Avaliar pode ser tri
Avaliar pode ser “tri”, desde que…
Avaliar não significa um processo metonímico, onde se avalia uma parte do todo. A avaliação é o todo. Deve ser o todo. Para avaliar o processo escolar, não é com uma prova advinda de um mundo imaginário, aplicada à “meia dúzia” de alunos que compareceram na escola que vamos chegar num todo.
Avaliar deve ser “tri” porque é através dela que medimos o processo amplo escolar. Se a avaliação conseguir traduzir a realidade de cada segmento que compõe o todo, ela cumpre seu papel, caso contrário, será mais uma atividade, mais pelo prazer de se realizar do que o prazer do efeito causado.
Assisti, dia desses, a Professora Dra. Josiane Toledo, contratada para dar a devolutiva da prova de Língua Portuguesa da “Avaliação Diagnóstica”, elaborada pelo Estado do RS para diagnosticar o processo de ensino-aprendizagem dos estudantes das escolas estaduais.
Toledo dizia tudo aquilo que sabemos sobre, como e para que a avaliação serve, pois nosso conhecimento permite afirmar isso. Dizia que devemos entender qual o lugar está a avaliação? Para onde vamos com a avaliação? Em se tratando em Língua Portuguesa precisamos ajudar para que nosso estudante leia e tenha capacidade de compreensão e que não só codifique. Que o estudante tenha uma apropriação através da linguagem. E que ler significa ter a capacidade de recuperar o sentido da palavra. Que não podemos ler da mesma forma uma poesia e um texto científico ou acadêmico. Que devemos ensinar nossos alunos a construir sentido naquilo que se lê. Tudo isso sabemos muito bem.
Em outra oportunidade, escrevemos que avaliação tem por meta o ajuste e a orientação para a intervenção pedagógica visando a aprendizagem da forma mais adequada para o aluno. É um elemento de reflexão contínua para o professor sobre sua prática educativa e instrumento para que o educando possa tomar consciência de seus progressos, dificuldades e possibilidades. Por isso, a avaliação deve ser realizada envolvendo o conteúdo trabalhado através de trabalhos, provas e acompanhamento sistemático do desempenho demonstrado no estudo.
A avaliação deve oferecer um feedback ao professor sobre como melhorar seu ensino e como o aluno melhorar a performance dele, já que esse tópico merece uma atenção singular na abordagem didático-metodológica, pois, “a avaliação tem sido um tema muito polêmico nestes últimos anos”. (WEIDUSCHAT, 2007, p.73). Por esse viés, ao não tratar essa questão com atenção no ensino, poderá se perder todo o processo. Avaliar denota um olhar para de todos os segmentos que compõe a escola e não fixar somente num segmento.
Assim pensamos quando elaboramos nossas Avaliações Diagnósticas, solicitadas pela Coordenadoria Regional de Educação e fomos desrespeitados dizendo que as nossas avalições não teriam mais validade. A Secretaria de Estado da Educação contratou uma empresa de Minas Gerais para elaborar as tais Avaliações. Quando nós elaboramos, debruçados em dados concretos e particulares de cada escola, da qual somos exímios conhecedores, não serviu, agora para o Estado pagar uma empresa para realizar a Avaliação, sem conhecer a realidade, aí tem valor.
Essa atitude adotada condiz com tudo o que já estudamos sobre avaliação? Que papel tem essa avaliação tida como “Tri”? Por que desrespeitar dessa maneira os atores sociais locais? Algo que vem pronto de outro Estado, com interesses políticos e financeiros, tem poder de medir a realidade do nosso aluno do Instituto Estadual Cecy Leite Costa, por exemplo?
Procuraram saber que existe a Marie vinda do Haiti, a Gerliennys, o Jannier, a Sariath, o Brighan e outros tantos vindos da Venezuela? Saber da Morion e seus irmãos que vêm de Bangladesch? Saber que tem famílias pedindo ajuda para a escola com dificuldade de se alimentar? Saber que muitos alunos não têm celular, internet ou até mesmo possibilidade psicológica para enfrentar os problemas sociais que os afligem e refletem no ser estudante? Saber que muitos alunos sumiram, simplesmente, e a coordenação está fazendo um esforço descomunal para recuperá-los?
Nós soubemos, tudo isso compõe uma avaliação justa que realmente diagnostica a realidade enfrentada. O que o governo está fazendo para minimizar a questão social que afeta diretamente no aprendizado? Qual é o papel da avaliação apresentada pelo governo, sabendo que a cada final de ano há uma pressão para que se amenize a infrequência e altere a nota para que todos os alunos sejam aprovados? Isso é avaliar? Que autonomia se dá para escola e ao professor?
Mudamos o foco para o aluno. Enxergamos o aluno como um ser aprendente. Evoluímos. Mas agora estamos com o foco no sistema. Sistema para demonstrar que o governo não desampara. Que a estatística mostra que os alunos foram aprovados. Todos. Dados artificiais. (07/05/2021)
Avaliar não significa um processo metonímico, onde se avalia uma parte do todo. A avaliação é o todo. Deve ser o todo. Para avaliar o processo escolar, não é com uma prova advinda de um mundo imaginário, aplicada à “meia dúzia” de alunos que compareceram na escola que vamos chegar num todo.
Apenas nos interessa a metonímia? Avaliar significa levar em consideração de que o profissional da educação está desmotivado com seu salário congelado desde 2014, desde que o botijão de gás custava, R$ 37,00, que a gasolina R$ 2,60, que o 5 kg de arroz R$ 8,00. Avaliar significa olhar para a infraestrutura das escolas, em que a internet não dá conta e obriga o próprio professor a rotear seu celular para trazer o mundo à sala de aula.
Avaliar significa considerar que as escolas estão trabalhando com pessoas reduzidas para desenvolver o calhamaço de demandas exigidas para alimentar estatísticas falsas para o governo. Esquecer essas coisas do processo é avaliar pelo viés metonímico. A escola, a educação não são metonímicas. É o todo e não parte do todo. Onde está o professor neste processo? Ele foi ouvido?
Essa avaliação não é maciça, como se referiu a Secretária de Educação. Avaliar é um processo que envolve o todo. Não é algo onde tudo que é decidido vem a cabresto. Onde tudo é decidido sem respeito ao profissional e a escola que são os que mais conhecem a realidade social e da aprendizagem. Querem saber, de fato, o quê? Chame o professor, a coordenação, a escola como um todo e terão respostas mais verdadeiras.
Conheça mais sobre os resultados da avaliação diagnóstica “Avaliar é Tri RS”, concluída no dia 16/06/2021, aplicada nas escolas estaduais do Estado. https://www.estado.rs.gov.br/avaliacao-diagnostica-avaliar-e-tri-rs-e-concluida-com-cerca-de-500-mil-participantes
Autor: Laércio Fernandes dos Santos
Edição: Alex Rosset