As férias dos professores.

As férias dos professores.

A verdade sobre as “férias” dos professores.

 

Nota prévia: quantificar a verdade é algo subjetivo, por isso esta é apenas a minha verdade. Vocês dirão se está próxima da realidade ou não.

Tenho um vizinho que me disse em setembro, ”então já voltaste ao trabalho?”, a minha resposta foi um óbvio sim. Ato contínuo sou “acariciado” com um miminho venenoso… “também já chega de férias, não?”. Este é apenas um exemplo que comprova a opinião que os professores têm muitos dias de férias.

E será verdade? Não, mas também sim…

Porque não?

Legalmente os professores usufruem dos mesmos dias de férias que os outros trabalhadores da função pública, por isso, as chamadas férias de Natal ou Páscoa, são meras interrupções letivas.

Porque sim?

Deixemo-nos de hipocrisias. Sim, é verdade que depois das reuniões de avaliação do 1º e 2º período(Natal e Páscoa), bem como na interrupção do Carnaval, a maioria do corpo docente não se apresenta ao serviço e usufrui de uns dias de descanso. Exceção feita aos membros da direção que costumam manter-se em serviço durante mais alguns dias.

No final do ano letivo, já não é bem assim, até meados de julho existe trabalho significativo para burocratizar o dia-a-dia dos professores. A segunda quinzena de julho é claramente mais “soft” e é caracterizada por um arrumar de malas para os “Algarves” e afins.

Nesta fase, alguns de vós deve estar a preparar um manancial de adjetivos para “aconchegar” a minha pessoa, mas aguentem só mais umas linhas…

Os professores não devem nada a ninguém no que diz respeito a horas de trabalho, nem devem aceitar lições de moral sobre este assunto. Somos das profissões que mais horas dá, e sublinho dá, pois são mesmo dadas. A profissão de professor é referência nas intituladas profissões de desgaste rápido ou profissões com elevada taxa de burnout. Será um exagero? Deixo-vos apenas um cheirinho do que faz um professor…

A profissão de professor tem duas partes, uma visível, que é quando o professor está na escola a lecionar e a tratar do trabalho burocrático. Outra é a parte que eu intitulo de “gruta”, onde o professor se apresenta frequentemente entre as 21 ou 22 horas, após despachar as crianças para a terra do “João Pestana”, mergulhando num mundo infindável da preparação de aulas, materiais para as ditas e testes, muitos testes… Enquanto está na gruta, o professor abdica do seu tempo familiar, da adorável da chaise longe, onde pode ver a novela da moda, ler o tal livro que anda a tentar terminar há 3 meses, ou simplesmente ficar na “sorna” até ser acordado pela sua cara metade, com um desagradável “vai para a cama que já estás a dormir no sofá”. A dita qualidade de vida

😉

Mas tudo começa no início do ano, são as planificações, as reuniões, a preparação de dossiers, caracterizações de turmas, atualização do “grelhador”, avaliações diagnosticas, entre outras coisas maravilhosas…

Ao começarem as aulas, surge a sua constante preparação e só isso obriga a uma dedicação sistemática que não é valorizada pela população em geral. As pessoas têm de compreender, que os professores em cada aula estão perante 20/30 alunos e seria no mínimo imprudente entrar no “ringue” sem estar munido de atividades e estratégias que potenciem a aprendizagem. Depois surgem os testes… Sabem quantos alunos tem um professor? 200, 300, alguns podem chegar aos 400 alunos. Imaginem o que é corrigir centenas de testes, continuando a preparar e a dar aulas, além de cumprir com os requisitos de cargos, como por exemplo a direção de turma. E isto tudo acontece pelo menos duas vezes por período, ou seja, um professor que tenha 200 alunos terá de corrigir 400 testes no espaço de 2/3 meses…

Chegando ao final dos períodos é a loucura total: aulas, testes, notas, grelhas, muitas grelhas, reuniões de avaliação, relatórios, atas, tudo num curtíssimo espaço de tempo.

Quem vive numa casa onde reside um professor, sabe do que estou a falar e da dificuldade em manter uma relação com alguém que tem uma profissão tão exigente. Não é por acaso que os professores são das profissões com uma das taxas de divórcio mais elevadas, facto que não será alheio os milhares de kms que estes galgam todos os anos, dormindo sistematicamente fora de casa e sem qualquer subsídio. Tudo para alimentar o chamado tempo de serviço, algo que no passado significava entrada direta na carreira e que agora mais não é que uma variável num conjunto de “habilitações” necessárias para lecionar.

Só que a tutela quis “animar” a malta, achou que tínhamos uma vida muito monótona, então resolveu inventar mais uns quantos concursos, metê-los todos num saquinho, juntando uns milhares de professores e “tcharam”. As BCEs e afins deitaram por terra qualquer plano de estabilidade a curto/médio prazo e aquilo que era apenas uma questão de tempo, tornou-se numa questão de sorte.

Mas não ficamos por aqui, ser professor é entrar numa warzonediariamente, não estamos a falar de uma profissão que seja nutrida por um ambiente calmo, harmonioso, previsível e silencioso. A escola é um meio agressivo, onde as asneiradas, o barulho dos corredores e a violência física e psicológica são comuns. Ser professor não é para qualquer um, é preciso ter estômago para aguentar a pressão, principalmente quando ela vem do inimigo  aliado encarregado de educação.

Aliás, são os professores e não os pais, os responsáveis por manterem determinados alunos na escola. São os professores e não os pais, que muitas vezes salvam os alunos da marginalidade e que denunciam determinados abusos e negligências parentais. E isto só é possível, em virtude do elevado sentido de responsabilidade do professor. Este sabe que está perante crianças/jovens que precisam e dependem de si para atingir requisitos que lhe permitam ter uma vida melhor. O professor é e continuará a ser, um farol social…

O professor não tem horas, o professor não diz não a um aluno quando este precisa, o professor é um missionário que abdica de si e dos seus em prol dos outros.

Mas este missionário precisa de estar equilibrado emocionalmente, e se queremos o melhor para os nossos filhos, devíamos proteger aqueles que os ensinam e também educam. As interrupções letivas são fundamentais para o professor se voltar a equilibrar, como um lutador que descansa no seu canto antes de regressar ao combate.

Por estas e por outras é que o professor sente uma revolta muito grande quando se diminui a sua profissão a um mero “gozador” de férias. É preciso ter lata ou uma ignorância atroz, que devia inchar a língua de quem profana a nossa profissão. Além disso, é preciso não esquecer que o professor não pode usufruir das suas férias a não ser em agosto, ou seja, o professor é obrigado a pagar sempre o dobro ou o triplo do que paga um qualquer trabalhador que queira usufruir de umas férias em época baixa.

Eu e milhares como eu, encaramos estes dias como uma oportunidade para voltar a ser Marido, Pai, Filho, Irmão, Tio, etc… Não lhe chamo férias, recuso-me a pronunciar esse termo, chamo-lhe período de compensação pelas inúmeras horas extraordinárias não remuneradas.

Tudo tem o seu tempo, tudo tem o seu espaço e esta é a altura de nos voltarmos a encontrar para que mais tarde não percamos os vossos e já agora os nossos, filhos…

Continuação de bom descanso

😉

 

 

FONTE: texto de 2015 retirado, estava no link abaixo

http://www.comregras.com/a-verdade-sobre-as-ferias-dos-professores/?utm_campaign=shareaholic&utm_medium=facebook&utm_source=socialnetwork 




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