Carta de um professor

Carta de um professor

CARTA DE UM PROFESSOR

Dilso J. Dos Santos

 

Sempre quis mudar o mundo, mas não podia. Complicado. Por isso li bastante para modificar ao menos a minha percepção sobre ele. Baixei a cabeça por longos anos e me atrevi em inúmeras tentativas que só sabiam encher a vida de funduras. E nada. A leitura – acreditem – me deixou ainda mais inquieto, um cavador de buracos. Nossa! Precisava voltar, falar sobre o que se passava ali, nas interioridades. No peito, tudo estava complexo demais. A voz deixava de ser clara. Preocupado com isso, tive que me reestudar. Fui investigando a mim mesmo e de como poderia ser a mudança que tanto desejava acender. Quando notei naqueles outros da rua, um outro que não podia mais ser eu: um ‘lonjurado’ intricado e solitário (igualzinho a este texto). Sim, precisei mudar o foco para poder ver diferente, para permitir que os tempos (ora mais gordos, ora mais magros, enfim) se desenhassem de maneiras distintas dentro de mim.

Meus dias passaram a se manifestar menos duros, desde então. Estava funcionando. Senti que poderia brincar com eles e com algumas vontades que, por fim, acabaram me deixando grávido de uma mudança necessária. Foi rápido, já estava passando da hora de dar à luz. Doía muito. Não dava mais para esperar. Peguei o bisturi e decidi pela ‘auto-cesariana’...: “Preciso de aaaaaaaaar!” – gritou aquele recém-nascido. Putz! Daí entendi perfeitamente o que tinha que fazer: um parteiro de vozes, era isso. Bom, acho que renasci junto com esse entendimento!

Elástico, esta é a palavra que estava procurando. Cada um dos “dentros” espicha-se para fora. Bom, amigos, sabemos que nem sempre dá, mas quando nos alongamos juntos, o exercício acaba por nos levar mais longe. Aprendi com isso que o mundo pode ser esticado sim, basta cada um fazer a sua parte e se puxar.

Sei também que não é fácil ser um esticador, um parteiro de vozes. Por isso é que no repuxo procuro avivar as palavras escritas, na reescrita – gosto dessa modalidade. Outro dia até escrevi as cinco verdade coletadas ao longo de minha experiência nas ‘escrevinhanças’, pois todo o cidadão – acredito nisso – precisa se colocar audível perante a sociedade. Nesse aspecto a ideia escrita recebe muito mais crédito do que a falada – espicha-se mais. Ela não se perde. Busca o mundo. Ganha ouvidos e retorna.

Enfim, encontrei minha missão. Chato? Muito. Crítico? Demasiado crítico. Amante desse tipo de trabalho? Profundamente, já que aprendi a clarear os escuros dos outros dando luz aos meus. Sim, só sei existir desse jeito, meio fora, meio dentro, um mestiço no mundo, de mundos que se misturam e são mestiçados também.

 

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