Atendimento a aluno com TDAH

Atendimento a aluno com TDAH

Atendimento a aluno com TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade)

Publicado por Camila Moreira

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência é uma grande conquista para toda a população, mas muitas dúvidas surgem em relação à contemplação ou não, nessa lei, das pessoas com transtornos do neurodesenvolvimento, como é o caso do TDAH. De fato, o único transtorno nessa categoria que é mencionado nominalmente na Lei é o Autismo (categoria VI da descrição de deficiência), definido como “comprometimento global do desenvolvimento, que se manifesta tipicamente antes dos 3 (três) anos, acarretando dificuldades de comunicação e de comportamento, caracterizando-se freqüentemente por ausência de relação, movimentos estereotipados, atividades repetitivas, respostas mecânicas, resistência a mudanças nas rotinas diárias ou no ambiente e a experiências sensoriais”.

Como essa lei define a deficiência?

“Art. 2º Considera-se deficiência toda restrição física, intelectual ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária e/ou atividades remuneradas, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social, dificultando sua inclusão social, enquadrada em uma das seguintes categorias:

I – deficiência física,

II – deficiência auditiva,

III – deficiência visual,

IV – deficiência intelectual,

V – surdocegueira,

VI – autismo,

VII – condutas típicas,

VIII – deficiência múltipla.”

Convém ressaltar a definição de condutas típicas:

“comprometimento psicossocial, com características específicas ou combinadas, de síndromes e quadros psicológicos, neurológicos e/ou psiquiátricos, que causam atrasos no desenvolvimento e prejuízos no relacionamento social, em grau que requeira atenção e cuidados específicos em qualquer fase da vida.”

Sobre a definição de TDAH

Um dos sistemas classificatórios mais reconhecidos no mundo para critérios diagnósticos de transtornos mentais é o DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais), da Academia Americana de Psiquiatria, que teve sua 5ª edição publicada em 2013. O DSM-5 define o TDAH como um padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade que interfere com o funcionamento ou desenvolvimento, com clara evidência de que os sintomas interferem, ou reduzem a qualidade, do desempenho acadêmico, funcionamento social ou ocupacional .

No entanto, o sistema classificatório de doenças mais utilizado no Brasil é a décima edição da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) de 2008, que traz outra nomenclatura para o mesmo transtorno: Transtornos hipercinéticos (F90), grupo de transtornos caracterizados por início precoce (habitualmente durante os cinco primeiros anos de vida), falta de perseverança nas atividades que exigem um envolvimento cognitivo, e uma tendência a passar de uma atividade a outra sem acabar nenhuma, associadas a uma atividade global desorganizada, incoordenada e excessiva.

Os transtornos podem se acompanhar de outras anomalias. As crianças hipercinéticas são frequentemente imprudentes e impulsivas, sujeitas a acidentes e incorrem em problemas disciplinares mais por infrações não premeditadas de regras que por desafio deliberado. Suas relações com os adultos são frequentemente marcadas por uma ausência de inibição social, com falta de cautela e reserva normais. São impopulares com as outras crianças e podem se tornar isoladas socialmente. Estes transtornos se acompanham frequentemente de um déficit cognitivo e de um retardo específico do desenvolvimento da motricidade e da linguagem. As complicações secundárias incluem um comportamento dissocial e uma perda de auto-estima.

Qualquer que seja a definição utilizada podemos concluir que o TDAH pode limitar as atividades diárias e trazer comprometimentos psicossociais, resta saber como a lei será interpretada e aplicada na prática.

Sobre a dificuldade de atendimento escolar

A Resolução do Conselho Nacional de Educação, CNE-CEB 04/2009, definiu em seu bojo qual seria o público-alvo do Atendimento Educacional Especializado no âmbito escolar, conforme depreendemos do artigo 4º e seus incisos:

Art. 4º Para fins destas Diretrizes, considera-se público alvo do AEE:

I – Alunos com deficiência: aqueles que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual, mental ou sensorial.

II – Alunos com transtornos globais do desenvolvimento: aqueles que apresentam um quadro de alterações no desenvolvimento neuropsicomotor, comprometimento nas relações sociais, na comunicação ou estereotipias motoras. Incluem-se nessa definição alunos com autismo clássico, síndrome de Asperger, síndrome de Rett, transtorno desintegrativo da infância (psicoses) e transtornos invasivos sem outra especificação.

III – Alunos com altas habilidades/superdotação: aqueles que apresentam um potencial elevado e grande envolvimento com as áreas do conhecimento humano, isoladas ou combinadas: intelectual, liderança, psicomotora, artes e criatividade.

A falta de definição nominal do TDAH como público alvo do AEE, construiu resistência no atendimento escolar, ainda que sejam alunos enquadrados na categoria de "necessidades educativas especiais" e/ou "dificuldade de aprendizagem".

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, posterior à Resolução 04/2009 estabeleceu maior abrangência às deficiências e apesar de igualmente não ter nominado o TDAH, na descrição de condutas típicas é possível correlacionar as ações com aquelas apresentadas pelas pessoas com TDAH.

