Alemanha acima de tudo

Alemanha acima de tudo

“Alemanha acima de tudo”, um verso e um passado sombrio

Deutschland über alles (A Alemanha acima de tudo) é o primeiro verso da canção nacionalista Das Lied der Deutschen (A canção dos alemães), composta em 1841 por August Heinrich Hoffmann (que acrescentou “von Fallersleben” ao próprio nome em referência a sua cidade natal e para diferenciá-lo de homônimos).

A melodia é a mesma de Gott erhalte Franz, den Kaiser, uma composição de Joseph Haydn de 1797 para o imperador Francisco I da Áustria.

O motivo concreto para a composição do poema foram reivindicações territoriais francesas. Em 1840, o governo da França reivindicava que o Rio Reno voltasse a ser a fronteira oriental do reino francês, dando origem à chamada Crise do Reno com a Confederação Germânica, a união das dezenas de Estados e territórios, a maioria hoje parte da atual Alemanha.

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A crise foi logo debelada, mas acabou como uma importante propulsora do nascente movimento nacionalista alemão. A oposição dos alemães às reivindicações francesas foi registrada em várias canções de teor nacionalista, chamadas Rheinlieder, e uma delas era Das Lied der Deutschen.

Hoffmann faz referência às questões territoriais nos versos “von der Maas bis an die Memel, von der Etsch bis an den Belt” (Do Mosa ao Neman, do Ádige ao [estreito Pequeno] Belt), indo além dos limites do Reno e abrangendo as regiões que eram habitadas por populações falantes do alemão.

É nesse contexto que o verso “Alemanha acima de tudo, acima de tudo no mundo”, bem como toda a primeira e terceira estrofes, são escritos. O “acima de tudo” era um chamado à unidade alemã.

Também nessa linha, uma Alemanha unificada serviria melhor para a proteção e defesa (Schutz und Trutz) dos seus habitantes e seria uma garantia de justiça (Recht) e liberdades civis (Freiheit), temas mencionados a seguir na canção e de acordo com o espírito liberal então em voga.

Na época em que foi composta, Das Lied der Deutschen era apenas mais um entre tantos outros hinos nacionalistas, e ele passou décadas sem receber grande atenção.

A reinterpretação da primeira estrofe num sentido imperialista e expansionista começou nos anos 1890, com a organização nacionalista-extremista Altdeutscher Verband, mas ganhou força mesmo com o movimento nazista, nos anos 1930.

Os nazistas cantavam apenas a primeira estrofe da canção (justamente a que inclui o trecho “Alemanha acima de tudo” e as reivindicações territoriais) e em seguida emendavam com os versos do hino do partido nazista. Durante a execução, faziam a saudação nazista. Com isso, a associação do verso Deutschland über alles e de toda a primeira estrofe com o nazismo passou a ser irreversível.

Naquela época, Das Lied der Deutschen, com suas três estrofes, já era o hino nacional oficial da Alemanha, status que obtivera em 1922, durante a República de Weimar, por decisão do presidente do Reich, o social-democrata Friedrich Ebert.

Hitler era um fã declarado da canção. Ele chegou a dizer, em 1937, quando já era chanceler, que se tratava da canção que os alemães consideravam “a mais sagrada”. Em 1936, ela foi cantada na abertura dos Jogos Olímpicos de Berlim, quando Hitler e o séquito nazista entraram no Estádio Olímpico.

Com a derrota da Alemanha nazista, apenas o setor norte-americano proibiu a execução pública de canções militares ou nazistas, ainda que sem mencionar explicitamente Das Lied der Deutschen. Em 1949, as proibições foram revogadas, e essa é a situação jurídica que permanece até hoje. Nenhuma das três estrofes é proibida na Alemanha.

O governo da nascente República Federal da Alemanha não escapou do debate sobre o que fazer com o hino nacional oficial do país. Ao fim, optou-se por manter Das Lied der Deutschen como hino nacional. Mas, como a primeira estrofe havia adquirido uma clara conotação nazista, apenas a terceira – que os nazistas ignoravam – deveria ser cantada.

Com a Reunificação, em 1990, essa praxe virou lei: apenas a terceira estrofe, cantada sobre a melodia de Haydn, passou a ser o hino oficial da Alemanha. Ela enaltece a unidade, a justiça, a liberdade e a fraternidade como os fundamentos da felicidade de uma nação.

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