De Simone a Soraya

De Simone a Soraya

 De Simone a Soraya

 

"A senadora Soraya Thronicke, candidata do União Brasil à presidência, é de Mato Grosso do Sul, e assim como a também senadora Simone Tebet (PMDB), é apoiadora do agronegócio. As duas vem de uma região onde segundo a novela Pantanal, da Globo, o boi é um animal silvestre e que adora brincar de rodeio, e o pantaneiro, pobre, despossuído de propriedade fundiária, exposto ao sol abrasador, tem pele clara, olho azul e é amigo leal do fazendeiro.

As duas senadoras, apesar do discurso provisório de gênero, integraram a base de Jair Bolsonaro no Congresso. Se as mulheres, que representam a maior parte do eleitorado brasileiro, seguirem o pedido de Tebet, Ana Amélia Lemos, Comandante Nadia e Soraya Thronicke de votarem apenas em mulheres, e não em Lula, a verdade é que estamos fritos. As duas mulheres candidatas a presidente, mais bem colocadas nas pesquisas, Tebet e Thronicke, defendem Estado mínimo, corte de gastos públicos e um programa ainda mais intensivo de desestatização da economia.

Claro que se sabia, que a tática das candidaturas de Direita para 2022 seria esta: assumir uma nova roupagem para uma mesma fórmula neoliberal. Pensar que a Direita não adotaria uma nova estética para enfrentar eleições que, grosso modo, tem dado vantagem a um homem branco (Lula), mesmo de origem humilde, e alguns de seus apoiadores, seria ingenuidade. Por exemplo: ao assistir o horário gratuito de propaganda eleitoral no Rio Grande do Sul, fica visível que a nominata tradicional, com aqueles nomes adorados pela gauchada bombachuda, não bastou para suprir as legendas.

É preciso ficar atento ao modus operandi da Direita brasileira: ela aprendeu a lição do discurso fácil da Diversidade ensaiada. A Direita brasileira descobriu, enfim, que o discurso fácil do identitarismo sem Luta de Classes é muito mais maleável e facilmente consumível por uma parcela superficial do eleitorado.

Assim, o discurso reinante, e isto é muito claro no discurso de Tebet e Soraya, é que o problema não está no sistema econômico, mas apenas nas peças que compõem suas complexas engrenagens.

Este discurso fácil, superficial, apropriado até mesmo por uma parte da Classe média de Esquerda, faz parecer que o Capitalismo, após pequenos ajustes, poderia oferecer as mesmas oportunidades para todos. A se saber, este discurso, faz parecer que mulheres negras, homens trans, deficientes físicos e obesos mórbidos, podem ser emancipados politicamente desde que estejam plenamente representados no Congresso, independentemente da legenda que compuserem.

Ora, se sabe que não basta a uma pessoa, o direito inalienável de assumir a sua orientação sexual ou ser quem é. Ser respeitado por ser quem se é, é parte integrante da Democracia que defendemos. A outra parte, precisa compreender tacitamente, que ao mesmo tempo este trabalhador ou trabalhadora, sente os mesmos efeitos da inflação das tarifas de energia e água, a carestia dos alimentos, e a ausência de políticas de geração de emprego e renda. Na verdade, o problema é até maior: as crises econômicas atacam, como sempre, mais severamente, mulheres negras e membros da população LGBTQI.

O que deve se perceber, é que neste pleito, no meio desta nominata da Diversidade, está o real perigo das eleições proporcionais: a eleição das mesmas bancadas privatistas de aluguel, repletas de corruptos e fisiologistas, que fazem da Assembleia Legislativa e do Congresso, um balcão de negócios. Para lá, através do voto proporcional dado a uma mulher negra que defende Bolsonaro, vai a mesma caterva de sempre: as bancadas de bispos neopentecostais, de militares ensandecidos para defender o tribunal de linchamento, e claro, os jagunços do latifúndio, que não se constrangem de ver mais homens e mulheres passando fome.

A população brasileira, sobretudo a gaúcha, que é mais suscetível ao ideário conservador, precisa estar muito atenta ao que está se propondo nestas eleições. Quando os proprietários das estâncias de charque abrem as porteiras de suas fazendas para disputar eleições democráticas, eles estão falando especificamente de uma Democracia rural, onde não estão dispostos a mudar as regras do sistema econômico, mas sim, as peças que o compõem. Assim, a mulher negra, por mais bem intencionada que esteja, em uma legenda de Direita, passa a servir aos interesses da bancada da FARSUL, correspondendo ao ideário do homem branco proprietário de latifúndio.

O que precisa estar em debate, de forma aprofundada, é a legenda, e o Programa que cada um dos candidatos vai defender diante da Classe Trabalhadora. Ou seja: para o próprio público feminino, que hoje comanda 51% das famílias brasileiras, é mais progressista votar em Lula ou Ciro, do que em Tebet e Soraya. Lula e Ciro defendem propostas que reestruturam a economia brasileira defendendo a superestrutura pública, enquanto Tebet e Soraya reproduzem o ideário neoliberal de privatização e entreguismo.

Qualquer pessoa sabe que a única paridade salarial entre brancos e pretos, homens e mulheres, e hetero e homossexuais no Mercado de trabalho só é atingida, segundo o IBGE, no serviço público. No Brasil, o Mercado assume as mesmas funções de distinção da Casa Grande. Fica claro, sobretudo na imensa maioria das empresas, quem, pela cor da pele, orientação sexual, origem social, terá os cargos de direção.

Ontem ficou muito claro no debate presidencial da Bandeirantes, que a tal “Terceira Via” tem uma estratégia muito clara para o enfrentamento das eleições: a de oferecer ao debate nacional, o mesmo de sempre, através de mais do mesmo, com Tebet e Soraya atacando Lula pontualmente nas questões de gênero, enquanto Lula, o representante do Campo progressista, homem, não tem sua origem socio econômica levada em conta em momento algum.

Também passou despercebido, para muitos internautas, que Simone Tebet e Soraya Thronicke, apesar do discurso de gênero, não são as mulheres que compõem tradicionalmente a vida brasileira e são muito diferentes, por exemplo, de Vera do PSTU: as duas são brancas, milionárias, empresárias, e com fortes bases do sistema financeiro. Nenhuma delas, assim, critica a Casa Grande, mas sim, o fato de que, quem está mandando na fazenda é o coronel (ou capitão) que elas elegeram, e não a Sinhá. "

Fabiano da Costa.




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