1964, nunca mais?!

1964, nunca mais?!

1964, nunca mais?!

 06/04/2022

Diorge Alceno Konrad
Professor Titular do departamento de História da UFSM

 

A História da Formação Social Brasileira e o papel das frações de classe mais reacionárias, no processo histórico mais recente, não nos possibilita estranhar como Jair Bolsonaro, desde o início, tratou o problema da pandemia da COVID-19. Também não é surpresa como a sua base mais radicalizada vem lhe defendendo, um exemplo da retomada fascista que reaplica parte dos princípios de eugenia social.

Como no século XX, quando os franquistas bradavam “viva la muerte”, o fascismo nunca foi a favor da Vida dos outros, principalmente daqueles considerados inimigos políticos ou ideológicos. O bolsonarismo é a expressão atualizada deste princípio, reforçado na pandemia com a desvalorização da vida e a relativização da morte, com afirmações do próprio Bolsonaro, através de expressões do tipo “vão morrer muitos, e daí?”.

Este tipo de fascismo é latente e ascendente, como rediviva solução para a crise dos capitalistas, a fim de levar adiante o projeto de destruição dos direitos (trabalhistas e sociais), do ataque à soberania nacional (privatizações e desnacionalização da economia)  e da ampliação da exploração do trabalho (redução do poder de compra, aumentos do desemprego e do subemprego). Também salta aos olhos as frações de um Judiciário conivente ou omisso, o qual nada fez ali atrás, diante do pronunciamento na Câmara de Deputados, quando Jair Bolsonaro elogiou o maior torturador e assassino da Ditadura Pós-1964, Carlos Brilhante Ustra.

Assim como se calou quando o mesmo já havia defendido que a Ditadura tinha matado poucos (“deveria ser uns trinta mil”), bem como nada disse quando ele colocou em seu gabinete, na Câmara dos Deputados, o cartaz com os dizeres “Quem procura osso é cachorro”, um acinte fascista aos familiares de desaparecidos políticos brasileiros.

Portanto, não surpreende a nota do Ministério da Defesa, corroborada pelos comandantes das três Forças Armadas, neste 2022, dissimulada e negacionista dos crimes praticados pelo Estado Brasileiro, entre 1964 e 1985.  Sem admitir que foi Golpe (chamado de Movimento de 31 de março de 1964), joga para supostos “anseios e as aspirações da população da época”, escondendo os protagonistas do Golpe e os que se locupletaram com os 21 anos de Ditadura: os empresários brasileiros e seus associados estrangeiros, bem como o Departamento de Estado dos Estados Unidos, além das frações reacionárias e fascistas das Forças Armadas e das classes médias que bradam historicamente por “Deus, Pátria e Família”. Igualmente esconde que muitos militares, integrantes da OAB, das igrejas, da imprensa e até empresários, de imediato ou ao longo dos 21 anos, questionaram ou romperam com o Golpe. Mas, sobretudo, esconde as intervenções nas entidades dos movimentos sociais, o exílio, a ilegalidade de partidos e organizações da classe trabalhadora, as prisões, as torturas, os assassinatos e os desaparecimentos políticos.

A proclamada “isenção e honestidade de propósito” do documento, tergiversa sobre os anseios atuais e declarados de romper com a democracia, ameaçando a Nação com nova intervenção militar, bem ao feitio de um (des)governo que só não avançou ainda para o rompimento, porque a correlação de forças ainda não o possibilita.

Mente quando afirma que “nos anos seguintes (...) a sociedade brasileira conduziu um período de estabilização, de segurança, de crescimento econômico”, pois o falso “Milagre Econômico” nada mais foi do que a ampliação de concentração de renda e de propriedade, resultando no aumento da miséria e violência social, ornando o Brasil um dos países mais desiguais do mundo. O propalado “amadurecimento político”, que teria resultado “no restabelecimento da paz no País, no fortalecimento da democracia, na ascensão do Brasil no concerto das nações e na aprovação da anistia ampla, geral e irrestrita pelo Congresso Nacional”, esconde a paz dos cemitérios clandestinos e a ceifa de uma ou duas gerações de militantes sociais e políticos que defendiam transformações efetivas da realidade brasileira, bem como a auto-anistia de 1979, a qual isentou torturadores e estupradores dos porões e aqueles que criaram o aparato que possibilitou o terrorismo de Estado desde os primeiros momentos de 1964, fossem os algozes das repressão, fossem os ditadores de plantão.

É por este tipo de opinião, não condenada jurídica e politicamente, como fizeram Argentina e Uruguai, após o final de suas ditaduras, somadas com permanente formação de caserna alicerçada na Doutrina de Segurança Nacional, a qual tem por opção eliminar o suposto “inimigo interno”, que estes setores e os que os defendem, do Planalto às planícies, NÃO “nos deixaram um legado de paz, de liberdade e de democracia”!!!

É por este tipo de pensamento e ação que, apesar de gritarmos “1964 Nunca Mais!”, estamos à espreita de novas farsas da tragédia iniciada no Brasil em meados dos anos 1960. Diante disso, só nos resta, resistir, pois “ousar lutar” é “ousar vencer!”, sendo que esta tática passa pelo “Fora Bolsonaro!’, por tudo que representa, porque expressa a linha mais visível dos que defendem o Golpe de 1964 e a Ditadura!

 

https://www.sedufsm.org.br/artigo/reflexoes/651?fbclid=IwAR1iifQnp6P3AYXydlJQTzmMW8ef4ed4NjGxs3iYk_4JBvhDhNtfA5VQbdg 




ONLINE
45