Voucher na educação infantil
Resultados controversos: o voucher na educação infantil
O ministro Paulo Guedes, da Economia, confirmou na terça-feira (21) que o governo pretende apostar em um sistema de vouchers para creches.
“Precisamos investir na educação e, quanto mais cedo, melhor”, disse Guedes, em Davos, durante o Fórum Econômico Mundial – que ocorreu de 21 a 24 de janeiro. “Então, vamos apoiar um gigantesco [programa de] vouchers para educação nos primeiros estágios.”
O voucher é uma espécie de vale que o Estado disponibiliza aos cidadãos – sobretudo de baixa renda. O repasse serve para que as famílias matriculem um ou mais filhos em escolas privadas.
Ao se referir aos “primeiros estágios da educação”, Guedes quer dizer que o plano é implementar um modelo de vouchers para creches e pré-escolas. Nas últimas duas semanas, a pauta esteve na agenda do Ministério da Economia em pelo menos duas ocasiões. O objetivo é diminuir o problema da falta de vagas na rede pública.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse recentemente no Twitter que o governo pretende fazer um “grande investimento em creches”. O programa não é capitaneado pelo Ministério da Educação (MEC), mas pelo Ministério da Economia em conjunto com a Casa Civil.
Segundo reportagem do jornal Valor Econômico, os vouchers voltaram à mesa do governo no segundo semestre de 2019, “após a decisão de que R$ 1,6 bilhão recuperado pela Operação Lava-Jato seria destinado para a educação”.
O uso dessa verba para a criação de um programa de vouchers direcionado às creches, porém, perdeu força devido a entraves burocráticos e também porque o próprio Ministério da Economia não é a favor de usar dinheiro finito para financiar gastos recorrentes. Alternativas estão em estudo.
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Resultados controversos
O criador do conceito é o vencedor do prêmio Nobel de Economia Milton Friedman (1912-2006). Ele defendia que os vouchers estimulam a competição entre escolas públicas e privadas, reduzindo custos e melhorando o ensino. Mas, em virtude dos poucos resultados – tanto em experiências quanto de benefícios –, a teoria é amplamente contestada.
No Chile, onde o programa de vouchers ganhou escala nacional a partir dos anos 1980, a principal crítica é a de que o modelo aumentou a desigualdade – seja pelo processo seletivo, seja por permitir que as famílias complementassem o valor do voucher com mensalidades adicionais, o que assegurou ao estrato mais rico da população acesso às melhores escolas particulares.
“Além disso, algumas avaliações de impacto identificaram que as escolas particulares apresentaram resultados semelhantes aos das públicas”, escreveu o empresário Jair Ribeiro, fundador e presidente da ONG Parceiros da Educação, em artigo no site Poder 360.
Nos últimos anos, o sistema chileno passou por uma série de reformas, visando a acabar com a distorção. Foi criado um voucher diferenciado para alunos de baixa renda e isenção de mensalidade extra para eles. Mesmo assim, os protestos contra o modelo persistem no Chile.
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Para não repetir o desempenho chileno, a Colômbia optou por um sistema de sorteio para a escolha dos alunos – que aparentemente deu certo.
O pesquisador Eric Bettinger, da Universidade Stanford, identificou em um estudo que os jovens colombianos do 6º ano que se beneficiaram com vouchers para frequentar uma escola particular tiveram 13% mais chance de se matricular no ensino superior. E que, por volta dos 30 anos de idade, os que fizeram uso do benefício tinham rendimento mensal 8% superior aos que não usaram os vouchers.
Já no Brasil os exemplos são escassos. O que mais se assemelha a um programa de vouchers é o ProUni, o Programa Universidade para Todos. Criado pelo governo federal em 2005, o ProUni financia bolsas de estudo em faculdades privadas por meio da isenção de impostos – o que libera a União de gastar em instituições públicas.
Nos últimos anos, o ProUni vem sofrendo um esvaziamento de bolsas integrais presenciais. Se em 2015 a proporção de bolsas integrais era de 62% do total, em 2019 esse percentual era de 45%. Em contrapartida, a oferta de subsídios integrais para cursos de educação a distância subiu de 25% para 45% no período.
Vouchers em creches
Daniel dos Santos, coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Economia Social (Lepes), da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA/USP), afirma que os vouchers criam um obstáculo imediato na educação infantil: o critério para se estabelecer padrões de qualidade.
“A principal missão da creche é desenvolver a criança, mas historicamente há um equívoco de que creche serve apenas para que os pais da criança possam trabalhar”, disse ele ao Valor Econômico.
“Não há nenhum caso de sucesso de vouchers para creches no mundo”, acrescentou Priscila Cruz, cofundadora e presidente-executiva do Todos Pela Educação. “Isso ocorre porque as condições para garantir a qualidade desse atendimento são muitas e de alta complexidade. Os vouchers prejudicam a qualidade a serviço da expansão quantitativa.”
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Apesar das críticas, dois projetos foram colocados em curso, em São Paulo e no Distrito Federal. Ambos foram anunciados em 2019.
Na capital paulista, a prefeitura sancionou em dezembro o programa Mais Creche, que viabiliza o atendimento para crianças de até 3 anos em instituições de ensino privadas e filantrópicas, enquanto aguardam vagas na rede pública. O benefício de R$ 727 é temporário, emergencial e pago diretamente pela prefeitura – sem repasse às famílias.
Em nota, o Sinesp, que é o Sindicato dos Especialistas de Educação do Ensino Público Municipal de São Paulo, manifestou-se contrário ao Mais Creche. Ao defender a aplicação de recursos públicos em escola da rede direta, a entidade afirma que o repasse para escolas privadas “faz assistencialismo equivocado com recursos da educação”.
No Distrito Federal, o governador, Ibaneis Rocha, anunciou o programa Cartão-Creche para o início de 2020. O objetivo inicial é bancar com R$ 803,57 a mensalidade de crianças menores de 4 anos em creches particulares inscritas em um cadastro do governo.
Atualmente, cerca de 20 mil crianças estão na fila por vagas em creches públicas no Distrito Federal. A intenção do governo é que, até o fim do ano, o déficit de vagas caia pela metade.
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