A crise da Ucrânia
A CRISE DA UCRÂNIA E O ESTADO-NAÇÃO.
Professor Daniel Vieira Sebastiani
Muitas vozes da direita e da esquerda se levantaram nos anos 90, com a queda da URSS, para augurar o fim do estado-nação da modernidade.
Intelectuais e universidades pelo mundo afora, usando como base teórica o pós-modernismo, afirmavam que o estado nação da modernidade tinha morrido com a revolução tecno-científica e com a globalização dos anos 90.
A fluidez dos capitais especulativos com a desregulamentação dos mercados e a migração de ativos para os países periféricos, notadamente para os países ditos em desenvolvimento e os emergentes, fez com que muitos argumentassem que o capital “é internacional” e com a “internet e a financeirização” acabou a nação.
Estas teses foram refutadas por diversos elementos ligados à reprodução do capital, ou seja, à mais valia.
- As moedas ou quaisquer valores de câmbio continuam sendo ditadas pelos estados nacionais e as moedas virtuais estão longe de desempenhar qualquer papel relevante em termos da totalidade do comércio mundial.
- O “socorro” aos capitais do mundo na Crise de 2008 foi essencialmente dos estados nacionais em relação aos seus fundos financeiros, bancos e empresas.
- A Crise de 2008 foi estancada graças à intervenção maciça dos estados nacionais com a emissão e o endividamento público.
- A UE tem uma aparência multinacional na presença de tradutores no parlamento europeu e pelo fato de não possuir um idioma oficial, mas fica evidente o controle franco-alemão sobre o euro e o Banco Central europeu. Das 3 maiores economias sobram duas, a GB tendo reafirmado seu Estado Nacional ante o domínio das outras duas.
- As leis que permitem as privatizações e desregulamentações do mercado de trabalho no planeta (essenciais para a definição do nível de extração de mais-valia) são de âmbito nacional.
- As leis que permitem ou restringem a ação do capital financeiro-especulativo e do produtor de juros ocorrem em âmbito nacional.
A Rússia, desde a posse de Putin, se afirma como um capitalismo que busca desesperadamente um espaço próprio de afirmação através de seu estado-nação, que o putinismo alavancou através do aparelho de estado.
Os EUA e, sobretudo, a UE (Alemanha e França), têm tentado “satelizar” a Rússia como fizeram com os países do leste europeu, parceiros pobres e explorados, fonte de recursos naturais e mão-de-obra barata para os capitais franco-alemães.
Como não conseguiram passaram a ver o estado nação russo e seus capitais como uma ameaça.
Aí cabe mais uma essencialidade: a ameaça dos capitais russos não se dá na sua capacidade de competir com os franco-alemães ou norte-americanos. Uma rápida análise da economia mundial deixa evidente que os produtos ou capitais russos não são concorrentes de relevo no domínio da economia mundial: longe disso!
Este dado objetivo da economia joga por terra a noção de disputa inter-imperialista, se usado o conceito leninista de imperialismo.
Portanto, a busca do capitalismo Russo por autonomia nacional é um perigo por outro motivo, qual seja, por impedir a exploração pura e simples dos trabalhadores russos e, sobretudo, dos enormes recursos naturais da Rússia, que enriquecem os russos e não dão a parte do leão aos franco-alemães e norte-americanos, como acontece com o Brasil, por exemplo.
Essa é a razão do cerco da OTAN à Rússia e de todas as suas provocações: impedir um Projeto Nacional autônomo ou, como pode-se dizer, um capitalismo não subordinado, mas concorrente.
A evidência salta aos olhos quando se trata de capitalismos fracos e incipientes, mas independentes: Líbia, Yougoslávia, Síria, Iraque, etc.
A importante lição a tirar desses elementos todos é que a ação dos imperialismos dos EUA e Franco-alemão é uma ação de estados nacionais defendendo seus capitais contra (muito menos capitalismos concorrentes) e muito mais Estados Nação Independentes.
Ou seja, a atualidade do estado nação é impressionante: o Imperialismo para garantir a reprodução de seus capitais e a orgia dos capitais financeiros, especulativos e produtores de juros em particular, precisa destruir qualquer projeto nacional, pois estes ameaçam a globalização que nada mais é que livrar a economia do mundo a SEUS capitais NACIONAIS.
A Guerra da Ucrânia é o resultado da contradição entre a velha hegemonia ocidental (dos EUA e da Europa Ocidental) versus a afirmação de uma contra hegemonia criada por projetos nacionais de desenvolvimento.
Essa contra hegemonia luta para nascer. A velha hegemonia luta para se manter.
Em outras palavras, a Guerra na Ucrânia é uma guerra entre a UNIPOLARIDADE ocidental para se manter e MULTIPOLARIDADE que tenta nascer e, ao fazê-lo, por óbvio, mata a anterior.
A Guerra da Rússia neste momento não é pela hegemonia: é contra a hegemonia.
A intervenção russa na ucrânia é a linha de frente do combate indireto entre a economia americana e europeia com a economia asiática, em particular, a chinesa.
O que está em jogo no mundo tem profundo vínculo com o ESTADO NAÇÃO em qualquer sentido: a da afirmação dos domínios do seu capital e a da sua hegemonia de poder mundial. Os estados buscam desenvolver seu estado-nação e com isso combatem os velhos estados-nação e sua hegemonia mundial.
A Multipolaridade é a única possibilidade dos povos dos países periféricos terem chance de combater a cada vez mais crescente concentração de renda mundial.
E para aqueles que entendem que ao importante e saudoso conceito de igualdade de direitos, base da democracia, dos velhos Iluministas é preciso acrescentar a igualdade de condições e oportunidades e o direito universal à renda do seu trabalho, não resta dúvida de que a soberania nacional sendo a base da distribuição da renda a MULTIPOLARIDADE mundial é a base de um futuro democrático para a humanidade.
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