Brasil: eleições e modelo econômico

Brasil: eleições e modelo econômico

Brasil: eleições e modelo econômico



Paga-se a dí­vida, e a fome au­menta - Su­per­mer­cado de Vila Velha (ES) vende pele de frango (Twitter/Re­pro­dução)


A es­cassez está pre­sente na vida da imensa mai­oria do povo bra­si­leiro, em­bora o Brasil seja um dos países mais ricos do pla­neta, com abun­dantes re­cursos na­tu­rais e fi­nan­ceiros, além de imensas pos­si­bi­li­dades. O pro­blema do Brasil não é falta de re­cursos, mas o seu desvio e con­cen­tração nas mãos de poucos. Isso não é um acaso ou fa­ta­li­dade, mas de­corre do mo­delo econô­mico im­ple­men­tado no país, o qual é cons­ci­en­te­mente pro­je­tado para dar esse re­sul­tado.

Os prin­ci­pais eixos que sus­tentam esse mo­delo econô­mico são: o mo­delo tri­bu­tário re­gres­sivo; a po­lí­tica mo­ne­tária sui­cida pra­ti­cada pelo Banco Cen­tral; o Sis­tema da Dí­vida, e o mo­delo pri­mário-ex­por­tador de com­mo­di­ties da mi­ne­ração e do grande agro­ne­gócio, ir­res­pon­sável para com as pes­soas e o am­bi­ente.

A in­ter­co­nexão desses eixos produz o re­sul­tado es­pe­rado: de­si­gual­dade so­cial, des­res­peito aos di­reitos so­ciais pre­vistos na Cons­ti­tuição, apro­fun­da­mento da mi­séria e do ina­cei­tável mapa da fome; danos am­bi­en­tais e eco­ló­gicos; atraso so­ci­o­e­conô­mico. Por outro lado, crescem as for­tunas de bi­li­o­ná­rios e o lucro dos bancos e grandes cor­po­ra­ções na­ci­o­nais e es­tran­geiras que ex­ploram nossas ri­quezas na­tu­rais de forma pre­da­tória.

Es­tamos em ano elei­toral e os pré-can­di­datos fazem pro­postas agra­dá­veis aos ou­vidos de elei­tores e elei­toras, porém, se de fato qui­serem me­lhorar a vida do povo, terão de en­frentar se­ri­a­mente os eixos que sus­tentam o in­justo mo­delo econô­mico que atua no Brasil.

Caso con­trário, con­ti­nu­a­remos a ter mais do mesmo. A fim de con­tri­buir para o de­bate elei­toral, abor­da­remos cada um desses eixos em uma sequência de ar­tigos, a co­meçar, por uma visão geral do or­ça­mento pú­blico.

Quem fi­nancia o Brasil

A aná­lise dos or­ça­mentos pú­blicos em todas as es­feras – fe­deral, es­ta­duais e mu­ni­ci­pais – mostra quem fi­nancia o Es­tado e quem mais se be­ne­ficia com o gasto pú­blico.

O fi­nan­ci­a­mento do Es­tado recai sobre a base da so­ci­e­dade, que arca com a maior parte da carga tri­bu­tária, con­cen­trada em tri­butos que in­cidem sobre o con­sumo, one­rando prin­ci­pal­mente os que têm menor ca­pa­ci­dade con­tri­bu­tiva.

Por sua vez, a des­ti­nação dos re­cursos or­ça­men­tá­rios atende in­te­resses prin­ci­pal­mente das grandes cor­po­ra­ções e bancos.

En­quanto isso, os in­ves­ti­mentos no aten­di­mento aos di­reitos so­ciais e na ma­nu­tenção da es­tru­tura do Es­tado se en­con­tram sub­me­tidos a “teto de gastos”, uma ver­da­deira aber­ração in­se­rida na Cons­ti­tuição Fe­deral por meio da Emenda Cons­ti­tu­ci­onal 95/2016 para vi­gorar du­rante 20 anos.

Na es­fera fe­deral, a aná­lise do or­ça­mento fe­deral exe­cu­tado em 2021 mostra o au­mento cres­cente dos gastos com a cha­mada dí­vida pú­blica, cujo pri­vi­légio já ab­sorve mais da me­tade dos re­cursos, en­quanto todos os de­mais gastos e in­ves­ti­mentos pú­blicos se en­con­tram sa­cri­fi­cados, con­forme mostra o grá­fico a se­guir.

