A velha burocracia sindical

A velha burocracia sindical

“Cabe a nós refazermos o rumo. (...)

E quanto à velha burocracia sindical?

Ela já escolheu seu rumo: coexistir com a Casa grande e com os patrões, ocupando o nada nobre cargo de capataz da fazenda escravagista”.

Uma pessoa pedindo comida é um absurdo, sobretudo em um país que produz 15% da alimentação global.

Quando os militares, a mando de Washington, deram um Golpe em João Goulart, derrubando um presidente democraticamente eleito e com amplo apoio popular, eles também golpearam simultaneamente três soberanias: a nacional, a popular e a alimentar. Desde os Golpes de 1954 e 1964, e com a não implementação das reformas de base, nosso povo passa por ondas sazonais de fome.

Ao ver, hoje pela manhã, um rapaz (com os seus quase 40 anos) e sua mãe (uma senhora idosa e com sérias limitações de mobilidade) pedindo comida nas casas, o sentimento que nutro, é o da revolta. Não por termos de exercer a solidariedade e assumir o papel do Estado. Mas a revolta por termos ausência de Estado, num país onde o alto oficialato recebe proventos de até 66 mil mensais e a Classe política, que se tornou carreira, é sem dúvida, a mais corrupta do mundo.

É preciso ter a distinção, muito clara, de quem realmente quer mudar este país. Falo de mudar sua História, radicalizar sua democracia, para enfim, construir suas três soberanias. É necessário abrir mão de qualquer ideia umbilical em prol de um bem maior. Tenho plena convicção que a grande maioria da Esquerda institucional não está aberta a isto, como a Direita nunca esteve.

Quem frauda eleições sindicais, ou torna o processo viciado, quem se institucionaliza na política, querendo benefícios que não os da Classe trabalhadora, que não os que assegurem o bem para os trabalhadores, não quer mudar este país e nem o mundo. A velha burocracia sindical e os velhacos institucionais da Esquerda tradicional (estes mesmos de sempre) não querem mudar este país. Talvez, quiçá, nunca tenham tido esta intenção. Querem, enfim, o mesmo que o Alto oficialato, a grande magistratura e a nata do Crime Organizado do Colarinho Branco querem: assegurar ganhos pessoais.

Vou repetir aqui, o que afirmei em uma carta aberta em 1999: é preciso refundar a Esquerda brasileira. Refundar com os anarquistas, com os religiosos ecumênicos, com os setores de Centro da sociedade civil, e até (pasmem) com a pequena burguesia democrática e progressista que compreende as causas identitárias. Precisamos dos jovens, precisamos das minorias, mas precisamos sim dos velhos comunistas, dos saudosos trabalhistas, da eterna contracultura.

Ao ver, um rapaz e sua mãe pedindo comida nas casas, outro sentimento que nutro, é o da indignação. O da indignação de quem conhece a História deste país, e por conseguinte, a sua história de massacres aos indígenas, exploração da mão de obra cativa e da repressão aos trabalhadores assalariados. A miséria dialoga não só com o terrível mandato de Jair Bolsonaro, e a sua política de entrega ao Capital privado, mas com a tradicional ausência de políticas públicas que visem erradicar a miséria e socializar a riqueza gerada pelo trabalho.

Um país que entrega um poço de petróleo por 6 milhões, um terminal portuário por 200 mil e uma empresa de energia por 100 mil reais, não só entrega o patrimônio do seu povo aos interesses escusos do Capital privado e redistribui a fome: ele decreta a miséria das próximas gerações que virão, que nascerão sem nada.

No dia 20 de novembro, dia da Consciência negra, vale lembrar que no Brasil, só houve uma forma de “democracia racial”: a da Casa Grande. Esta democracia, a das oligarquias, socializou a miséria, generalizou a exclusão e expandiu a falta de moradia, alimento e dignidade a todos e todas. O racismo institucional dialoga perfeitamente com a aporofobia, a misoginia, e o etarismo do governo Bolsonaro.

Cabe a nós refazermos o rumo. Cabe a nós refundarmos a Esquerda, para que ela seja humana, animal e ambiental.

E quanto à velha burocracia sindical? Ela já escolheu seu rumo: coexistir com a Casa grande e com os patrões, ocupando o nada nobre cargo de capataz da fazenda escravagista.




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