Cine Educa resgata filmes
Bem, 15 de Outubro, Dia do(a) Professor(a). Cine Educa resgata três filmes que mostram professores que vão além da arte de ensinar e se engajam na luta política e social na defesa da parcela mais vulnerável da sociedade.
Vidas reais que inspiram e evidenciam que o magistério transcende a sala de aula ao exigir consciência de classe, da qual, infelizmente, nem todos estão providos, quando ainda se dão ao direito de votar na direita, apesar de todos os reveses sofridos por parte desta. A saída, ou entrada, é pela esquerda.
Filmes: O GRANDE DESAFIO; ALÉM DA SALA DE AULA e O TRIUNFO – Para além do ensino, a militância.
É difícil destacar um ponto para iniciar o comentário sobre o filme “O Grande Desafio”, também nomeado como “O Grande Debate”. Denzel Washington (soberbo) faz o papel do professor, poeta e político Melvin B. Tolson, quando lecionava na faculdade metodista Willey College, no Texas, e liderava a equipe de debates de alunos da escola. O filme se passa entre as décadas de trinta e quarenta, transitando entre a depressão econômica e a segregação institucional (separados mas iguais). Embora exigente, reconhecia o esforço de seus alunos. Na abertura do filme, o pastor e professor James Farmer (vivido por Forrest Whitaker, protagonizando o pai de James Farmer Jr, futuro militante dos direitos Civis e defensor da não-violência) discursa: “Temos a tarefa mais importante da América: a educação de nossos jovens. Devemos mostrar-lhes que haverá dificuldades e eles a enfrentarão. E que eles irão superar. Eles farão o que deve ser feito para fazerem aquilo que querem. A educação é a única saída. É a saída da ignorância, é a saída da escuridão para a gloriosa luz”. O racismo, mesmo recorrente em todo o filme, se mostra mais evidente no linchamento de um negro, enforcado e queimado a beira da estrada, cuja cena foi presenciada pelos alunos de Tolson. Citações literárias de Langston Hughes, Zora Hurston, G. Bennett e Countee Cullen, expressões do Harlem Renaissance, permeiam o filme. Mas, além de lecionar e comandar seus debatedores, Tolson era um ativista sindical dedicado a organizar os trabalhadores e arrendatários explorados pelos fazendeiros (escondido de suas atribuições oficiais, afinal, “como pode um comunista lecionar numa faculdade metodista”), o que lhe valeu a fama de comunista e agitador, chegando a ser preso e depois libertado, com restrições, após reação da comunidade. Mas, o principal foco na tela são as proposições, as ideias, a serem debatidas entre alunos das universidades, chegando a disputas inter-raciais. As argumentações eram defendidas por equipes a favor (afirmativa) e contrárias (negação). Algumas das proposições parecem bem atuais:
- “O trabalho infantil deve ser fiscalizado pelo governo federal”;
- “O seguro desemprego deve acabar quando a depressão terminar”;
- “Integração racial nas universidades”;
- “Desobediência civil é uma arma moral na luta por justiça”
Nesta última, os alunos de Tolson deveriam defender a favor, saindo-se vitoriosos sobre, simplesmente, a equipe da Universidade de Harvard.
O filme “Além da Sala de Aula” entra para a série: “como não assisti este filme antes?”. Forçada a abandonar a escola aos 16 anos devido a gravidez precoce, Stacey Bess volta, agora casada e com um casal de filhos, como professora oito anos depois. Porém, diferente do que imaginava, a protagonista é contratada para dar aula, não em uma escola, mas em um abrigo para filhos(as) de pessoas carentes, desempregadas, com dependências químicas, sem-teto e até de presidiários. A história, também baseada em fatos reais, ocorre em 1987, na cidade de Salt Lake City. No abrigo, um antigo pátio ferroviário improvisado, constantemente invadido pela polícia, o espaço destinado à educação em nada se parecia com uma sala de aula. Crianças, de diferentes etnias e origens (latinas, brancas, negras, asiáticas e indígenas), diferentes idades (não se constituía numa série ou grau, desde infantil até adolescência), analfabetas (“não tem livros, nem apoio, basta colocar um filme e apagar as luzes”), desnutridas (a recomendação era contar o número de “cabeças”, solicitar as refeições, dar comida e mantê-los fora das ruas) e indisciplinadas (“coloque os nomes no quadro da vergonha”). Não havia horário definido, as crianças chegavam constantemente atrasadas (os pais inclusive as tiravam da “sala de aula” para exercerem “suas tarefas”), algumas dormiam em carros, pois não havia quartos suficientes e um coordenador local selecionava quem ali ficava obedecendo determinadas regras. O local sofria com doenças contagiosas, piolhos e um espaço com TV disputado entre os abrigados. “Qualquer coisa, chame a polícia”, aliás, a coisa mais temida pelas crianças. Diante deste caos, a primeira reação foi desistir, igualmente a tantos outros professores que por ali passaram, diante da total falta de estrutura. Se de imediato o preconceito e a discriminação a levaram telefonar diversas vezes para o órgão que dirigia o espaço para tirá-la dali e colocá-la numa “escola de verdade”, após ouvir que ela estava “tapando um buraco” dentro de um programa social, transformou seu medo em ação e começou, por iniciativa própria, a mudar fisicamente o local (pintura, organização da sala) visando transformá-lo no mais adequado possível para a prática do ensino. Aos poucos foi recebendo colaboração dos moradores, pais, e descobrindo aptidões que até então achava impossível encontrar no lugar. Ao trocar o juízo precoce por apoio e solidariedade (alfabetizando adultos, inclusive) suas atitudes afirmativas acabaram por sensibilizar um novo gestor (nunca haviam estado no lugar) a investir no espaço com móveis, livros didáticos e material escolar e resultou numa lei local que assegurava o direito às crianças sem-teto de estudarem e na construção de uma escola em 1988. Stacey mostrou que qualquer espaço extra-escolar pode se transformar numa sala de aula, espalhando sua mensagem em palestras pelos EUA, ao mesmo tempo em que desnudava o país exibindo sua cruel e real face de miséria e pobreza extrema sem qualquer assistência, diferente da imagem no exterior.
