Desigualdades na educação pública
Desigualdades na educação pública
É cada vez mais consolidada a constatação de que a pandemia do novo coronavírus ampliou as desigualdades da oferta educativa. Realizado pelo Todos Pela Educação, o estudo Desigualdade entre Escolas nas Redes Municipais de Ensino traz novas luzes sobre o tema, ao mostrar que a expansão das desigualdades não é um fenômeno restrito às circunstâncias excepcionais deste ano.
Entre 2015 e 2019, a maioria dos municípios (57,5%) apresentou um aumento na desigualdade entre escolas dos anos iniciais do ensino fundamental. Assim, o desafio de uma educação mais equitativa não se resume a enfrentar os graves problemas causados pela crise de covid-19, mas inclui reverter uma tendência arraigada, que já vinha causando vários desequilíbrios.
A partir de dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), o estudo avaliou as desigualdades existentes entre escolas públicas de um mesmo município. Seu objetivo foi oferecer elementos para que as respostas de cada gestão municipal sejam aderentes à realidade de sua rede de ensino.
“Mesmo entre os municípios que avançaram no Ideb, 58% obtiveram esse êxito aumentando a desigualdade entre os grupos de escolas com os maiores e os menores resultados no indicador”, diz o estudo. Ao mesmo tempo, e aqui está um ponto especialmente importante, pouco mais de um terço dos municípios (35,8%) conseguiu conciliar melhora do Ideb com avanço da equidade. Além de indicar que não é impossível aliar esses dois objetivos, o expressivo porcentual revela a existência de boas práticas de gestão pública, que podem e devem ser replicadas em outras localidades.
Outro aspecto interessante destacado no estudo é a chamada “janela de cooperação local”. A desigualdade entre escolas da mesma rede de ensino revela que, no mesmo município, há escolas de qualidade, que conseguiram atingir sua meta no Ideb. Há assim um potencial de interação e de ajuda entre diferentes instituições de uma mesma localidade. O que as escolas mais fracas precisam talvez já esteja sendo aplicado em outra escola da mesma cidade. As soluções não estão distantes e, como lembra o Todos Pela Educação, essa interação pode beneficiar e acelerar o desenvolvimento de todos.
Ao longo do estudo, fica evidente que não basta perseguir uma genérica melhoria do ensino ou tratar todas as escolas da mesma forma. As políticas públicas educacionais precisam estar expressamente orientadas para uma maior equidade. Caso contrário, “será muito difícil romper esse ciclo vicioso de exclusão educacional”, diz o estudo.
Não há respeito pleno ao direito à educação quando crianças de um mesmo município, de uma mesma rede pública de ensino, têm acesso a ofertas educativas tão díspares. A equidade educativa é elemento fundamental de cidadania e do Estado Democrático de Direito. Sem tratamento privilegiado ou discriminatório, todos são iguais perante a lei e todos têm direito à igualdade de oportunidades. O poder público falha gravemente quando duas crianças recebem uma educação desigual, simplesmente porque estão matriculadas em escolas municipais diferentes.
Os prefeitos que tomarão posse em janeiro de 2021 terão grandes desafios na área educativa. É urgente dar continuidade à retomada das atividades presencias nas escolas, bem como mitigar os muitos efeitos da pandemia na comunidade escolar. Mas é possível – e necessário – ir além. “Os quatro anos de gestão são tempo suficiente para que se estabeleçam políticas visando ao fortalecimento do sistema educacional local com orientação para a equidade”, diz o Todos Pela Educação, com base nos resultados de muitas gestões municipais.
O direito à educação com equidade não pode ser uma utopia. É possível fazer mais, como muitos municípios vêm fazendo. Tantas vezes repetida pelos gestores públicos, a prioridade à educação deve se manifestar na adoção de políticas públicas responsáveis e realistas, baseadas nas muitas evidências disponíveis. Não avança apenas quem não quer.