CPERS debate consequências do NEM
Educação não é mercadoria: CPERS debate as consequências do novo Ensino Médio
O novo Ensino Médio e as consequências para a educação gaúcha pautaram o debate, nesta quinta-feira (17), do seminário virtual promovido pela Comissão de Educação do CPERS.
Em decreto publicado no apagar das luzes de 2021, Eduardo Leite (PSDB) impôs a proposta sem qualquer diálogo com as comunidades escolares. Vendida pelo governo como uma grande salvação, o novo Ensino Médio aprofunda o desmonte e reforça uma perspectiva privatista e de mercado que amplia as desigualdades educacionais.
“Não é uma reforma e sim uma ‘deforma’ do Ensino Médio, que amplia a lógica empresarial no espaço público educacional, transformando tudo em mercadoria em consonância com a lógica neoliberal e a privatização”, asseverou a diretora da Comissão de Educação e anfitriã da atividade, Rosane Zan.
Segundo a presidente do CPERS, Helenir Aguiar Schürer, o Sindicato apresentou um documento para a secretária de Educação, Raquel Teixeira, para estabelecer um debate sobre o novo Ensino Médio, mas não houve qualquer diálogo sobre o assunto por parte do governo.
“Temos a clareza dos prejuízos que essa reforma traz aos nossos alunos. Vejam a responsabilidade que estão colocando nas mãos dos professores. É muito preocupante”, expôs Helenir.
“Vamos fazer uma resistência muito forte junto com a CNTE sobre essas políticas neoliberais do governo. A nossa saída é uma reforma construída por educadores e comunidades escolares. Precisamos fazer com que esses governos não progridam. Vai ter luta!”, completou.
Conforme a diretora da Comissão de Educação, Sônia Solange, é preciso estabelecer um profundo debate com a categoria para resistir à imposição do novo Ensino Médio. “Vamos ter que denunciar em todo o estado sobre os prejuízos e consequências deste novo Ensino Médio nas escolas gaúchas”.
De acordo com Vera Lessês, diretora da Comissão de Educação, o objetivo explícito do governo é formar mão de obra barata e é preciso firmar a resistência. “Nós do CPERS, que fazemos o debate e a discussão, percebemos que isso tem causado uma preocupação muito grande com a categoria. Precisamos construir alternativas”, expôs.
Uma reforma voltada para empresários
Para a professora da IFSul, de Sapucaia do Sul, Raquel Caetano, a reforma do Ensino Médio é voltada sobretudo aos interesses dos empresários(as) brasileiros.
“Todos nós já sabíamos que tínhamos algumas questões para alterar no Ensino Médio. Não é uma questão só de mudança curricular, entendemos que a educação faz parte de um projeto de nação. Mas a reforma foi estruturada por grupos que não fazem parte da educação”, explanou a professora.
A reforma foi conduzida por fundações, institutos e consultorias brasileiras. Entre tantas, destacam-se: Fundação Lemann, Instituto Ayrton Senna, Instituto Natura, Instituto Unibanco, Fundação Itaú Social, Fundação Roberto Marinho, Fundação SM e Itaú BBA.
Sob este viés, a educação básica é vista não apenas como fonte de lucro, mas também como nicho de mercado. Além disso, há o esvaziamento do conteúdo; são retiradas disciplinas da grade curricular e colocadas outras áreas de conhecimento que sequer foram discutidas com as comunidades escolares.
“Qual é o sentido de retirar as disciplinas construídas e pensadas historicamente através dos clássicos e optar por outras áreas do conhecimento? Como se faz o currículo sem convidar quem é capacitado nessa construção? Como a juventude vai entender o mundo que faz parte cada vez mais complexo se não tem a base científica para o conhecimento?”, questionou Raquel.
Para ela, a não participação dos grupos colegiados propõe a padronização do conhecimento, destituindo o professor(a) da sua autonomia pedagógica. Trata-se de um projeto de sociedade que não forma para a educação profissional, nem para sociedade e nem para o conhecimento científico.
“As questões pedagógicas estão precárias. Será estabelecida uma relação sem memória da sociedade brasileira e do mundo com o esvaziamento dos conteúdos em todas as áreas de conhecimento, abdicando a formação integral e integrada dos últimos anos”, finalizou.
Angústia e preocupação: o caso das escolas-piloto do novo Ensino Médio
Como laboratório de experimentação para implantar o novo Ensino Médio em todas as instituições de ensino do Rio Grande do Sul, o governo Eduardo Leite (PSDB) escolheu 300 escolas-piloto. Após período de observação e ajustes, no ano de 2022, todas as escolas de ensino médio serão obrigadas a aplicar a medida.
Durante o seminário, foram ouvidas quatro educadoras de escolas-piloto gaúchas.
Para a diretora da EEEB Tito Ferrari, de São Pedro do Sul, Adriana Gomes, a instituição não teve opção de escolha e foi obrigada a implantar a medida.
“Eu me sinto muito angustiada; temos uma responsabilidade muito grande com esses jovens. Esses alunos não tiveram opção. Tivemos que assumir essa bronca com pouquíssimo suporte”, desabafou Adriana.
“Essa matriz agora é diferente e posso dizer que está mudando para pior. Como vamos dar uma base para esses alunos?”, questionou.
Conforme a diretora Eliane Brum, do IE Rui Barbosa, de São Luiz Gonzaga, a escola havia escolhido um itinerário voltado para uma formação específica do ENEM, que foi encaminhado à mantenedora, que ignorou a escolha da instituição de ensino.
“Estamos formando este ano a nossa primeira turma com o projeto-piloto no novo Ensino Médio. Uma constatação que temos é que o aluno que está saindo esse ano sai imensamente prejudicado em relação ao ENEM”, explicou a diretora Eliane.
De acordo com Paola Costa, professora da EEEB Presidente Roosevelt, de Porto Alegre, que participou de todo o processo – desde a escolha da escola como projeto-piloto até a sua implantação – o novo Ensino Médio criou um Frankenstein de disciplinas.
“A fala da Seduc é que o aluno faça a sua escolha, mas o governo nos cortou. Os alunos não entendiam o que estava acontecendo na ementa das disciplinas; os códigos das disciplinas não batiam”.
A professora também questionou a insistência do governo em querer implantar o Projeto de Vida, do Instituto Ayrton Senna, como disciplina obrigatória do novo Ensino Médio, que esvazia o conhecimento científico e impõe a responsabilidade aos professores(as) de desenvolverem questões psicológicas e de personalidade dos alunos(as).
“Há uma insistência da Seduc de que o professor dos anos finais ao ensino médio tente converter a personalidade dos estudantes para que sejam mais resilientes, pacatos e receptivos diante das lacunas no mercado de trabalho”, expôs a professora Paola.
Ao fim do seminário, os participantes definiram que a revogação da reforma é urgente e que o debate nas comunidades, para a construção de um currículo inclusivo e construído no chão da escola, é o caminho para a garantia de uma educação pública, de qualidade e realmente agregadora.