No campo pedagógico o maior desafio encontra-se na falta de informação, instrumentalização de métodos e técnicas que auxiliem os professores em sua prática pedagógica diária, pois mesmo não estando configurado claramente como deficiência, o aluno tem dificuldade de aprendizagem, o que exige atenção e apoio pedagógico diferenciado. Porém, não temos dispositivos legais específicos que regulamentem o tipo de atendimento prestado nestas condições.

Na idade escolar, crianças com TDAH apresentam falta de atenção, isso afeta as atividades bem como o rendimento escolar. Quanto ao aspecto cognitivo, a criança poderá ter prejuízos em termos de dificuldades escolares em função da desatenção e da falta de autocontrole, apresentando um baixo rendimento pedagógico. Além disso, o aluno com THDA pode ter dificuldade em expressar-se, porque a fala não consegue acompanhar a velocidade da mente, ‘come palavras’ ou aparecem os ‘brancos’, dificultando a comunicação, pois tanto a linguagem oral como a escrita requerem planejamento de sequencias de palavras, frases, parágrafos, etc. A atenção e a memória são precárias em quem tem THDA, mas são fundamentais para que se adquira habilidades de compreensão e de formulação da linguagem adequada.

Existem algumas orientações práticas sugeridas pela ABDA (Associação Brasileira de Déficit de Atenção), conforme descrição abaixo, que podem colaborar com a atuação da escola no trato de alunos com TDAH e garantir-lhes o direito de rendimento e sucesso escolar.

  • Estabelecer uma rotina diária clara, com períodos de descanso definidos;

  • O ambiente familiar e escolar devem ser previsíveis e organizados, isso ajuda a manter o controle emocional das pessoas com TDAH;

  • As regras e expectativas dos pais, professor e da escola devem ser claramente definidas;

  • Usar esforços visuais e auditivos para definir e manter regras e expectativas, como calendários, cartazes e músicas.

  • As instruções e orientações devem ser dadas de forma direta, clara e curta;

  • Estabelecer consequências razoáveis e realistas para o não-cumprimento de tarefas e das regras combinadas, que devem ser compreendidas por todos;

  • Aplicá-las com consistência e bom senso;

  • Implementar um sistema de controle do comportamento (verbal e escrito) que seja conhecido previamente e compreendido pelos alunos, pais, professores auxiliares e funcionários da escola.

  • Modelar o comportamento e habilidades sociais que se espera dos alunos. As recompensas e consequências devem ser sempre coerentes com a ação que as motiva.

  • Focalizar mais o processo (compreensão de um conceito) que o produto (concluir 50 exercícios);

  • Certifica-se que as atividades são estimuladoras e que os alunos compreendem a relevância da lição;

  • Utilizar técnicas eficientes de questionamento;

  • Adotar uma atitude positiva, como elogios e recompensas para comportamentos adequados;

  • Alunos com TDAH sempre têm sua atenção chamada para o que fazem de errado – deve-se, então, especificar e reforçar positivamente aquilo que fazem certo.

  • Ter sempre presente a lista de seus pontos fortes e capitalizar em cima deles sejam para motivar para uma atividade ou para aumentar sua autoestima, bem como tratar de minimizar os efeitos negativos de suas dificuldades;

  • Usar técnicas de prevenção de situações de conflito ou comportamento disruptivo (liberação de impulsos) por meio de cuidadoso planejamento;

  • A música é um ótimo instrumento para relaxar e para ser usado nos momentos de transição de atividades ou de ambientes.

  • Quando o aluno começar a ficar agitado, frustrado ou atrapalhar o trabalho da classe, redirecionar para uma outra atividade ou situação, como, por exemplo, levar um recado para fora da sala, organizar os livros na prateleira, apagar o quadro, ajudar outro amigo a fazer a tarefa;

  • Procurar sempre falar em voz calma e firme. Ignorar as transgressões leves que não forem intencionais e ensinar a turma a ignorar os comportamentos inadequados menos sérios, bem como elogiar e reforçar comportamentos positivos dos colegas;

  • Utilizar estratégias de ensino ativo no processo de aprendizagem, compreendendo qual é o estilo de aprendizagem do aluno (sinestésico, visual, auditivo, visual auditivo, visualsinestésico, etc.).

  • Com o objetivo de se evitar o excesso de informação, o professor deve fornecer o esclarecimento necessário na estruturação das tarefas, apresentando as chaves significativas para sua execução;

  • Deve-se tomar um cuidado especial na graduação de dificuldade das atividades, evitando dar grandes saltos de problemas fáceis para muito difíceis.

  • O conteúdo deve ser dado passo a passo.

  • Alternar as atividades mais motivadoras com as menos interessantes, evitar tarefas monótonas e repetitivas. Dar retorno constante e imediato.

  • Incentivar a leitura em voz alta, recontar histórias, falar por tópico, ajudando a organizar ideias.

