UFF, Diretoria de Ações Comunitárias da Sociedade de Psicanálise de Porto Alegre (SPPA) e Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA) – Instituto APPOA.
Local: Instituto de Ciências Básicas de Saúde – ICBS Prédio 21116 – Rua Ramiro Barcelos, 2600 – Auditório – sala 408
Data: 03 de Outubro de 2025
Horário: 8h30-12h e 14h-18h30
(*) Larissa Costa Beber Scherer é membro da APPOA e Instituto APPOA, doutora em Psicologia (UFRJ) e pesquisadora associada NUPPEC/Eixo 3; Rose Gurski é psicanalista, membro da APPOA, professora do Departamento de Psicanálise e Psicopatologia UFRGS e Coordenadora NUPPEC/Eixo 3; Gerson Pinho é psicanalista, membro da APPOA e da equipe do Centro Lydia Coriat.
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