Or­ça­mento exe­cu­tado em 2021

Este grá­fico tem pos­si­bi­li­tado a cons­ci­en­ti­zação de muitas pes­soas sobre a ne­ces­si­dade de re­a­lizar a au­di­toria da dí­vida pú­blica.

Por essa razão, a grande im­prensa e ou­tros se­tores li­gados ao Sis­tema da Dí­vida têm ata­cado este im­por­tante ins­tru­mento de mo­bi­li­zação po­pular, com ar­gu­mentos equi­vo­cados.

Sem con­tra­par­tida

Quanto mais pa­gamos a cha­mada dí­vida pú­blica, mais de­vemos. Isso ocorre em vir­tude da atu­ação de di­versos me­ca­nismos fi­nan­ceiros, em es­pe­cial aqueles ope­rados pelo Banco Cen­tral, como o es­ta­be­le­ci­mento de juros ele­va­dís­simos e a re­mu­ne­ração diária da sobra de caixa dos bancos.

Esses fa­tores, entre ou­tros, atuam para “gerar” dí­vida pú­blica sem con­tra­par­tida em in­ves­ti­mentos so­ciais.

Até o Tri­bunal de Contas da União (TCU) já re­co­nheceu que a dí­vida in­terna fe­deral não tem con­tra­par­tida em in­ves­ti­mentos no país.

As ele­va­dís­simas taxas de juros pra­ti­cadas no Brasil afetam toda a po­pu­lação bra­si­leira e im­pedem que o di­nheiro cir­cule de forma sau­dável, es­ti­mu­lando o fun­ci­o­na­mento da eco­nomia, ge­rando em­prego e renda. [NR]

O mais grave é que o Banco Cen­tral, que é a au­to­ri­dade mo­ne­tária do país e de­veria dis­ci­plinar os juros, tem ele­vado ex­po­nen­ci­al­mente a taxa bá­sica de juros (Selic), sob a falsa jus­ti­fi­ca­tiva de “con­trolar” a in­flação, sendo que esta de­corre de ou­tros fa­tores que não se re­duzem quando os juros sobem.

Por isso es­tamos lan­çando cam­panha para li­mitar os juros no Brasil e re­a­lizar uma Co­missão Par­la­mentar de Inqué­rito (CPI) do Banco Cen­tral.

Ren­tismo

O dis­curso de que faltam re­cursos para in­ves­ti­mentos no Brasil é fa­la­cioso. Houve “Su­pe­rávit Pri­mário” em 2021, no valor de R$ 64 bi­lhões. Esse re­sul­tado é re­fe­rente à União, es­tados e mu­ni­cí­pios.

É im­por­tante con­si­derar todos os entes fe­de­rados, pois grande parte do su­pe­rávit de es­tados e mu­ni­cí­pios é des­ti­nado ao go­verno fe­deral, na forma de pa­ga­mento das dí­vidas destes entes com a União. O pro­blema é que todo esse di­nheiro está re­ser­vado para o ren­tismo.

Nos pró­ximos ar­tigos, iremos abordar cada um dos eixos que sus­tentam o mo­delo econô­mico, a fim de con­tri­buir para o de­bate elei­toral e em­po­derar a so­ci­e­dade com ar­gu­mentos que po­derão ser abor­dados com os di­versos par­tidos e seus res­pec­tivos can­di­datos e can­di­datas.

Em re­lação à dí­vida pú­blica, a Au­di­toria Ci­dadã da Dí­vida ela­borou carta aberta aos par­tidos, acom­pa­nhada de ques­ti­o­nário a ser res­pon­dido por can­di­datos(as).

A par­ti­ci­pação ci­dadã du­rante o pe­ríodo elei­toral é fun­da­mental e pre­cisa ocorrer de forma qua­li­fi­cada e cons­ci­ente. Afinal, iremos es­co­lher quem irá di­rigir o país e todos os es­tados nos pró­ximos quatro anos.

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[NR] No Brasil chamam de renda a qual­quer es­pécie de ren­di­mento.

Maria Lucia Fat­to­relli é co­or­de­na­dora Na­ci­onal da Au­di­toria Ci­dadã da Dí­vida, membro da Co­missão Bra­si­leira Jus­tiça e Paz (CBJP), or­ga­nismo da CNBB; e co­or­de­na­dora do Ob­ser­va­tório de Fi­nanças e Eco­nomia de Fran­cisco e Clara da CBJP.

Pu­bli­cado ori­gi­nal­mente em Extra Classe.

https://correiocidadania.com.br/2-uncategorised/15187-brasil-eleicoes-e-modelo-economico 




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