Por fim, “O Triunfo” conta a trajetória de Ron Clark, um professor reconhecido que troca a Carolina do Norte para dar aula nos bairros pobres de Nova York. Sua didática integrava a busca da autoestima das crianças com a disciplina ao estabelecer regras na sala de aula. Ron promoveu uma busca aos pais das crianças para compreender suas realidades adversas, alterou seus métodos de ensino ao aproximar-se de seus alunos e apostou na capacidade dos mesmos, até então relegados a se tornarem marginais. Eu, particularmente já trabalhei este filme várias vezes com meus alunos de 6º e 7ºs anos, mais especificamente, onde eles próprios teriam de criar as regras da turma, devendo seguí-las. Deu muito certo. Também o livro de Ron Clark está disponível.
Sinopses:
O GRANDE DESAFIO – Melvin Thompson (Denzel Washington) é um brilhante professor e amante das palavras. Embora tenha convicções políticas que possam atrapalhar sua carreira, ele decide apostar nos seus alunos para formar um grupo de debatedores e colocar a pequena Wiley College, do Texas, no circuito dos campeonatos entre as universidades. Mas o seu maior objetivo é enfrentar a tradição de Harvard diante de uma enorme platéia. Inspirado em fatos reais (2007). Direção: Denzel Washington.
ALÉM DA SALA DE AULA – Uma professora de primeira viagem com 24 anos de idade supera seus medos e preconceitos iniciais em lecionar para crianças de rua em uma sala de aula improvisada em um abrigo, fazendo grande diferença na vida delas. (2011) Direção: Jeff Bleckner.
O TRIUNFO (The Ron Clark Story) – Em sua pequena cidade natal, Ron Clark leva uma vida confortável como um bem-sucedido professor primário. Porém, ele sabe que pode ser mais útil em outros lugares e, seguindo seus instintos, se muda para Nova York onde muda a vida de muitos alunos (2006). Direção: Randa Haines.
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Filmes: UMA VIDA OCULTA; SOZINHOS EM BERLIM e UM HOMEM BOM – Quando o mal domina sem ser percebido....e combatido.
Claro, nem todos os alemães eram nazistas. Mas o que impressiona é como uma ideologia nefasta destas consegue subjugar qualquer visão crítica sensata, semear o ódio, contaminar pelo medo e dominar o comportamento das pessoas. Incrível como estamos vivendo isto no Brasil de hoje. Quem assistir qualquer um destes três filmes vai perceber isto nitidamente, o que causa arrepios. A população ficou(está) desprovida de consciência moral e incapaz de diagnosticar o mal que pairava(paira) sobre a sociedade?
O filme “Uma vida Oculta” conta o caso de Franz Jägerstätter, um objetor de consciência que se recusa a jurar lealdade a Hitler quando convocado para lutar na Segunda Guerra Mundial, após a Anschluss. Antes mesmo de ser preso, levado nesta condição para Berlim, julgado por um tribunal militar nazista e executado por decapitação em 1943, Franz já entornava sua insatisfação sobre aquilo que denominava de uma guerra injusta. Como saudar um genocida? Como se curvar à encarnação do mal? Esta posição leva a perseguição contra ele e sua família na aldeia de moradores camponeses na Áustria. Acusado de impatriota e traidor do sangue e da raça, seguidamente era questionado se sua posição valia a pena, se não passaria de pura teimosia. Devoto, Franz leva seu princípio até o fim, mesmo depois de se reportar a Igreja Católica, cuja cúpula se omitiu diante das atrocidades, com padres sendo enviados para campos de concentração. Esta era a vontade de Deus?
