Debandada no Inep
"Situação inédita e gravíssima", diz professor da USP, Daniel Cara, sobre debandada no Inep
Em entrevista no JBA, o dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação também analisou a PEC dos Precatórios
Letycia Holanda - 08 de Novembro de 2021
A Assinep, associação dos servidores do INEP pediu uma "atuação urgente" do governo federal e do
MEC (Ministério da Educação). - Foto: Inep
Faltando menos de duas semanas para a realização do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem), 31 servidores do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), pediram exoneração de seus cargos nesta segunda-feira (8). Desses, 28 trabalham em áreas ligadas ao exame e 22 são coordenadores. A prova está marcada para os dias 21 e 28 de novembro.
Os pedidos de demissão acontecem de forma coletiva para exigir a saída do presidente do Inep, Danilo Dupas. Nas solicitações de exoneração, os funcionários denunciam a "fragilidade técnica e administrativa da atual gestão máxima" do órgão.
Em entrevista ao Jornal Brasil Atual Edição da Tarde, o dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o professor da Universidade de São Paulo (USP), Daniel Cara, avaliou a gravidade do momento da educação do país que levou a debandada dos servidores do Inep.
Para ele, o comprometimento dos trabalhadores do órgão com o Inep, e a total consciência deles sobre a importância do Enem para a população brasileira, fez com que decidissem que não valia a pena continuar no órgão e serem responsabilizados pela incompetência e irresponsabilidade da presidência de Jair Bolsonaro.
“Por comprometimento cívico dos servidores eles decidiram pedir exoneração. Então, é uma situação inédita, inimaginável, e que coloca, há duas semanas da aplicação do Enem, o governo em xeque. Esses servidores estão dizendo que, do jeito que as coisas estão acontecendo, a logística do exame não é segura. E não sendo segura, o Enem fica sob risco de não ocorrer. Então é uma situação bem preocupante que demonstra irresponsabilidade desse governo com o direito à educação”, afirma Cara.
O professor ainda afirmou que os servidores vinham resistindo na defesa do Enem, desde antes da gestão Bolsonaro. “O governo Temer tentou prejudicar, mas não conseguiu. Agora, o governo Bolsonaro, que não tem nenhum grau de compromisso com os estudantes brasileiros, decidiu fazer um cabo de guerra com os servidores. [...] E o resultado disso é que ele retirou qualquer critério técnico da gestão da presidência do Inep, e começou a luta contra os servidores”.
Para além do Enem, o Inep também cuida de sistemas que, por exemplo, estão ligados ao Censo da Educação Básica em 2022. As informações do censo servem para a distribuição de recursos do Fundeb, que, segundo Cara, está atrasada.
PEC dos Precatórios
O dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação também fala sobre a PEC dos Precatórios, que pode ser votada nesta terça-feira (9), em segundo turno, na Câmara dos Deputados. Ele explica que a PEC afeta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef).
Em recente moção de repúdio, a CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), denunciou que a PEC significará legalizar dar um "calote" na educação: "[um calote] especialmente sobre os precatórios do antigo Fundef, que têm previsão de pagamento de mais de R$ 30 bilhões, entre 2022 e 2023, a estados e municípios que foram prejudicados com o erro de cálculo da União sobre o valor aluno ano definido nacionalmente, entre 1998 e 2006".
“Além disso, a PEC dos Precatórios é na prática (uma estratégia) pra construir uma máquina eleitoral para o Bolsonaro. A gente está trabalhando muito, tentando reverter os votos do PDT, do PSB e também de parlamentares do Centrão que, ou ficaram ausentes ou votaram com o governo Bolsonaro", diz Daniel Cara.
Confira a entrevista na íntegra e todos os destaques do dia no áudio acima.
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O Jornal Brasil Atual Edição da Tarde é uma produção conjunta das rádios Brasil de Fato e Brasil Atual. O programa vai ao ar de segunda a sexta das 17h às 18h30, na frequência da Rádio Brasil Atual na Grande São Paulo (98.9 MHz) e pela Rádio Brasil de Fato (online). Também é possível ouvir pelos aplicativos das emissoras: Brasil de Fato e Rádio Brasil Atual.
Edição: Mauro Ramos
Enem: entenda por que profissionais do Inep pediram demissão na véspera do exame
Equipes relatam clima de insegurança e medo no cotidiano do órgão; Assinep responsabiliza "postura da alta gestão"
Trabalhadores e trabalhadoras do Inep denunciam "falta de comando técnico" e alertam para
riscos à realização do Enem - ©Marcello Casal / Agência Brasil
Quase trinta profissionais que atuavam na organização do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) pediram demissão nos últimos dias, a menos de duas semanas da realização das provas. Os desligamentos ocorreram em protesto contra a gestão do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), que organiza o processo seletivo.
Somente nesta segunda-feira (8), foram 29 pedidos de demissão. Os servidores e servidoras denunciam "fragilidade técnica e administrativa" no comando do Inep. Atualmente, o órgão é presidido por Danilo Dupas Ribeiro, colocado no cargo pelo ministro da Educação, pastor Milton Ribeiro, em fevereiro deste ano. Dupas lecionou na mesma universidade privada em que Ribeiro foi vice-reitor.
Segundo a Associação dos Servidores do Inep (Assinep), a gestão atual negligencia problemas estruturais, pratica assédio moral, promove desmonte nas diretorias, sobrecarga de trabalho e de funções e desconsidera aspectos técnicos para tomar decisões. As equipes relatam clima de insegurança e medo no cotidiano do órgão.
A entidade alerta que o cenário coloca em risco não só o Enem, mas também o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e os Censos da Educação Básica e da Educação Superior.
Em nota, divulgada nesta segunda-feira (8), a Assinep responsabiliza "a postura da alta gestão do Inep" na situação, que é classificada como dramática, "Todas as ações institucionais da autarquia precisam de direcionamento técnico de gestores devidamente capacitados nas temáticas. Diante disso, reafirmamos a necessidade de atuação urgente do MEC e do governo federal no sentido de equacionar a situação e reduzir os riscos para a sociedade."
Quem pediu demissão?
A debandada do Inep teve início na semana passada, quando dois coordenadores pediram demissão: o coordenador-geral de Logística da Aplicação, Hélio Júnio Rocha Morais, e o coordenador-geral de Exames para Certificação, Eduardo Carvalho Sousa. Ambos coordenavam áreas ligadas ao Enem.
Nesta segunda-feira (8), outras 29 pessoas também pediram desligamento do órgão. Pelo menos 27 atuavam diretamente com o Exame Nacional do Ensino Médio e mais de 20 coordenavam setores do Inep.
A Diretoria de Gestão e Planejamento, área que mais sofreu baixas, é responsável justamente pela organização logística da prova. Entre os servidores e servidoras que se desligaram do Inep, estão alguns dos profissionais mais experientes de setores estratégicos para o bom andamento do Enem.
Com a permanência de Danilo Dupas no cargo de presidente do Inep, novos pedidos de demissão não estão descartados. A Assinep alerta para os riscos de uma "gestão caracterizada por afugentar e oprimir pessoas, o que gera vulnerabilidades aos exames, avaliações, censos e estudos, comprometendo a trajetória exitosa de 85 anos do Inep".
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) está marcado para os dias 21 e 28 de novembro.
Outro lado
A reportagem do Brasil de Fato tentou contato com o Inep e o MEC, mas não teve resposta até a publicação desta reportagem
Edição: Leandro Melito