Despedidas
No Dia do Funcionário Público venho me despedir...
É tempo de dizer adeus!
Foram 8 anos intensos. O dia da minha nomeação ainda está na minha mente, como se tivesse sido ontem. A felicidade de, enfim, conseguir trabalhar com o que estudei. Era a realização de um sonho.
Apesar das dificuldades, já tão conhecidas a respeito das escolas públicas, eu estava feliz e, nos dois primeiros anos, estava em êxtase: dando o meu máximo, apaixonada por tudo, contente até com o salário.
Naquela época, recebíamos aumento, o salário saía dia 28, o décimo pago na data correta, as férias em janeiro e fevereiro, também na data certa...
De repente, uma derrota atrás da outra, colocaram um tal Sartori e agora o tal Leite no comando do estado. De lá para cá foi montanha abaixo.
Eu vi minha classe se peleando entre si, enquanto os políticos mandaram e desmandaram a bel prazer.
Vi meu sonho virar pesadelo dia a dia.
Meus alunos ficando em segundo lugar porque eu estava ocupada demais tentando tomar conta de 15 turmas para poder ganhar um pouco mais e sustentar minha casa.
Senti-me insuficiente, incapaz, incompetente...
Demorei para perceber que era assim que os governantes me mantinham no cabresto, enquanto eu me culpava, não enxergava que não era eu quem era incompetente, mas sim quem me obrigava a trabalhar dobrado para ter o mínimo de dignidade financeira.
A gota d'água foi aquela greve...ahhhh, aquela greve. Qualquer idiota com 2 mini neurônios dentro do cérebro era capaz de perceber que era grave o que vinha pelo caminho. Íamos ser patrolados!
Chamamos os colegas, pedimos, suplicamos por apoio e fomos ridicularizados. Pedíamos para os colegas usarem preto como forma de protesto, usavam branco para afrontar, pedíamos para paralisarem, nos ignoravam...
O resultado? Aulas do período de greve, repostas e nunca pagas (porque nosso "papai" Dudu queria nos ensinar uma lição para não fazermos mais greve), fim do triênio, fim da licença-prêmio, fim do difícil-acesso, desconto de previdência aos aposentados, salários congelados (defasados, parcelados), férias modificadas, e mais tudo que avisamos que aconteceria.
Eu até posso supor que teve colega que ficou feliz por termos sido descontados pela greve. Até agora eu não consigo entender esta síndrome de vira-latas.
É uma classe desunida, que compete sei lá o quê entre si, enquanto os governantes montam em seu lombo!
Aquela greve foi o que faltava para mim.
Desde então, passei a buscar outras formas de sobreviver e sonhei muito, em abandonar o magistério estadual. Este que outrora foi meu sonho, agora era um pesadelo.
Ah, estou exagerando?
Eu não trabalho para comprar batom, não tenho marido abonado que sustente a casa.
Cada mês que eu precisava pagar 50 reais para antecipar meu salário um ódio crescia em mim por perceber o tamanho da picaretagem que acontecia entre o governo e este banco.
Tem quem defenda o banco, que ache que se não fosse ele, estaríamos pior, isso é o que querem que vocês acreditem. Enquanto isso, mesmo diante de crises, é o banco que mais cresceu nos últimos anos e sabem quem oportunizou este crescimento? É só fazerem a continha, qual a classe que perdeu absurdamente o seu poder de compra e hoje trabalha que nem bicho para poder pagar suas contas e comer?
Qual a classe que está devendo até a alma para o banco?
Mas, enfim, este texto não era para falar sobre amarguras e dissabores que vivi nestes 8 anos de estado.
Ele é um texto de carinho, amor e admiração pelos meus colegas, que fazem o seu melhor por amor à profissão e pelo alunos.
Vocês são demais!
Eu vi professores e vices reformando os espaços da secretaria com recursos financeiros e mão-de-obra próprios, vi diretora varrendo e lavando a escola, na falta de pessoal, vi colegas ajudando alunos necessitados.
E naquela greve? Colegas montaram kits de cesta básica para ajudar aos outros, eu fui uma que recebi ajuda e sou muito grata.
É de vocês que sentirei falta e é de vocês que sinto um orgulho imenso. Pessoas que não se acovardam, que têm consciência de classe, que sabem que merecem mais e lutam para receber o que é seu por direito.
Nunca deixem que governantes incompetentes e maldosos diminuam seu valor.
Vocês são o que ainda restou de bom.
Vocês são a esperança de muitas crianças e jovens.
Vocês são a única garantia de que o filho do pobre não vai voltar a se limitar a mão-de-obra barata.
Vocês, às vezes, são as únicas pessoas a acreditar e encorajar o aluno a lutar por uma vida melhor.
NÃO ESQUEÇAM DISSO, a missão do professor é linda, nossos alunos merecem o nosso melhor e, se para darmos esse melhor, precisamos de condições melhores de trabalho, calar diante das injustiças só nos distancia mais do nosso objetivo.
CONTINUEM LUTANDO! Mesmo que muitos colegas não mereçam se beneficiar dessas lutas.
Eu quase saí antes, mas por necessidade fiquei.
Hoje, saio fora, com a consciência limpa e a alma em paz por saber que fiz o meu melhor e que deixei apenas sementes e flores pelo caminho.
Da minha parte, só posso garantir que nunca votarei nos tiranos que esvaziam os bolsos dos professores.
Não levo no coração, ressentimentos, apenas a lição de um grande aprendizado: nada vale a nossa paz! É preferível um prato de arroz e feijão do que ter carne todo dia e para isso vender a alma ao Diabo.
Gratidão!
Força, meus queridos
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da Profa Val - https://www.facebook.com/groups/188429524507057/user/100006046590120