“Sozinhos em Berlim” começa com a euforia da população alemã após a vitória contra a França em 1940. Conta a história de um casal numa luta anônima contra o sistema opressor nazista. Outrora entusiasta da ascensão de Hitler, ao perder seu único filho na guerra, um operário metalúrgico e marceneiro desiludido com os rumos do país, passa a contestar o governo distribuindo notas em cartões postais, denunciando o regime e pedindo liberdade de imprensa, acompanhado de sua esposa, também ex-integrante de uma liga feminina nazista. Sentindo-se enganados e arrependidos, passaram a empreender esta luta colocando os cartões em determinados lugares, de forma que pudessem ser encontrados por outras pessoas, e quem sabe, assim, fazer outros alemães questionarem o regime. Algumas coisas são impressionantes neste filme: um judiciário subordinado, uma polícia civil controlada, a perseguição aos judeus, o oportunismo de certa parte da população em saquear bens alheios, os privilégios dos nazistas que alimentavam o preconceito e a discriminação enquanto viviam na opulência sem qualquer sacrifício (aumento da produção como esforço de guerra, exploração do trabalho e racionamento de alimentos) “à pátria”. Um momento emblemático é quando um policial encarregado da investigação vai dar satisfação ao oficial nazista da SS sobre o andamento do caso e é agredido de forma humilhante, sob as palavras: “Nós somos os que não sabem pensar enquanto vocês são os intelectuais?”, mas demonstrando quem realmente mandava. O filme é uma homenagem a Otto e Elise Hampel, decapitados em 1943.
Aliás, a questão da “intelectualidade submetida” versus “ignorância no poder” também está presente também no filme “Um Homem Bom”. O impressionante neste filme é como a sociedade vai sucumbindo ao discurso de ódio e preconceito capaz de envolver até um professor universitário opositor das ideias nazistas a parar na SS, violando seus conceitos e vendo o amigo judeu ser discriminado e enviado para o campo de concentração. A universidade foi forçada a destruir livros de autores proscritos (Marcel Proust, entre outros) e os professores a retirarem os mesmos dos currículos. É impossível assistir este filme e não pensar no que está ocorrendo atualmente no Brasil com a violação da autonomia universitária com o governo escolhendo os reitores segundo a sua vontade e não de acordo com a escolha da comunidade acadêmica. A película se desenrola abordando o período de 1933 (universidade colocando em cargos importantes membros filiados ao Partido Nazista) a 1942. Destaca o papel do Comitê de Censura, sob Bouhler, e a defesa de uma “literatura moderna com o espírito do nacional socialismo” (alguém lembrou Roberto Alvim aí?). Passa pelo assassinato de Ernst vom Rath em Paris tendo como consequência a Noite dos Cristais. Aborda a ideologia da “purificação da raça e a geração de filhos para servirem ao Führer” e a eutanásia dos deficientes (contaminados) como “forma de amor”. Três expressões neste filme nos aproximam da atualidade: 1) “pusemos o país nas mãos de um louco”; 2) “com o tempo poderemos coloca-los (os nazistas) num bom caminho”, ou seja, a visão de que poderiam com o tempo controla-los e; 3) “Hitler é uma piada, ele não vai durar”. Visões que com o tempo se mostraram ser equivocadas.
Filmes que mostram perfeitamente como o fascismo se apodera de uma sociedade e que podem servir didaticamente para mostrarmos que a melhor formar de se enfrentar não é conciliando, mas enfrentando esta ideologia, apesar do manto do medo da opressão.
Sinopses:
UMA VIDA OCULTA: Franz Jägerstätter (August Diehl) é um fazendeiro austríaco que se torna herói em circunstâncias um tanto quanto inusitadas. Quando ele é convocado a lutar junto ao exército alemão durante a Segunda Guerra Mundial, ele se recusa e acaba, com apenas 36 anos de idade, condenado à pena de morte por traição à pátria. Direção: Terrence Malick.
SOZINHOS EM BERLIM: Na Alemanha, durante a Segunda Guerra Mundial. na década de 1940, o casal de operários Otto (Brendan Gleeson) e Anna (Emma Thompson) recebem a notícia de que seu filho único foi morto em combate. Inconformados com o fato, eles decidem tomar providências contra os nazistas e resistir da sua forma, mas, logo eles caem na mira da Gestapo. Direção: Vincent Perez.
UM HOMEM BOM: Alemanha. John Halder (Viggo Mortensen) é um tranqüilo professor universitário, que vive em paz com sua família e tem em Maurice (Jason Isaacs) um grande amigo. Um dia Halder passa a prestar mais atenção em uma de suas alunas (Jodie Whittaker) e, com a carreira em ascensão, lida com pessoas do governo nazista, sem se dar conta do perigo que ele e seu país estão correndo. Direção: Vicente Amorim.
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