Bilhões por evasão escolar de jovens
País perde R$ 214 bilhões por ano com evasão escolar de jovens
Estudo da Fundação Roberto Marinho e Insper mostra prejuízo para toda a sociedade. Além da renda menor, eles vivem menos
Cássia Almeida 14/07/2020
O país perde R$ 214 bilhões por ano por deixar 17,5% dos jovens sem concluir o ensino médio. Significa dizer que o país tem hoje 575 mil adolescentes de 16 anos que não vão completar a educação básica, se nada mudar, mostra o estudo “Consequências da violação do direito à educação”, fruto da parceria entre a Fundação Roberto Marinho e o Insper.
A perda para cada adolescente que não completa o ensino médio é de R$ 372 mil por ano. “Esse é o custo de não fazer nada”, alerta Wilson Risolia, secretário-geral da Fundação Roberto Marinho. A conta considerou o impacto econômico da queda da empregabilidade e de remuneração dos jovens, os efeitos dessa renda mais baixa para a sociedade e a longevidade menor.
Além do aspecto financeiro, o adolescente que abandona os estudos vive, em média, quatro anos menos. Como jovens com mais ensino formal se envolvem menos em atividades criminosas, há efeito da educação nos indicadores de violência. Pelo estudo, cada ponto percentual de queda na evasão escolar evita 550 homicídios por ano. Sem abandono, seriam 10 mil mortes a menos.
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— Educação é um dos grandes instrumentos da promoção da cultura da paz. A escola ensina a apreciar a diversidade mais que qualquer outro lugar — afirma Ricardo Paes de Barros, professor do Insper e autor do estudo.
Renda 25% menor
E a situação se agravou na pandemia, alerta Risolia, que já foi secretário estadual de Educação do Rio. Outra pesquisa feita pela Fundação sobre jovens na pandemia mostrou que 28% deles pensam em não voltar à escola e 49% querem desistir do Enem:
— O custo de não fazer nada será muito agravado com a crise. Não é uma hipótese, já estamos vendo isso. Escolas privadas fechando, alunos que vão migrar para rede pública. Isso vai exigir mais esforço fiscal dos governos. Tem um grupo que não vai estudar. O ônus fica maior do que já é.
Paes de Barros diz que o governo gasta R$ 90 mil por aluno mantido por todo o ciclo básico e perde R$ 372 mil por não impedir a evasão, quatro vezes o custo de investir na educação desse jovem:
— É um valor muito grande. Nenhum jovem deixa de concluir a educação básica sem ter frequentado pelo menos dez anos na escola. É como construir 90% de uma estação de metrô extremamente útil para a população e não terminá-la.
O pesquisador estimou que o adolescente que não consegue terminar o ensino médio vai ganhar de 20% a 25% menos do que quem tiver completado o ciclo. Isso pode representar perda ao longo da vida de R$ 159 mil, e eles ficarão menos tempo empregados em ocupações formais.
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Na conta também entra a perda de produtividade da economia com mão de obra menos escolarizada, o que afeta toda a sociedade.
— É um custo gigante, que compromete o crescimento do país, compromete todo o futuro. Fizemos questão de fazer o estudo para ter outra visão sobre o problema. Se as pessoas não se convencem pelo coração, pelas mazelas, quem sabe mostrando o custo de não fazer nada tenha algum resultado — afirma Risolia.
Desigualdade regional
A situação é pior no Norte e Nordeste. No Pará, a taxa de evasão chega a 28%. O número do impacto econômico é média nacional, mas há desigualdades, diz Paes de Barros:
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—Evidentemente, se for de uma família negra, com pais de baixa escolaridade, na área rural do Nordeste, a incidência é muito mais alta e o custo, maior.
Segundo o economista, a repetência e o déficit de aprendizado são as principais causas da evasão:
— O aluno vai acumulando déficit de aprendizado, há reprovação e abandono. Parece indicar que é importante evitar reprovação nos anos iniciais e finais.
Risolia completa que não há no Brasil a prática de disseminar experiências bem-sucedidas:
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— O poder público anseia por coisa nova, ter o bônus do inédito, do fui eu que fiz. Com isso, perde-se tempo e dinheiro. Pode criar com a precisão do diagnóstico para planejar as ações, criar políticas por achismo ou não fazer nada. Nessa inércia, chegamos onde estamos hoje.
O estudo será apresentado nesta terça-feira, em seminário virtual, com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, Risolia, Paes de Barros e o presidente do Insper, Marcos Lisboa, e mediação da colunista do GLOBO, Míriam Leitão.