  • Adaptar o currículo caso necessário, enfocando apenas conteúdos funcionais que tenham sentido para a vida do aluno com TDAH;

“Importante ressaltar que nem a ABDA sugere em suas estratégias no trato com alunos que tenham TDHA que eles tenham tratamento individualizado dentro da sala de aula regular”.

A inquietação, característica destes alunos será manifestada com o professor regente ou com um auxiliar. O que precisa ser adaptado são os métodos.

A Resolução CNE-CEB 02/2001 do Conselho Nacional de Educação, que instituiu as Diretrizes Nacionais para a educação de alunos com necessidades educativas especiais nos traz alguns esclarecimentos.

Art. 1º - A presente Resolução institui as Diretrizes Nacionais para a educação de alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, na Educação Básica, em todas as suas etapas e modalidades.

Art. 5º - Consideram-se educandos com necessidades educacionais especiais os que, durante o processo educacional, apresentarem:

I - dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares, compreendidas em dois grupos:

b) aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências;

Art. 7º - O atendimento aos alunos com necessidades educacionais especiais deve ser realizado em classes comuns do ensino regular, em qualquer etapa ou modalidade da Educação Básica.

Art. 8º - As escolas da rede regular de ensino devem prever e prover na organização de suas classes comuns:

I - professores das classes comuns e da educação especial capacitados e especializados, respectivamente, para o atendimento às necessidades educacionais dos alunos (grifo nosso);

II - distribuição dos alunos com necessidades educacionais especiais pelas várias classes do ano escolar em que forem classificados, de modo que essas classes comuns se beneficiem das diferenças e ampliem positivamente as experiências de todos os alunos, dentro do princípio de educar para a diversidade;

III - flexibilizações e adaptações curriculares que considerem o significado prático e instrumental dos conteúdos básicos, metodologias de ensino e recursos didáticos diferenciados e processos de avaliação adequados ao desenvolvimento dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, em consonância com o projeto pedagógico da escola, respeitada a frequência obrigatória (grifo nosso);

IV - serviços de apoio pedagógico especializado, realizado, nas classes comuns, mediante:

a. atuação colaborativa de professor especializado em educação especial;

VII - sustentabilidade do processo inclusivo, mediante aprendizagem cooperativa em sala de aula, trabalho de equipe na escola e constituição de redes de apoio, com a participação da família no processo educativo, bem como de outros agentes e recursos da comunidade;

Notemos que diante de tanta peculiaridade, o professor regente necessita de uma interação constante com um professor especializado em educação inclusiva para o aprimoramento de técnicas que melhor atendam o aluno com TDAH, e um profissional sem qualificação não teria habilidade para fazê-lo, do ponto de vista do desenvolvimento educacional do aluno, como é o caso de um estagiário.

Apenas pequenas intervenções no ambiente e no currículo são necessárias para alcançar o sucesso. E a principal delas, oferecer formas diferentes de avaliação: prova oral e ou objetiva, pesquisa, fotos, imagens, gravações, dramatizações, etc, para facilitar a interação do aluno e a manifestação do seu saber de forma a valorizar as habilidades já adquiridas.

Concluindo, o professor que ensina alunos que apresentam TDAH necessitará adaptar seu processo de ensino para atender as necessidades especificas deles. Deverá também conhecer a história do aluno, visto que cada caso é único, procurando fazer estudo do “caso” com os profissionais envolvidos, para melhor compreensão e intervenção pedagógica adequada, bem como construir um Plano de Atendimento Individualizado para o aluno.

Isso deve ser feito independente de considerar-se ou não deficiência, mas por ser uma característica que diferencia o processo educativo deste aluno e o coloca em desfavor, se não lhe for dispensado o apoio necessário.

Os professores devem ter um mínimo de preparação para atender a demanda de um aluno com TDAH, que pode se destacar por ser tão inteligente e criativo quanto os outros alunos, desde que estimulado da maneira correta.

Nestes termos, o apego à letra fria da lei reduz o olhar prioritário sobre as necessidades do aluno e a defesa de seu melhor interesse.

Ademais, a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva está sofrendo alterações, e uma consulta pública foi aberta no mês de novembro de 2018 (encerrada no dia 21/11/2018), cujo texto consolidado será enviado ao Conselho Nacional de Educação (CNE), para sistematização e posterior homologação. Uma das mudanças previstas é a inclusão do TDAH, da dislexia, dislalia, discalculia, entre outros, no rol dos alunos público alvo do Atendimento Educacional Especializado. Portanto, se a escola ainda carece de regramento para reconhecer as dificuldades de aprendizagem de determinados estudantes para lhes dar o atendimento devido, em 2019 a norma passará a vigorar.

Camila Ferreira Moreira - Pedagoga

https://cmoreira2.jusbrasil.com.br/artigos/653601185/atendimento-a-aluno-com-tdah-transtorno-de-deficit-de-atencao-e-hiperatividade

 

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Quais os direitos dos alunos com TDAH

Resumo: Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação inclusiva. MEC/SEESP (2008)




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